domingo, 18 de abril de 2021

Euforias a reboque

 

Uma Vela a Deus, outra ao Diabo. Assim entendemos a postura do STF em dois julgamentos que se encontram quanto ao destinatário Lula, que sinalizam ameaças a direitos assegurados em habeas corpus passando por rever a declarada suspeição de Moro. Como observa Pedro Serrano na Carta Capital  “suspeição e incompetência” são fenômenos diferentes. 

Está ficando cansativo. Não basta o estado de calamidade institucional no plano jurídico em decorrência da postura do STF diante de descalabros postos quando observados sob a ótica técnico-jurídica substituída pela jurídico-política em que sinaliza tornar-se guardião de candidaturas políticas e de mandatos sob sua ótica moral.

Uma articulista, Nadejda Marques, no GGN, alerta para o que denomina de juristocracia. Tocou na ferida. A decisão do plenário do STF retirando a corriqueira apreciação de habeas corpus das turmas para o plenário mostra a quantas anda o STF.

Alertávamos deste espaço ser muito cedo para a esquerda e o PT em particular fazerem festa com a declaração de incompetência do juiz Sérgio Moro para o processo do tríplex, assim como sua suspeição. Um ministro mesmo dissera em entrevista a Bandnews que o plenário a reverteria por 6x5.

Aqui estamos caminhando para um beco sem saída dentro do atual formato de autoritarismo, de ditadura sem uso de armas e tropas militares, mas de uma juristocracia respaldada pela cara feia da caserna. Afinal, como mesmo o confessou, o general Heleno ameaçou o STF para que não concedesse habeas corpus a Lula em 2018 a fim de garantir o inquilino do Alvorada.

O que está em jogo não é o direito que assista a Lula, mas o direito que lhe conceda na cuia da mesquinhez o STF. Com recado dado tudo fica claro: sair candidato você pode sair, desde que o queiramos, se coincidir com os interesses que defendemos.

Como se dissessem ­ completamos: ainda não engolimos seu sucesso como governante...

O caro e paciente leitor que nos acompanha sabe o quão crítico temos sido em relação à denominada esquerda e seu discurso nestes últimos e tempestuosos anos. Sabe que temos dito e afirmado que não reflete ela a leitura em torno da realidade e tem se apegado a uma dimensão mítica, qual seja a referência (única) que a expressa (porque por si se fez): Lula.

Na esteira desta toada tudo passa por Lula: o futuro, etc. etc. etc. E para tanto mesmo aplaude o STF de agora; o mesmo que causou toda desgraça.

No tanger da realidade os que levaram Lula ao cadafalso tornam-se santos ao livrarem o líder de pesares em um instante qualquer. A leitura plena da realidade não se configura. Talvez exigência de quem longe está do palco, dialetizando a partir desta província. Mas não se pode descurar de que ele STF existe e a peça é apresentada conforme o público/instante: ontem, afastar Lula; hoje, fazer retornar Lula.

Com um detalhe que ninguém está atentando: dentro de pouco tempo (com futuras indicações do inquilino do Alvorada) a corrente político-religiosa do STF tende a controlar a Corte. Para quem duvida analise a atuação do recém indicado.

A esquerda tomando-se o PT como referência  enquanto no poder não interpretou os fatos à luz da experiência histórica. Não leu os almanaques e alfarrábios da política e do poder no curso da história, pelo menos da recente.

Não dimensionou a geopolítica como instrumento de hegemonia.

Não leu a cartilha estadunidense, em que pese alertado por entrevista de Moniz Bandeira, em 2013 (queremos crer que não tenha lido, para não ficarmos com a ideia de que foi burra) quando afirmou que os Estados Unidos não tolerariam o protagonismo do Brasil.

Não viu a ‘primavera árabe-tupiniquim’ batendo às portas em 2013 sob o álibi das tarifas em São Paulo; tampouco dimensionou que a diplomata estadunidense presente quando derrubaram Lugo no Paraguai se mudara de mala e cuia para Brasília (lá e cá o mesmo método, congresso-judiciário).

Sempre afirmamos que o jogo é bruto.

A desgraça se voltando para o Brasil começou com a descoberta e prospecção do pré-sal. Estados Unidos (CIA e Departamento de Estado) abertamente espionando. O esquema Petrobras foi todo manipulado a partir dos Estados Unidos em conluio com a república de Curitiba. Pepe Escobar, Assange divulgaram os fatos.

Não que desmandos comprovados não devessem ser apurados e punidos. Mas o problema não era a Petrobras, e sim o que ela gerava e o que representaria para a geopolítica posta em prática pela diplomacia dos governos petistas.

Mas outro mas internamente o governo se entendia imbatível, defendido no plano do imaginário pelas camadas beneficiadas por suas exitosas políticas públicas de distribuição de renda, redução do desemprego etc.

No entanto, não lia nas entrelinhas da classe dominante controlando os meios de comunicação (à qual não basta participar, mas deter o comando) e de uma massa de manobra (a pentecostal católica e evangélica) sob comando adverso. Tampouco nem mesmo atinou para o risco de Eduardo Cunha (inimigo de Dilma) assumindo a Câmara e o controle sobre aceitar ou não pedidos de impeachment.

E aí estamos: economia destruída, pré-sal nas mãos estrangeiras, diplomacia em frangalhos. E tudo começa com a aceitação do acima relatado que poderia ter sido frustrado caso Lula fosse candidato em 2014, mas isso é outra história.

Preocupa-nos a leitura que fazemos dos fatos. Não estamos só. Razão por que recomendamos a leitura de Moisés Mendes no 247.

Por enxergar detalhes tais como já escrevemos recentemente só acreditamos na candidatura de Lula se houver por parte dele garantia para o mercado/classe dominante (que se apropriou do país recentemente) de que não haverá ‘quebra de contrato’. Ou seja, o que fizeram/compraram/espoliaram/queimaram será respeitado.

Caso contrário é ficar com as euforias e fazer de conta que não se vê o caminhar da juristocracia e dos que ora dela se beneficiam.


Um comentário:

  1. Como é dificil adormecer e acordar no país da instabilidade jurídica e politica.

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