domingo, 4 de agosto de 2019

Por entre leituras, ou a falta delas, as armadilhas que nos cercam


Sob o condão do título publicaremos, a partir de hoje, três artigos voltados mais precisamente para refletir em torno do comportamento da esquerda brasileira diante da uma realidade que se apresenta bem distinta daquela que a norteou em tempos de guerra fira.

É que, assim vemos, o hodierno pautado que está na velocidade – também no esquecimento – com que as informações chegam e se vão, manipuladas em profundidade sem o correspondente contraponto.

Pode ser compreendida sob diferentes dimensões, inclusive a de pessimismo.

Por entre leituras ou a falta delas

Lúcida reflexão de Gilberto Gil, de que o presidente eleito representa quem o elegeu, a vontade e o sentimento dos que votaram nele. Aquilo que lhe outorgam como idiossincrático traduz, no seu dizer e na porralouquice do singular expressar, o que diz e expressa parcela considerável da sociedade brasileira. 

E não se vincule tal fato à formação intelectual, à condição econômico-social, ao ser pobre ou miserável ou doutor.

Quem na sociedade faz movimento para combater as instituições democráticas, pedindo para fechar Congresso, para fechar Supremo Tribunal Federal, que se proclama contra o estatuído na Constituição, quem questiona o Estado de Direito, quem vê na decisão judicial um estorvo tem em si a mesma matriz autoritária, a mesma vocação ditatorial. 

Apenas carecia de um representante ideal, que afinal encontrou apesar de experiências e tentativas várias e variadas: de Jânio a Collor, de Sarney a FHC, de Temer ao atual inquilino do Palácio do Alvorada, a mais perfeita de todas no que diz respeito aos objetivos que em todos os instantes se fizeram presentes no pacto de tornar o país cuia de pedinte na mendicância internacional sem vocação a personagem de "Deus Lhe Pague", de Joracy Camargo (1898-1973).

O atual inquilino do palácio do Alvorada é a mais pura e perfeita tradução dessa encastelada tradição autoritária presente na sociedade. Não se vincule a ele, tampouco se lhe dê o privilégio, aquela ideia de que “bandido bom é bandido morto”, de que preso tem de apanhar, de que a pena de morte é a solução para a criminalidade porque ele não está só. Ao contrário, não são poucos os que sempre pensaram assim. O dito cujo apenas a representa; é sua ‘mais grata’ e atualizada manifestação.

O que nos deixa perplexo é a falta de leitura da realidade que nos aflige (há muito), que ainda não se encontra suficientemente dimensionada além do panfletarismo do instante ao sabor de quem o utilize, à direita ou à esquerda.

Quando a ex-presidente Dilma Rousseff (responsável por não ler o instante precipitado em 2013) proclama em torno da necessidade de ‘construir uma frente contra Bolsonaro’; quando Fernando Haddad denuncia que o Brasil se tornou protetorado dos Estados Unidos; quando, afinal, o óbvio surge como se fora revolução em plenitude, longe estão todos de expressar a RAZÃO por que tudo aconteceu e acontece.

No primeiro caso, por que alguém desconhecido e inexpressivo política e intelectualmente, reformado/aposentado aos 33 anos por prática de ameaça terrorista (explodir a adutora do Guandu, na cidade do Rio de Janeiro, em 1986), sem participar de qualquer debate, sem expor qualquer possível ideia de como administrar o país, de como via o Brasil no plano da diplomacia etc., de como enxergaria em nível de governo as Políticas de Estado de Bem Estar Social insculpidas na Constituição conseguiu amealhar os votos que conseguiu, quando apenas liderança oportunística dos antes relegados ao canto escuro da expressão social.

No segundo caso, como o exercício do Poder (inclusive sobre a Informação e a Contrainformação) não percebeu (ou dimensionou) o quão inconveniente se tornara o Brasil em relação aos interesses dos Estados Unidos ao conquistar espaços no terreno hegemônico e geopolítico do planeta.

Ainda quanto ao segundo: qual a percepção demonstrada – que alcançasse a compreensão da sociedade – do quanto representavam de prejuízo para os Estados Unidos os avanços obtidos pelo Brasil no âmbito do comércio internacional, na aproximação com China, Rússia, Índia, Suécia, França, da expansão comercial em relação ao continente Sul-americano, ao Africano e ao Caribe, Oriente Médio e Ásia.

Tenhamos a certeza, de que o que ora nos acomete tem raízes profundas, enraizadas nesta sociedade que não rompeu suas amarras com o escravismo, onde senhores ainda permanecem senhores e escravos ainda não sabem da Lei Áurea. Muito menos por que essa – a Lei Áurea – aconteceu e a que interesses atendeu (inclusive da Inglaterra).

Ou seja, não podemos repetir o erro de sempre: o de não ler e enxergar. 

Somente assim não sucumbiremos à cultura de retomadas esporádicas de vitória popular, massacradas em seguida. Não apenas “construir frentes”, mas muros de aço. E descobrindo quem, aqui dentro desta terra brasilis, assegura a vocação tupiniquim para protetorado dos Estados Unidos.

Enquanto a massa não souber – e aprender – viveremos de solavancos.

À esquerda – e ao PT em particular – compreender estes novos tempos e recuperar as ruas a partir da proximidade com cada morador, com a realidade, agonia e sofrimento de cada um, ser parceiro da desdita, compreendê-la, e assumirem juntos a consciência da luta.

A indignação precisa, sim, ocupar as ruas. Mas levando a alma e não somente cartazes e palavras de ordem. Porque a indignação por si mesma trilha pelas raias da emoção e hoje, mais do que nunca, precisamos estar norteados pela razão. E razão não se expressa apenas em cartazes e palavras de ordem.

Por outro lado, não há resposta para um fato concreto (que o povo sente, ainda que não o identifique ou compreenda): efetiva proposta – e saída – para a transferência da riqueza nacional, no âmbito interno, para a classe política, a classe dominante e algumas castas como membros do Judiciário, do Ministério Públicos e altos coturnos das Forças Armadas, sistema financeiro privado e grandes proprietários.

E mais que isso: a partir do concerto composto de 2013 para cá não sabemos se temos evidentemente o substituto para o “novo” que combate a “velha política” representado pelo inquilino do Alvorada, como posto pela mídia no imaginário da sociedade.

Afinal, ainda não percebemos reais mudanças no comportamento dos que o tornaram representante. Tampouco se deixaram de pensar como ele

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