domingo, 19 de janeiro de 2020

A ideologia da autocrítica


Certeza temos de que o país seria melhor aquinhoado de sementes da Felicidade caso não se fizesse permanente palco de disputa entre dominantes e dominados. Os primeiros ampliando território e avançando, insaciáveis, sobre o que resta do alheio.

Como credo, melhor seria que uma consciência de respeito ao semelhante fosse posta em prática como corolário de Civilização. O desprendimento para com parte da riqueza acumulada, destinando-a também aos que contribuíram para a acumulação como força na produção.

Que a acumulação pudesse ser compreendida nos limites da busca individual por tranquilidade e segurança materiais, nunca como instrumento de controle e de mais aprofundar a apropriação aos menos aquinhoados reduzindo-os aos limites da miserabilidade como futuro.

Que os instrumentos do Estado não se fizessem baraço e cutelo para privilegiar uma minoria cada vez mais concentrada e escassa aritmeticamente.

Minoria ideologicamente amparada na ideia de que o indivíduo – concentrando riqueza – supera o coletivo, de que o poder material traz aos pés todos aqueles que não o detenham  porque, acima de tudo, fui agraciado com bênçãos e traduzo méritos apenas por mim alcançados.

Este culto da humilhação do outro que não dispõe dos meios para atender às necessidades básicas alimenta um mundo bizarro onde o Homem – destinatário da Felicidade – se torna unidade estatística para corresponder aos interesses de uma minoria cada vez menor e mais ávida.

A manipulação a seu favor dos variados fenômenos sociais e da ideia de que o seu grupo a tudo controlando superará quaisquer dificuldades leva a promover a exclusão do outro como instrumento de inclusão aos seus interesses. O outro estará incluído se estiver a ‘meu’ serviço, se depender do que detenho retirado dele.

Longe do ideário materializa-se na conformação da hegemonia como instrumento de eternização do poder como controle absoluto.

A diferença – pela exclusão – assegura o poder.

Se o outro come iguala-se a mim e, assim, não tenho como submetê-lo. 

E dialogar não é o forte da hegemonia que exerço e defendo com unhas e dentes, e sim a imposição.

Aquele que pretenda exercitar políticas de governo para reduzir desigualdades não há de ser reconhecido pelos benefícios que tenha promovido.

E passo a exigir que sejam reconhecidos os erros: dos outros. Como autocrítica.

Os erros, sim, serão declamados e multiplicados como negação da ação governamental posta em prática. 

Sublime-se no erro humano o conteúdo e a essência da boa prática.

Reconhecer o erro por sonhar com um mundo melhor, de colocar em prática as Políticas de Estado a serviço dos excluídos, que devem ser tratados sob a ótica da desigualdade.

A autocrítica como ideologia impõe-se, então, para alimentar a hegemonia que detenho. 

Para que permaneçam os frutos desta singular supremacia. Em que me visto de hipocrisia.

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