domingo, 19 de dezembro de 2021

Nas entrelinhas a continuidade do jogo

 

Ainda que a semana entrante se faça de esperança para o consenso ocidental, sublimada na existência de um símbolo do mercado que se ampara no primado cristão para justificar suas ações (compre e dê, compre e dê...) não há como dissociar a realidade que se avizinha da íntima relação com a expectativa de dias melhores, o melhor dos presentes ansiados.

Duas décadas são o palco da encenação: uma experiência político-administrativa recente, caminhando para o sexto ano, que se contrapõe àquela vivida nos 14 anos anteriores a nortear o desejo de que  traduzidas em defesa dos interesses da sociedade as políticas públicas sob a atuação do Estado.

De certa forma, uma metáfora ou alegoria se faz presente: que a atuação do governo se afine com a ficção noelina, qual seja dar presentes, e que não sejam os clássicos sob a égide do ho-ho-ho do morador da Lapônia. Porque a massa da sociedade ora carece do fundamental: comida, saúde, educação, emprego através da retomada da atividade econômica que segure tudo aquilo.  

Desta forma não há como afastar o instante natalino do processo eleitoral que se avizinha. E em torno dele o debate entre as experiências imediata e mediata.

Registramos em Não há mistério: “De entender ou buscar a razão por que não há quem se interesse sem interesse. O processo eleitoral o demonstra”. E cá estamos neste acompanhar porque discutir possível resultado eleitoral é ‘chover no molhado’ e cansar o leitor diante de tanta tormenta: Lula vencerá as eleições no primeiro ou segundo turno. A não ser – cala-te boca – que o mercado não confie nele e resolva buscar outras soluções, inclusive... libertando Adélio.

Temos registrado, sem arroubos acadêmicos, com palavras outras, a inexistência do Estado em dimensão conceitual diante da apropriação da instituição política pelas classes dominantes no correr dos séculos.

Postos os peões no tabuleiro avoluma-se a imprescindível análise em torno de propostas e projetos que permitam confiar naquele que pretende alcançar a magistratura maior da nação.

Da jornalista Myriam Leitão (veiculada no 247), porta-voz de destaque em defesa do golpe de 2016, sobre o proclamado Sérgio Moro: “No mercado financeiro já se ouve o farfalhar dos apoios incondicionais à pessoa sem conteúdo definido, como houve em 2018. O autoengano recomeçou", escreve Miriam. E prossegue: "O problema em torno de Sergio Moro é o quase nada que se sabe sobre suas ideias em várias áreas. Nos 16 meses que ficou no Ministério da Justiça, Moro barrou demarcações de terras indígenas, mandou o fracassado pacote anticrime para o Congresso, embutindo nele o excludente de ilicitude,... e abonou os sinais de desvios éticos no governo Bolsonaro, quando começaram a surgir".

E mais: “Houve um evento assustador na sua gestão no Ministério. Greve de policial é proibida, porque é motim de pessoas armadas. E que foram armadas pela sociedade com o fim exclusivo de protegê-la. Policiais militares se amotinaram no Ceará, desafiando o governador Camilo Santana e levando medo à população. Moro enviou o coronel Aginaldo Oliveira para resolver o conflito. Lá, o coronel definiu os amotinados como corajosos e gigantes".

Afastados os interesses pessoais e corporativos defendidos por Myriam Leitão o que diz contém verdades insofismáveis: o despreparo deste ensaiado mito, como daquele outro. Mas se o atual presidente conviveu com a política, Moro somente a praticou inapropriadamente no âmbito de interesses alheios às instituições nacionais. Sob a capa de combate à corrupção – e sob o manto do “eu acho” – prendeu quem queria prender e soltava os que faziam o seu jogo.

Fica-nos a indagação, já levada a termo como explicação, em outros instantes/textos deste dominical: o que remete parcela do mercado à defesa de figuras tão bizarras postas como ‘soluções’ para o país a ponto de incomodar até uma porta-voz do sistema.

Para compreender, caro e paciente leitor, é imperativo ler o que está contido nas entrelinhas. E entrelinhas se encontram com outras declarações, estas trazidas pelo editor Lúcio Costa Pinto, do 247, que diz ter ouvido de empresário de renome e com assento na Avenida Paulista de que a parcela em torno dele não votará pela reeleição do atual muito menos no Moro (“Ninguém vota no Moro”!

Para não cansar nosso caro e paciente leitor – e mesmo não ‘chover no molhado’ diante do que temos escrito neste espaço – cabe apenas “Entender ou buscar a razão por que não há quem se interesse sem interesse”.

Myriam Leitão é porta-voz do empresariado, como o é o empresário da conversa. Cada um defendendo seus interesses: um, através de porta-voz; outro, testemunhando os pares.

Pode-se mesmo especular até o limite dos interesses de um e de outro: os defendidos pela porta-voz muitos estão lá fora exercitando o controle sobre esta terra brasilis por via de contemporâneo colonialismo; o outro, mais vinculado a este chão.

O que está nas entrelinhas é a continuidade do jogo. Que, no fundo, atende a Papai Noel e não a quem nasceu na Manjedoura.

Ao povo desassistido resta a esperança de ver retornados aqueles dias melhores já experimentados.

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A visão deste escriba de província para o Natal está expressa em “Epifania” (Portal da Piedade; Via Litterarum, 2018), disponível em GGN/Luiz Nassif .


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