segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Esperança, eis o que resta

 

O cidadão comum tem sua base de informação pautada no que lê, ouve ou vê. No que diz respeito ao cotidiano o que lê está nos jornais e revistas, o que ouve ou vê através de rádio e televisão. No imediato afetado pelos meios contemporâneos de comunicação  bombardeado por mensagens através de celulares/computadores.

Aqui aventamos em torno da fonte de informação versus a realidade vivida. Ou seja, corresponde a informação recebida à realidade vivida?

Uma ida ao supermercado, ao açougue, à feira-livre reverbera clamores e insatisfações. O dinheiro cada dia mais curto, ainda que as necessidades a serem atendidas estejam reduzidas nas listas dos planejamentos domésticos, algumas sublimadas (ovo em vez de carne etc.).

Mas nos deparamos com os ‘analistas econômicos’ de plantão concluindo que a situação do país está superando as dificuldades e mesmo a melhorar. O cinismo de alguns chega ao desplante de dizer que o imediato não se sustenta no futuro, mas se sustentam nos 'indicadores' de que se valem.

Por trás de tudo tais analistas repercutem políticas do governo federal implantadas para efeitos eminentemente eleitorais, com prazo de vencimento em dezembro, como os ‘reajustes’ de bolsa isso-bolsa aquilo. Nenhuma referência à realidade de que parte do dinheiro que falta escorreu pelo ralo da sem-vergonhice e bandidagens várias, inclusive gastos com pagamento de auxílio emergencial a milhares de mortos que consumiram alguns míseros bilhões de reais (Vermelho) sem falar nos vivos 'muito vivos' encastelados em escalões governamentais vários. Dirão eles que o aspecto não lhes cabe abordar.

Folheando Millôr Fernandes (1923-2012) em “Millôr Definitivo – A Bíblia do Caos” (LP&M Pocket, 5ª impressão, 2005, p. 594) encontramos:


“[...] Heróis nunca me iludiram. Quando caço o homem, como Nemrod na Bíblia, e procuro alvejar individualmente o mesquinho, o covarde, o safado, o hipócrita, o corrupto, o incompetente e, coletivamente, a medicina, a política, a psicanálise, o jornalismo, o economismo e sandices (que são as minhas, eu nunca esqueço; só que eu nunca esqueço; a maior parte das pessoas nem se lembra) não estou preocupado com essas falhas e defeitos insanáveis, mas com o inevitável fim a que isso leva – a desumanidade do homem para com o homem”.

Eis o retrato cru da crueldade com que tratado o homem brasileiro. A desumanização como política de estado maquiada através do jornalismo econômico em defesa do individualismo, negando a coletividade de pessoas, todas iguais em espécie e a maioria transformada em pária por um sistema que explora a totalidade em benefício de um punhado.

Em meio a ‘sandices’ tantas o Cristianismo manipulado para produzir riqueza a ponto de até marchar pelas ruas “em nome de Jesus” exibindo arma como novo instrumento de fé, essa fé mesquinha que alavanca a miséria que mata e ensina a matar para sobreviver.

Mas  é também da natureza humana, ainda que explorada e vilipendiada  acreditar em algo que não toca mas assegura suportar o dia seguinte que desconhece. Em meio a isso a sublimação, a busca por sentir possível a realização de um sonho, de confiar, de acreditar.

Não tendo como entender tanta mensagem otimista quando seu imediato se faz de pessimismo resta se apegar a alguma coisa. E não lhe falta. Sim, caro e paciente leitor, porque entre as virtudes teologais  ao lado da caridade e da fé  a esperança ainda existe e, nestes nada áureos tempos, mesmo desfila portando uma arma.

Esperança, eis o que resta. Não sabemos como será exercitada.

Afinal, “Num país como o Brasil, manter a esperança viva é em si um ato revolucionário” (Paulo Freire).

Se já o foi para Paulo Freire (1921-1997) imagine para os que vivemos 25 anos depois bombardeados por mensagens de otimismo!

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