quarta-feira, 23 de outubro de 2024
domingo, 7 de abril de 2024
domingo, 31 de março de 2024
Do bom dia a cavalo à rapsódia húngara
A
sabedoria popular leciona que ‘quem fala muito acaba dando bom dia a cavalo’.
Expressão clássica de uso corriqueiro pela sapiência nordestina em torno da
qual deve muito conhecer o Presidente da República.
O
noticiário reflete o desdobramento de uma denúncia feita ainda no ano passado,
de que o ex-presidente da República não teria devolvido cerca de 161 bens
móveis que integram o acervo do Palácio do Alvorada, residência oficial do
Chefe da Nação. Não se descura que entre ditos ‘desviados’ estivessem alguns da
Granja do Torto. Bem possível.
O
alardeado pela imprensa é de que o Presidente teria falado do ‘desaparecimento’
de ditos móveis. E mais: também a primeira-dama não perdeu o mote e verbalizara
em torno do tema.
A
reflexão a que nos propomos gira em torno
do como andam os órgãos de comunicação do Governo e, particularmente, os
incumbidos de falar em nome e pelo Presidente. Isso porque não é a pessoa do
Presidente, mas a instituição “Presidência da República” que utiliza dos meios
técnico-institucionais para tal mister.
Não
enveredemos pelo lacerdismo udenista de gastos feitos para aquisição de móveis
novos; afinal, em termos de gastos o ex bate o atual disparando velocidade
astronômica, basta lembrar que até gastos para limpeza do lago de entrada do
Palácio do Alvorada que fizeram desaparecer as moedas ali acumuladas pela
tradição turística de alimentá-lo para dar sorte.
Mas,
voltando à vaca morta: ao que nos parece, nenhum deles (Presidente,
primeira-dama) respeitou as normas em torno do assunto. E, não bastasse – sem
qualquer ressalva de que algum órgão competente estaria a buscar localizar os
móveis e até aquele instante não encontrara – aproveitaram o estado de
‘cachorro morto’ do ex-presidente e participaram da sessão de socos, chutes,
pauladas e pontapés. Naturalmente tudo levado às alturas pelo noticiário;
afinal, a fonte justificava o alarde em torno do ‘escândalo’.
Mas
não é que descobriram os tais 161 móveis?
E
a divulgação não traz notícia de apuração em torno de quem veiculou a falácia
levada ao Chefe de Estado – na qual também embarcou a primeira-dama.
E
eis que refém o governo de (mais) uma futrica de ‘comadres’ ainda que esteja
surpreendendo em nível de economia, PIB, relações externas, soberania,
investimentos, retomada do crescimento, queda de juros, redução do desemprego,
criação de escolas técnicas (só a Bahia é destinatária de 10 deles) etc.
E
o “cachorro morto”, envolvido em denúncias graves até o pescoço se vê (mais uma
adiante analisada) – e à sua turma – na proa de ataques ao Governo e se
amparando (como se isso pudesse livrá-lo dos incômodos) na “injustiça” cometida
contra sua augusta figura.
E
está certo nesse quesito: até que provem o contrário foi acusado indevidamente.
Cremos
que – até que venha à tona quem induziu o Presidente à acusação (a qual não
precisava assumir) – um mote para o palanque contra o PT e o Governo foi dado
de mão beijada.
Mas
– mas que se impõe – em sua atual gestão – o Presidente Lula está
devendo muito no quesito comunicação. Para nós em duas latitudes singularmente
negativas: assumir-se porta-voz político-eleitoral no ataque ao ex-presidente (mister
que não lhe cabe e sim ao PT) e falando demais.
Sobre
esse “falar demais” – muito provável, queremos crer – que esteja a amparar a
primeira-dama, que fala o que bem entende onde bem entenda.
Que
saudades de D. Marisa Letícia! Que se limitava a ser mulher do Presidente da
República e não dava “bom dia a cavalo”.
Mas,
tudo isso ultrapassado – caro e paciente leitor deste escriba de província – há
também os que falam pouco em meio aos que falam muito. E não falta quem não
entenda de música, mas busque embaixadas para ouvir e aprender rapsódia
húngara! Quando bastaria ouvir Liszt Ferenc, mais conhecido nos botequins da
vida como Franz Liszt (1811-1886).
Mas,
do alto da intemperança, fazendo ou falando demais – dizemos nós – de certa
forma se aproxima da ironia de José Simão, de que há gente nesta terra
brasilis que até “decreta Estado de circo!”
domingo, 24 de março de 2024
Entre Pessoa e Russell
“Quero
preparar-me para pensar amanhã no dia seguinte...”
(Adiamento,
Fernando Pessoa, pelo heterônimo Álvaro de Campos)
Convivemos
com situações que ultrapassam a fronteira do inusitado. Certo que a idade
alimenta em sua fase ‘filosófica’ a observação dialética em torno do que se nos
acomete.
Mas,
por mais que tenhamos evitado editoriais e noticiários televisivos e quejandos tais – desde
muito, quando os percebemos peças da engrenagem de um sistema alienante – e,
quando muito, nos limitamos a rir das versões difundidas como verdade quando lançada
às calendas a Verdade (aristotélica), a mediocridade em coortes atravessa o
Rubicão e avança em tática napoleônica sobre o que resta.
Não
bastasse, a maioria de ‘técnicos’ nas diferentes áreas de (des)informação é testemunho
de que não se trata de expressar formação intelectual, mas de corresponder ao ‘compromisso’
com o que lhes sustenta, naturalmente o “mercado’, o grande ‘empregador’. Uns,
remunerados pelo vil metal; outros, por deslumbramento pequeno burguês.
Por
isso não estamos conseguindo nem refletir sobre o ontem, atropelados pelo
presente – que sob um dos prismas da autoajuda se outorga solução –
profundamente violentado física, histórica, ética e humanamente pela carga de
mensagens/verdades “absolutas”.
Tampouco
– muito, muito menos – refletir sobre o outrem. Negamos-lhe o passado para
reflexão e o presente o temos como campo de batalha onde o outro é o adversário
em disputa fratricida a ser aniquilado. Sem direito a clamar por solidariedade.
E
quando a realidade se expressa sob a ótica do ‘mercado’ eis em plenitude a negação
do Humanismo, o ápice da negação do homem como destinatário da felicidade. Até a mensagem cristã foi apropriada pelo mercantilismo.
Eis
que esta terra brasilis tenta enfrentar hostes servis à negação de tudo –
sem apologia – que não se debruce sobre o homem como fonte e destino do bem
comum.
Mas,
não enxergamos o instante de “pensar o amanhã no dia seguinte”. O imediato nos
afeta como destino inexorável e concentramos energias negativas em profusão
lançando ao fundo do poço a esperança realizável.
Ainda
que sub-reptício (desfigurando-se do alcunhado em nível ideológico) a velada
forma de negação aí está, alimentando a ‘sua verdade’ e pensar ilustradamente
tornou-se alvo de estigma e nós outros aos poucos sucumbimos a quem nega o ‘dia
seguinte’ ao amanhã, sufocados e amordaçados.
Mas,
para os que não esquecemos o passado como lição nos escudamos em reconhecer,
como o reconheceu Bertrand Russell:
“Primeiro,
eles fascinam os tolos; depois, amordaçam os inteligentes”.
domingo, 10 de março de 2024
Fragrâncias
O
Chanel Nº 5 certamente é das mais icônicas fragrâncias contemporâneas, tida mesmo
como atemporal. Tem origem em um óleo essencial extraído da madeira do
pau-rosa, originário da Amazônia. Faz fama desde sua criação, atribuída a
Gabrielle Bonheur Chanel (1883-1971), em 1921, para a Coco Chanel.
A
não menos famosa Rainha de Sabá alcançou notoriedade em seu tempo – o que a imortalizou
– por sua capacidade de manusear perfumes – ‘imperatriz do aroma’, disse-o o
poeta Sosígenes Costa – e o conjunto de odores por ela destilados – da mirra ao
sândalo, da lavanda ao patchouli, do nardo ao cedro, do incenso ao bálsamo, da
murta ao ládano, da canela ao gálbano – soube-o dominar. Por tudo dela
originado envolvendo essências poetas a definem metaforicamente como lágrima
sabeia, nome dado ao incenso em sua homenagem.
Mas,
no curso dos tempos, e da facilidade de acesso, a apropriação das essências não
mais somente se fundou em si mesma, mas na marca a ela atribuída. A ‘personalização
da essência’ de certa forma despreza a origem e favorece o rótulo. A mesma
essência será, assim, reconhecida por nomes diversos.
Sob
tal diapasão nomes famosos ‘vendem-se’ ao mercado de perfumarias e induzem o
consumidor à aquisição para “ser” ou “parecer” com quem lhe dá o nome.
Não
enveredemos aqui por compreender o “fetiche” da mercadoria perfume como em
torno desta filosofou Karl Marx, mas certamente seria um singular exemplo para
sua interpretação...
Mas,
por que todo esse arrazoado? Eis que descobrimos novas “essências”
perfumísticas: Michele, ex-primeira-dama tornou-se rótulo para uma essência
qualquer que será comercializada não por ela em si mas pela referência
especulativa.
Como
não bastasse anunciam uma essência com o nome do marido. Desconsiderando a
ironia de José Simão – de que a dita cuja encontraria suas raízes no “aroma
capim” – certo que a coisa já transita pela comercialização.
Lançamento
com pompa e circunstância muito brevemente. Não faltará quem esgote reservas
financeiras, saque da poupança, venha a se endividar – até mesmo reduzir o
dízimo para as igrejas, os que o pagam – para fazer parte dos enlevados que aperfeiçoarão
a sensibilidade olfativa e, para provar a utilização de tal inovação, não
causará surpresa que venham a andar se cheirando como cão pelas ruas para
demonstrar afeto, fidelidade e admiração idolátrica às fontes das “essências”.
E
ficamos a matutar, a que ponto estamos alcançados: para uma gente que ilustra
seu conhecimento universal reconhecendo Israel como país cristão (certamente
por desconhecer o assassinato de Jesus a pedido da teocracia local), que ainda
insiste em reconhecer a quadratura da Terra, que nega avanços da Ciência em
benefício da vida etc. etc. etc. trilhar por fragrâncias impostas não lhes
custará reconhecer e propagar como profecia aos quatro ventos do universo a
essência do pum como dádiva divina e a mais estonteante de tudo até hoje levada
a termo.
Em
especial alcançará eflúvios ímpares se dita ‘essência’ se originar de algum
mito ou de quem lhe esteja próximo.
domingo, 25 de fevereiro de 2024
O Presidente Lula andou lendo Plutarco
No último século antes da Era Cristã os romanos avançavam para consolidar sua expansão econômica e territorial dependendo em muito do produzido nas províncias conquistadas. Alcançaria foro de império em dimensões gigantescas no curso dos anos (Norte da África, Península Ibérica e Oriente Médio), mas houve tempo em que Roma dependia dos mares e não se pode dizer que detivesse controle pleno sobre eles; os riscos de navegar muito grandes, incluindo a temida pirataria no entorno da Sicília.
Por volta de 70 a.C. ao general Pompeu (106-48 a.C.) a incumbência de transportar o trigo das províncias para a sede do Império de Roma e diante do temor esboçado por seus comandados – afirma-o o historiador Plutarco – teria proferido a famosa frase que veio a ser referência para o poema de Fernando Pessoa “Navegar é Preciso” como tema para a criação como vocação do homem, que o insigne português punha acima do próprio viver:
Naqueles tempos, os riscos de navegação eram grandes, em virtude das
limitações tecnológicas e dos vários ataques piratas que aconteciam com
relativa frequência. Sendo assim, os tripulantes daquela viagem viviam um grave
dilema: salvar a cidade de Roma da grave crise de abastecimento causada por uma
rebelião de escravos, ou fugir dos riscos da viagem mantendo-se confortáveis na
cidade de Sicília. Foi então que, de acordo com o historiador Plutarco, o
general Pompeu proferiu a lendária frase.
Não afirmemos que tenha Lula lido Plutarco, mas – quando nada – sabe-o
pronunciada por Ulisses Guimarães, ao lançar-se anticandidato à Presidência da
República em setembro de 1973 enfrentando a peito aberto a ditadura militar
naquela fase das mais macabras.
Os riscos de aventurar-se por mares bravios (enaltecidos por Camões nos
Lusíadas) não constitui privilégio ou primado de uma época, de um instante no
curso da História, mas do reconhecimento da dignidade diante do terror, do
medo, do assombro. A perseverança em marcar posição em defesa de um ideal acima
da própria vida.
Afastado de qualquer ufanismo nos filiamos ao enfrentamento levado a
termo pelo Presidente Lula ao questionar o genocídio posto em prática por Israel
(em sua dimensão sionista) sob o crivo de Netanyahu. Não por ser Lula
presidente do Brasil; mas por existir e levantar sua voz contra tamanho absurdo.
Sua grandeza existe em externar sua voz contra oprimidos além fronteiras.
Afinal, o povo palestino não pode ser confundido com este ou aquele grupo que
ponha em prática atos condenáveis. Quem admite que a matança que ultrapassa 30
mil mortos – que não são do Hamas – entre recém nascidos, mulheres e idosos,
hoje privados até de alimentação, não o faz por conhecimento histórico,
tampouco por reconhecer Jesus como sionista. Afinal, por defender o que
defendeu foi assassinado pela cúpula do Sinédrio que impôs a Pilatos sua
condenação sob pena de ser ‘traidor’ de Roma.
Afinal, como já registramos neste espaço (Lá estavam os Cananeus)
DEUTERONÔMIO 20
16 Contudo, nas cidades das nações
que o Senhor, o seu Deus, lhes dá por herança, não deixem vivo nenhuma alma.
17 Conforme a ordem do Senhor, o seu Deus,
destruam totalmente os hititas, os amorreus, os cananeus, os ferezeus, os
heveus e os jebuseus.
...
1
SAMUEL 15
3 Vai, pois, agora e fere a
Amaleque; e destrói totalmente a tudo o que tiver, e não lhe perdoes; porém
matarás desde o homem até à mulher, desde os meninos até aos de peito, desde os
bois até às ovelhas, e desde os camelos até aos jumentos.
Os que enfrentaram o poder concentrado e manipulado sabem – alguns não
tiveram tempo de percebê-lo no existir – que põem sua vida em risco. Os loucos
e desvairados aí estão imaginando-se heróis. Que o digam Lennon, Kennedy,
Gandhi, Luther King e profetas do Velho Testamento (o último deles,
Jesus de Nazaré, assassinado por enfrentar o poder judaico de então).
Há quem pense em si em detrimento dos que sofrem. Mas não cabe somente
aos profetas clamar contra as injustiças, contra os poderosos.
Dito isso, pode não ter Lido Plutarco ou Fernando Pessoa, mas deste
certamente o Presidente Lula conhece e verberou para o mundo: “Tudo vale a pena
/ se a alma não é pequena” (Mar Português).
E do poema trazemos sua conclusão:
“Deus ao mar o perigo
e o abismo deu,
Mas nele é que
espelhou o céu”
domingo, 18 de fevereiro de 2024
"Êta paisinho..."
Perdoe-nos o paciente e estimado leitor deste escriba
de província o tanto retardar a postagem deste semanal. Problemas técnicos
presentes, mas não somente isso.
Vivenciamos singularidades que – nessas quase oito
décadas de existência – não imaginaríamos viver. Dentre muitas a forma como a
denominada imprensa ‘formadora de opinião’ trata a realidade. Inelutável que o
país hoje ocupa espaço no concerto das nações como há muito não ocupava. Esse
nosso “há muito’ está voltado para um fato concreto: muitos são os anos para
reconhecimento, mas para destruí-los pouco tempo basta. E quem mais o afirma
não está restrito aos limites territoriais desta terra brasilis. Mesmo
porque – no quesito ‘opinião editorial’ – nenhum destes arautos da verdade
encontra reconhecimento lá fora.
Dizemos isso – e logo decidimos concluir a especulação
– porque se nos basearmos naquilo que esses ‘técnicos de fancaria’,
‘comentaristas a serviço de quem os paga’, e quejandos tais, o país está
definitivamente alheado do resto do mundo no plano diplomático, desfeito de
perspectiva na seara da Geopolítica, sofrendo reveses na política econômica
(interna e externamente) etc. etc....
Mesmo quando o seu Presidente estabelece postura em
nível planetário – agradando ou não, o que é natural – a plebe ignara (obrigado
Stanislaw) do pensamento único de imediato ocupa o espaço do auditório
reservado à “turma do gargarejo”, dispensa a análise lúcida e cai de pau e pedra no indigitado, quando
lá fora a exaltação está mais expressa e somente contra ela gritam e esperneiam
os efetivamente atingidos com a verdade diplomática diante da crueza da Geopolítica
pensada pelo Ocidente.
Nada a criticar diante da ‘qualificação’ crítica.
Afinal, quem pouco ultrapassou as primeiras letras do alfabeto humanístico e
ainda não superou conta de somar e diminuir no âmbito da distribuição da
riqueza de todos concentrada em unzinhos, falar em questões de tamanha
envergadura cheira a falar de “paz e amor’ para quem só conhece a guerra.
Em “O Homem Que Desafiou o Diabo (2007), dirigido por
Moacyr Góes), o personagem ainda não tornado Ojuara - vivido por Marcos Palmeira - levanta-se, abre a janela,
olha para a rua e destila: “Êta cidadezinha de merda!”
Adiantamos ao caro e estimado leitor que o ‘paisinho’ não é o país em sua totalidade, mas parte de sua gente que se imagina dominá-lo por deter uma caneta ou teclado. E nem se fale dos que se expressam nas ‘telinhas’ alcunhados de ‘experts’, ‘comentaristas’, ‘profetas’ – e nem fale de quem disponha de um púlpito – verborragindo baboseiras.
Não é a Jardim dos Caiacós do filme. Mas, êta paisinho...