Nunca
nos furtamos a observar os fatos atuais à luz de uma visão histórica. Desta
forma — ainda que não pretendamos ver nos repetidos necessariamente uma ‘farsa’ — temos na reflexão a condição de reconhecê-los e com eles aprender.
No
breve e superficial vasculhar nestes últimos 100 anos de Brasil temos como
marco inicial o governo de Artur Bernardes (1875-1955), político mineiro (vereador,
deputado federal, secretário de estado em Minas Gerais, senador) que se elege
presidente (assim denominada a governadoria na época) de Minas Gerais de 1918 a
1922 e que assumirá a presidência da república de 1922 a 1926.
Seu
período foi marcado por fatos significantes como o movimento tenentista (desde
a revolta do Forte de Copacabana, em julho de 1921 — quando aguardava a posse,
em novembro — à Coluna Prestes, de 1924 a 1927), uma guerra civil no Rio Grande
do Sul, a Revolta Paulista (1924). Não à toa governou praticamente sob estado
de sítio, decretado para controle das tensões.
Ao
tempo de governo deslanchou a siderurgia em Minas Gerais e a Escola Superior de
Agricultura e Veterinária de Viçosa. Defendeu o controle dos recursos minerais
pelo Brasil e ideologicamente integra o torreão de nacionalistas. Na política
externa marcou posição contra a Liga das Nações, dela afastando o país em 1926.
O
apanhado acima pode ser encontrado na Wikipédia. O que ali não encontramos é a
razão por que retirou o Brasil da Liga das Nações (a ONU de seu tempo). Cremos
que tal fato esteja vinculado a não haver se curvado aos interesses da
Inglaterra que, através da Comissão Inglesa (o FMI de então), exigia do governo
brasileiro a privatização do Lloyd Brasileiro, Central do Brasil, Banco do
Brasil e estatais outras como ‘joias da coroa’ a serem doadas ao
setor privado internacional.
A
ascensão de Washington Luís, Getúlio Vargas, Eurico Gaspar Dutra, Juscelino Kubitschek, Jânio
Quadros, João Goulart, os impostos pela ditadura militar, José Sarney, Collor
de Melo, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luís Inácio Lula da Silva,
Dilma Rousseff e os que lhe sucedem por força do golpe de 2016 e da eleição de
2018, podem ser divididos entre compromissos históricos que materializam uma
vocação nacionalista ou a ela contrária.
Basta
que situemos, mesmo en passant, as
legislações sociais (CLT, salário mínimo, previdência e saúde pública), a descoberta
e nacionalização do petróleo, a Petrobras (sem esquecer das descobertas do
pré-sal recentemente), Volta Redonda, a Refinaria Landulfo Alves, a Eletrobras,
a Nuclebras, a indústria naval, a indústria metalúrgica, a automobilística e a aeronáutica
(Embraer) etc.
Estamos
no limiar de uma eleição presidencial em que o centro da disputa está norteado
pelos mesmo conflitos ideológicos de um século atrás. Mais acentuadamente
porque não mais em disputa o Lloyd Brasileiro, a Central do Brasil, as estatais
e o Banco do Brasil. Mais, muito mais... além do que já foi transferido para a
iniciativa privada a troco de tostões.
A
leitura histórica demonstra, caso somemos os períodos nacionalistas ou próximos
dele, cerca de pouco mais de seis décadas de hercúleas batalhas em defesa e
conquista de políticas públicas nacionalistas vitoriosas e em curtíssimos períodos a adulteração ou destruição destas conquistas
no quesito controle brasileiro das riquezas que detém.
Temos,
mesmo que não aprofundadamente em alguns casos, reiterado críticas à falta de
compreensão desta realidade por parte de setores nacionalistas encastelados à
esquerda. Um pecado que atinge igual pensamento mundo a fora, como observa o jurista e filósofo Alysson Mascaro (TV 247).
Apenas
para não esquecer em torno de manifestações mais recentes deste escriba de
província (aqui e aqui) destacamos:
Mas, eis, para este escriba de
província, o busílis: FHC votando em Lula. Ele, pensador/servidor mor do
mercado, arauto do neoliberalismo predador, custeado pela Fundação Ford desde
que adjutorou aquela teoria da dependência, paternidade maior da entrega do
patrimônio nacional, que não fala o que o ‘patrão’ não queira, sinalizando
acompanhar petralhas e comunistas de plantão.
Isto o que muito preocupa este
escriba: vencer eleição sem vitória para o povo. Naturalmente as políticas de
governo petistas traduzem melhor as políticas de Estado. E não faltam a Lula
capacidade e inteligência (como o fez no tempo em que governou) para entregar
os dedos (agradar o mercado) para não perder os anéis (reduzir desigualdades,
aplacar a fome, oferecer emprego etc.).
Mas, alguma certeza de reversão da
criminosa entrega do patrimônio do povo? Particularmente não cremos que tal
ocorra.
Quando FHC, oráculo do entreguismo,
fala em votar em Lula alguma coisa sabe.
________
“Por
enxergar detalhes tais — como já escrevemos recentemente — só acreditamos na candidatura de Lula se houver por parte dele garantia
para o mercado/classe dominante (que se apropriou do país recentemente) de que
não haverá ‘quebra de contrato’. Ou seja, o que
fizeram/compraram/espoliaram/queimaram será respeitado.”
Premonição,
parece o que escrevemos, quando lemos declarações do ex-ministro Celso Amorim ao 247 em torno de um pacto com a classe dominante para assegurar a eleição e a posse
de Lula, caso vencedor em 2022.
Disse
o que querem ouvir. Certamente sua fala não é pessoal. Ex-chanceler, homem
respeitado no Itamaraty, seu papel é de porta voz entre um e outro lado.
Não
sabemos se (nos) convence, mas o ‘pacto’ está anunciado.
“É importante que o Lula ganhe e
que ele tenha uma base ampla, como ele teve no passado. Alguns que faziam parte
do governo do presidente Lula tinham fortunas e backgrounds ligados a outras
classes sociais, mas ele jamais deixou de se preocupar com a integração dos
pobres na sociedade, colocar os pobres no Orçamento, como ele sempre diz, e, de
fato, produzir avanços notáveis, como, por exemplo, o salário mínimo e as cotas”
O novo governo petista, portanto,
não deverá ser neoliberal, nem socialista. Neoliberal não, mas não acho que
haverá uma revolução socialista. Inevitavelmente, alguma pactuação haverá com
os empresários que estejam dispostos a investir no Brasil, com os empresários
estrangeiros que estejam dispostos a se desenvolver aqui, como aconteceu no
passado com a indústria naval e com a indústria automobilística”.
Reconhecemos
a imperiosa necessidade de retirar do regime(!) de fome os 10% que hoje dela
padecem e outros milhões a caminho do precipício.
Louvado,
que o seja. Afinal, continuar no projeto(?) em andamento nada mais será que a
condenação à eternização da miséria. Mas, o sonho de ver o Brasil retomar parte
do que lhe foi retirado/roubado recentemente... fica para outro milênio.
Mas,
cremos (quando não queríamos) que continuaremos a vivenciar a ilusão da
esquerda pactuando com a burguesia como pontua Breno Altman, também no 247. Uma esquerda que peca pelo mesmos vícios
que acomete a mundial (com raríssimas exceções).
Afastar
a perversidade instalada como políticas de Estado será um grande e
significativo passo.
Certamente
a única saída que resta: Sísifo convencer com o pacto anunciado.
Ultrapassada a
mítica fica a indagação: aprenderá a lição? Teremos condições de entender Mascaro?
Ou somente nos bastará participar do embate (e vencê-lo para ocupar o poder por
um novo curto tempo histórico), alimentando a próxima vitória da classe
dominante?
Não
se afirme — como ao Sísifo enviado por Zeus ao Hades e lá submetido ao castigo
por toda a eternidade — que a labuta do Sisyphus
brasiliensis (a versão tupiniquim do mito) esteja fadada ao fracasso. Seria
exacerbação pessimista e negação à Esperança que resta ao brasileiro em geral.
Mas não deixa de ser um esforço longo e repetitivo.
A
História é quem o afirma!