domingo, 17 de maio de 2020

A República do Galeão e a república da galeota


Os militares da Aeronáutica impuseram a Getúlio Vargas a humilhação de ver a família do então presidente (na pessoa do irmão Benjamim, o ‘Beja’) investigada por uma das armas da República (cognominada como "república do Galeão") e não pelos meios constitucionalmente fixados: polícia judiciária. Levaram-no ao suicídio, para evitar o golpe.

Os militares que estão no exercício do poder – como o demonstra sua atuação no governo do inquilino do Alvorada – parecem refletir o máximo, o supra sumo da intelligentsia pátria em todos os segmentos científicos. Não mais apenas nos limites institucionais estabelecidos pela Constituição para as Forças Armadas. Mas tornando a denominada sociedade civil em adendo à sua concepção de Nação, aplicando uma típica capitis diminutio ao pensamento e à produção intelectual não militar. São perfeitos – assim se acham estes singulares Narcisos.

Essa história é conhecida. Em tempos de silêncio obsequial imposto (ditadura) suas expressões (inclusive familiares) assumiam tudo: de cargos governamentais a presidências e diretorias públicas e privadas. E mesmo criavam suas boquinhas para garantir sinecuras. Quem não se lembra da CAPEMI – Caixa de Pecúlio dos Militares – uma picaretagem que levou prejuízo a muita gente? (Conhecemos um amigo – Gileno Cruz – que investiu nela durante os anos todos necessários e quando recebeu o investido ao final dos 10 anos não correspondeu a 1 salário mínimo. E, o pior: não tinha a quem apelar).

No curso da ditadura o que acontecia nos bastidores, mesmo se descoberto, não era revelado. (Às vezes escapava, como o flagra de Sebastião Néry denunciando na Tribuna da Imprensa o escândalo da compra do patrimônio da Light por 380 milhões de dólares em que o ‘corretor’ Antônio Gallotti - diretor da Brascan - recebeu seus sagrados 10%, falcatrua assinada pelo então presidente Ernesto Geisel, em 1978). A censura imposta protegia tudo, inclusive as relações promíscuas entre a casta militar e o Estado, por ela apropriado na singular dimensão patrimonialista imposta à força das baionetas, ressalvadas as exceções.

A atualidade demonstra que tudo voltou ao ‘d’antes no quartel de Abrantes’. Milhares são os militares a ocupar cargos, não necessariamente pela competência, mas para asseguramento de sinecuras. Esta semana vazou o fato de uma filha de um deles – já encastelado no poder, ampliando seu ‘soldo’ – ocupando cargo em (outro) ministério onde percebe 10 mil reais.

E não esqueçamos da estranha liberação de auxilio emergencial para quase 190 mil deles.

Criou-se nesta terra brasilis o dogma de que corrupção é sinônimo da classe política. Ninguém pergunta em torno da remuneração escandalosa de alguns militares privilegiados. Alguns privilegiados, sim, porque não podemos generalizar em torno do tema e vinculá-lo a todo e qualquer oficial ou a todo ou qualquer militar. Até porque a tropa não participa das sinecuras.

E hoje há entre eles quem mesmo dê a entender que duvida da corrupção familiar (aliada a outros senões) envolvendo o próprio inquilino do Alvorada. Tanto que até não reclamam das reuniões ministeriais onde permeia à mancheia a linguagem de bordel no dizer de certo ministro do STF, diante do que viu e ouviu de um destes encontros para discutir os interesses da Nação, como denunciado no Conversa Afiada.

Não bastasse, todo o poder construído o foi alimentado em fraudes eleitorais (em dimensões inimagináveis de acontecer se tantos não fossem os atores institucionais para sua construção – Congresso, Judiciário em todas as instâncias, Ministério Público, militares e quejando mais) e os militares que ‘trabalharam’ na campanha e hoje se encastelam no poder têm explicações a dar à Nação. 

No entanto, ensaiam a manutenção dessa aberração implantada através de uma eleição fraudada, como o expõe Leonardo Attuch no Brasil 247.

Certo é, caro leitor, que pelo andar da carruagem uma ditadura sem golpe está em curso – desde que Congresso e Judiciário a assegurem como o têm feito até o presente instante – e a casta militar, capitaneada pelo capitão inquilino do Alvorada, ocupa(rá) todos os quadrantes do país e do Estado Nacional, inclusive a científica. Com apoio em milícias civis e militares.

O butim em curso já encontra apoio em parcela da classe política, aquela criticada pelo inquilino e que dela já se vale para manter-se na crista da onda. Não lhe faltarão os apoios de sempre: grande imprensa, empresários, banqueiros, especuladores outros e quejandos tais.

No fundo, a imagem preservada pelos militares como de exemplo de moralidade começa a ser questionada por quem olha, vê e enxerga. Triste instante para as Forças Armadas. Que têm, como instituição, oportunidade de ouro de fazerem-se merecedoras do respeito da nação.

Implícito está a necessidade de os militares de verdade dizerem que os militares do governo não são sua voz e muito menos sua legítima representação e que o grosso do oficialato não integra esta parcela militar voltada para a destruição do Brasil e exercendo o ‘glorioso mister’ de proteger a bandidagem representada pelo inquilino do Alvorada e familiares, arautos e beneficiários das famosas rachadinhas.

No passado a Aeronáutica levou o Governo à república do Galeão; hoje, a atuação de parte da tropa está a exigir a instauração de uma outra ‘república’ investigativa para averiguar os limites desta república da galeota. Que está no mesmo nível de equilíbrio daquela nau capitânia de FHC para comemorar os 500 do Descobrimento: não navega.

A não ser que surja um General Henrique Teixeira Lott para retirar a democracia da UTI, ora respirando apenas por escafandros. Ops! aparelhos.
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Dia seguinte:

À mulher de Cesar não basta ser honesta, deve parecer honesta. 

Não custa o general Heleno, que integra a cúpula do governo do inquilino do Alvorada, explicar convincentemente esta história de ter sido incluído como beneficiário do auxílio emergencial de 600 reais (requerido em 7 de abril e enviado para caixa no 22 do mesmo mês), detectado pela Caixa e pelo Dataprev como fraudulento. É o que denuncia a Revista Fórum.

Especialmente por uma circunstância nada desprezível: o general Heleno é responsável pela inteligência do governo dirigindo o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.

Cabe, quando nada, descobrir quem estaria "armando" para ele. E para aqueles outros quase 190 mil militares também beneficiados pela sinecura.

Dia seguinte II:

Natural que tal ocorra. Afinal, por tradição, ao comando militar a defesa em tempo de batalha.

Nesta guerra contra o inimigo invisível o comando militar que passou a ocupar o Ministério da Saúde já mostrou a que veio: tratando o tema como uma guerra contra um inimigo, ainda que invisível, amplia a participação de pares no combate.

Assim, mais nove militares passam a somar-se ao ministro e aqueloutros que lá já estavam, como oregistra o GGN.

Por coincidências – ou tragédias – o número de mortes pelo Covid-19 acaba de superar o milhar diário e o Brasil passa a terceiro no mundo em número de infectados.

A turma tomando gosto...

Dia seguinte III:

A propósito da postagem de ontem (Dia seguinte II) lemos hoje no Conversa Afiada algo que parece demonstrar apenas uma típica apropriação, por alguns militares, de cargos governamentais.

Diz a matéria que são "pelo menos 12" os agraciados entre majores, coroneis, tenentes-coroneis, tenentes, sub-tenentes e capitães (inclusive da ativa). NENHUM deles tem qualquer relação com Medicina e Saúde. 

Naturalmente um singular reforço no soldo mensal. 

O Ministério da Saúde não explica o porquê de tal 'fenômeno'.

De cá da província explicamos: é a turma tomando gosto... para desgosto de muitos que acompanham o Brasil caminhando para alcançar o nada honroso título de epicentro da pandemia no mundo.

Há quem ainda afirme que está a ocorrer o "sequestro do Estado sem o uso de tanques e escopetas, sem necessidade de um golpe" – palavras do cientista político Danillo Bragança ao Sputnick Brasil repercutidas pelo Brasil 247.  


"Militarizar a saúde não significa colocar um tanque na frente do ministério. Nem precisa. Basta que os segundos e terceiros escalões sejam ocupados por militares da ativa. Isso traz um problema. Eles não são treinados para nada disso, não são formados para ocupar esses cargos, ninguém ensina isso nas escolas militares. São basicamente treinados para uma ciência, que são as ciências militares”, acrescentou.

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