domingo, 26 de janeiro de 2020

Lendo Erich Fromm enquanto lá de fora anunciam o risco de pandemia

O pensador, filósofo, psicanalista e sociólogo alemão Erich Fromm (1900-1980) em “A presente condição humana”, abre este ensaio, inserido em O Dogma de Cristo (Zahar Editores, tradução de Valtensir Dutra, 4ª ed. 1974, p. 80), escrevendo o seguinte: 


“Quando o mundo medieval foi destruído, o homem ocidental parecia aproximar-se da realização final de seus ardentes sonhos e visões. Libertara-se da autoridade de uma Igreja totalitária, do peso do pensamento tradicional, das limitações geográficas de nosso mundo então apenas meio descoberto. Criou uma nova ciência que levou, finalmente, à libertação de forças produtivas até então desconhecidas e à completa transformação do mundo material. Criou sistemas políticos que pareciam garantir o desenvolvimento livre e produtivo do indivíduo, reduziu as horas de trabalho em proporções tais que o homem ocidental pode gozar horas de lazer com que seus antepassados nem sonhavam.


Apesar disso, onde nos encontramos hoje?”

Registre-se que a obra referida foi publicada em 1963. Deste idealista a tese do humanismo normativo, pelo qual o homem tornar-se-ia apático ao se distanciar e abdicar das faculdades humanas vinculadas à razão, o que ocorre quando as condições humano-sociais são contrárias à sua natureza humana.

O nível a que chegamos ultrapassa o surrealismo. Há quem afirme que – em nível de Civilização – estamos regredindo. 

Certamente o que ocorre em nível global muito se acentua nesta terra brasilis. Figuras inexpressivas, incapazes de manter conversa em botequim  (sem agredir o botequim) passaram a ser referidos na imprensa – com destaque inusitado – como figuras extraordinárias, questionadas tão somente por sua forma de pensar quando, quando na realidade caberia indagar se integram a espécie homo sapiens, porque certamente não alcançaram ainda o sapiens sapiens.

Ministro da Tecnologia, atendendo a pedidos, publica o revolucionário “a terra é redonda, sim”. Ele que andou pelo espaço durante 10 dias e o sabe de cátedra. É o nível intelectual no comando: explicar o óbvio, quando não o destroem.

Na esteira da luta contra a Corrupção foram gastos, em auditoria, cerca R$ 17,5 milhões do BNDES para afirmar que não havia corrupção.

Denúncia de 23 milhões de caixa 2 para José Serra, depositados na Suíça, não gera punição porque prescreveu.

O CAPES (órgão incumbido de financiar e coordenar o aperfeiçoamento do pessoal de nível superior) – que integra a construção da formação pensamento do país para esta e as futuras gerações – integra o universo dos que são contrários à teoria da evolução das espécies. Para essa gente, tudo começou há pouco mais de 6 mil anos, como o afirma a ‘melhor’ interpretação do fenômeno sob a ótica dos protestantes que se apegam ao Gênesis como lido pelo judaísmo.

Descobre-se, no Brasil, que o índio está se tornando um ser humano igual a nós outros, como o diz o ilustrado inquilino do Alvorada.

Em vez de avançar caímos mais de uma dezena de pontos percentuais no ranking mundial de combate à corrupção.

Ministro da Fazenda anuncia ao mundo a tese revolucionária de que a pobreza afeta o meio ambiente.

Para fechar a cena: descobre-se na leitura do jornal que uma viúva teve garantida uma pensão de 100 mil mensais porque os gastos da família giram em torno dos 700 mil.

Uma outra – atriz e personagem – é descoberta com uma pensão oriunda de militar na ordem de 6 mil mensais. Já casou quatro vezes; certamente no padre, porque no civil não teria mais direito ao penduricalho. Como ela são centenas de milhares no país. Pensionistas não só de militares: de juízes, promotores, servidores públicos dos três poderes etc. etc.

O inquilino do Alvorada foi alvo de protestos na China. Neste campo iguala-se aos grandes Chefes de Estado do planeta (Estados Unidos, Rússia, Alemanha, Inglaterra, Itália, França etc.).

O mesmo inquilino aplaude a deportação de brasileiros pelo governo dos Estados Unidos (cujos nativos estão dispensados de visto para entrar no Brasil), que chegaram no Brasil com mãos e pés algemados.

Lá fora o coronavirus se alastra e já é epidemia na China. Aqui a pesquisa – na esteira das instituições – sendo destruída, Fiocruz a ver navios, pedindo luz em meio à escuridão. Aquela ministra e sua visão na goiabeira certamente, com sua gente, se imagina com a solução sob rédeas porque tem a Pátria acima de tudo e Deus acima de todos.

Êta semaninha interessante!

Melhor voltarmos a Erich Fromm de “...onde nos encontramos hoje?”, caso estejamos preocupados com o que andam defendendo por aí e para compreender a razão por que de tudo: 


“O nacionalismo é a nossa forma de incesto, é a nossa idolatria, é a nossa insanidade. ‘Patriotismo é o seu culto’” (A sociedade sã, 1955).  

Parece profecia redigida para estes tempos particularmente nossos em sua dimensão tupiniquim.

Nenhum comentário:

Postar um comentário