Ei-los.
Longe do
palco
Já
registramos em outro escrito (Itajuípe) a representação ideologizada da terra
cacaueira como palco – ainda longe a saga grapiúna – no Jorge Amado de Cacau. Ali posta, ainda que en passant, a expressão
empírico-amadiana da luta de classe nas relações capital-trabalho tendo como coxia
as terras do Sequeiro, as gentes sob ótica maniqueísta, em sua tradução do
marxismo recém ensaiado pelo viés stalinista, objeto de inspiração para o
ferradense.
Há na
região quem veja naquela obra o início da literatura grapiúna em Jorge Amado.
Discordamos, salvo melhor juízo, justamente porque não está em Cacau o que se
materializa nos diversos planos científicos exigidos para a compreensão da Civilização Grapiúna (Antropologia,
Sociologia, História, Economia, Política, etc.) elaborados e fixados a partir
de Terras do Sem Fim.
Em Cacau grapiúna é apenas o ambiente para o jovem idealista carbonário, não o tema. Que não deixaria de sê-lo se ambientado no canavial, no cafezal, nos gerais, na mineração, nos pampas. Tão só – sem deméritos – o proletarismo regionalizado, subsumido no panfletarismo da luta em defesa dos oprimidos. O inconsciente coletivo da grapiunidade, móvel concreto da sociologia regional, aguardará Terras do Sem Fim para desencadear-se em exibição como exercício de identidade definitiva, aprimorando-se em São Jorge dos Ilhéus e se fechará, como ciclo literário autônomo, com Tocaia Grande, passando por Gabriela, Cravo e Canela, que exibe, premonitoriamente, os sinais de mudança por que passará a região no enfrentamento à tradição.
Em Cacau grapiúna é apenas o ambiente para o jovem idealista carbonário, não o tema. Que não deixaria de sê-lo se ambientado no canavial, no cafezal, nos gerais, na mineração, nos pampas. Tão só – sem deméritos – o proletarismo regionalizado, subsumido no panfletarismo da luta em defesa dos oprimidos. O inconsciente coletivo da grapiunidade, móvel concreto da sociologia regional, aguardará Terras do Sem Fim para desencadear-se em exibição como exercício de identidade definitiva, aprimorando-se em São Jorge dos Ilhéus e se fechará, como ciclo literário autônomo, com Tocaia Grande, passando por Gabriela, Cravo e Canela, que exibe, premonitoriamente, os sinais de mudança por que passará a região no enfrentamento à tradição.
Desde então,
existe; como signo. Com a história própria, e única, de uma saga. Não mais o
palco das batalhas, mas as gentes todas que deram forma à epopeia de uma
civilização provida dos elementos necessários à conformação do ethos grapiúna: povo, território,
cultura, economia, leis, valores, sociedade consciente (dominante e dominada), símbolos, evolução do
nomadismo ao sedentarismo, significados nela brotados, refletindo em unidade e
maneira própria de ser, com capacidade de ser entendida em sua diversidade e
abstração política capaz de reconhecimento pelo método científico.
De
registrar que Amado nunca negou sua origem. E O Menino Grapiúna o confirma em prosa.
A
densidade espacial dessa literatura codinominada grapiúna – se tomamos o núcleo
das batalhas pela terra – está no entorno de Itabuna, com registros específicos
para as plateias encasteladas em Ferradas e Mutuns, sem dispensar Pirangi. Sob
o viés do coronel como motor da construção de um elemento de significativo
conteúdo econômico – o cacau – são elas o centro de atenção.
Atentemos
para um fato pouco explorado: em que pese as terras disponíveis, dentro das
sesmarias originadas da Capitania de São Jorge dos Ilhéus, somente o solo
próximo ao litoral foi objeto de lutas para a conquista, a ocorrer, em
intensidade, no município recém emancipado. O universo de planície de mata até
a encosta da Ouricana, limite com o planalto que alimenta a região da Ressaca,
fronteira denominada do rio Pardo, onde erigida Vitória da Conquista no topo do
acidente geográfico, não foi objeto da cobiça e deixada o foi para o
aventureiro da pecuária na sede de João Gonçalves da Costa e do filho José. Muitos
foram os fatores a sustentar esse desinteresse, dentre eles a dificuldade de
acesso do litoral ao interior e, consequentemente, de trânsito para o produto,
facilitado à mercadoria transportada pelos próprios pés.
O sangue
derramado e o desenvolvimento de métodos como o caxixe, ausentes naquele
universo físico – ou menos presentes, assim vemos –, são fruto daquele desinteresse.
Não têm
faltado iniciativas – esparsas, que sejam – visando tornar Itabuna uma
referência amadiana nos moldes efetivados por Ilhéus. Que soube – com
inteligência e organização político-administrativa – muito bem utilizar-se do
que relatou Jorge em torno de si.
Cabe
registrar, dentre aquelas, a posta pela ACODECC e ACARI, em projeto no ano de
2010, como instrumento antecipativo do centenário do ferradense,
apropriadamente denominado de “Irmão JORGE, 100 anos AMADO”. Que legou, quando nada,
a reconstrução (inserida de um teatrinho equipado), da casa onde morou Jorge no
imediato da fuga da Auricídia depois da enchente de 1914, a instalação de um
pedestal que recebeu uma estátua do escritor e projetos culturais (um deles,
internacional) dotando Ferradas como destino de autoestima e reconhecimento em
torno do ilustre filho.
Talvez,
como lembra-nos um amigo, ainda se mantenha em nosso seio a resistência ao comunista, razão por que muito mais valorizado
para a classe dominante regional – aquela objeto de desnude por JA – o
integralista Adonias Filho, da vizinha Itajuípe.
Encontramos
em Hélio Pólvora a seguinte afirmação: “Os adeptos da camisa vermelha, em grande
minoria no sul do Estado, e sem força do dinheiro, levavam a pior; [...] A
presença do Integralismo era tão marcante em terras cacaueiras que até meu pai,
homem simples e sem quaisquer ardores político-ideológicos, comprou um exemplar
de Minha Luta (Mein Kampf) de Adolf
Hitler – e logo depois arrependeu-se.” (O que a minha geração leu, em O Espaço
Interior).
Ao que
parece, Itabuna – como um todo – ainda não se arrependeu. E lança às calendas
uma fonte turística de cabedal internacionalmente reconhecido e buscado.
E com isso
perdemos a participação no épico que nos cabe com palco e personagem.
O resgate
histórico se impõe. Certamente porque há uma lacuna a ser preenchida. Que muito
bem pode estar expressa no que diz Gustavo Veloso, ferradense, autor de Ferradas: um capítulo na História do Brasil
(Via Litterarum-2010), de quem tomamos as seguintes palavras (tão só
substituindo o tempo verbal do condicional para o presente): Itabuna só será projetada para o futuro se
dispensar a Ferradas as atenções que faz por merecer.
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