Resolver algo complexo através de soluções simples e efetivas. Eis como traduzida a dificuldade que parece insolúvel. Tem origem a expressão no Oráculo da Frígia que estatuiu que o substituto para o falecido rei Midas (filho de Górdio, morto sem deixar herdeiros), seria aquele que desatasse o nó que o pai deixara quando amarrou o velho carro de boi, que o fizera chegar ao reino, a um pilar do templo de Zeus. Quem o fizesse dominaria a Ásia Menor. Lenda ou não, fato é que encontra até mesmo registro histórico, relacionado a Alexandre, o Grande, da Pérsia, e teria ocorrido por volta do séc. VIII a.C., que desatou o nó de Górdio de forma singular, já que ninguém o conseguia na forma tradicional: em vez de tentar desatá-lo simplesmente o cortou com sua espada.
Nesta terra brasilis, de singularidades várias, o instante - em distintas vertentes - deixa exposto típico nó górdio para desate por acusação e acusados envolvendo o ex-presidente Lula.
Em meio ao escândalo denominado Vaza Jato os procuradores de Curitiba envolvidos na operação que guindou Moro a mito nacional foram postos contra a parede com a decisão do STF de anular um dos processos (o de Brendine) por se achar sustentado em violações ao devido processo. Como o fato é corriqueiro na Lava Jato temem os procuradores que minados estejam todos os processos que repetem a prática inconveniente de inviabilizar a defesa do réu e beneficiar a acusação. Eis o primeiro nó górdio: não há como o procuradores superarem tal absurdo, caso o STF resolva mesmo (o que não fez a contento até agora) fazer respeitar os ditames constitucionais.
Diante da decisão do STF a defesa de Lula busca a nulidade dos processos que envolvem o ex-presidente. Eis o segundo nó górdio: Lula tem afirmado que somente aceita ver declarada sua inocência e não nenhum outro arremedo que o tire da cadeia (progressão da pena etc.).
Muito provável que o STF - posto em xeque por tudo que legitimou até agora na Lava Jato - escolha o caminho que abriu para Brendine e o repita em relação aos que tiveram seu direito de defesa violado e faça retornar os processos a julgamento em primeiro grau.
Neste caso a inocência de Lula terá que aguardar o tempo de novo julgamento. Que pode demorar.
Para Lula o melhor seria que o nó fosse desatado, em definitivo, pelo próprio STF. De imediato.
A confissão
“[...]
Participamos disso. Somos cúmplices” – confessa Gilmar Mendes em indignada
manifestação em sessão do STF na terça.
Aquele “com Supremo e tudo” está
materializado na confissão de um ministro da própria Corte. Ou seja Sérgio Machado e Romero Jucá apenas anteciparam o óbvio ora reconhecido por Mendes.
Mas, assim vemos, bem melhor diria
Gilmar Mendes: “Nós somos cúmplices de tudo e culpados pelo desastre que aí
está”.
Afinal é o STF que alimentou e alimenta os absurdos se negando a prestar jurisdição
e justiça. Desde o impeachment.
Na ferida
De carta
aberta do ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão (GGN), destacamos esta conclusão
posta ao final, que bem define tudo que está às claras sem a adjetivação
precisa em torno do divulgado pelo Intercept:
[...]
De qualquer sorte, tenho as mensagens
como autênticas, porque o estilo de vocês – ou a falta dele – é inconfundível.
Mesmo um ficcionista genial não conseguiria inventar tamanha empáfia. Tem que
ser membro do MPF concurseiro para chegar a tanto! Umas menininhas e uns
menininhos “remplis de soi-mêmes”, filhinhas e filhinhos de papai que
nunca souberam o que é sofrer restrições de ordem material e discriminação no
dia a dia. Sempre tiveram sua bola levantada, a levar o ego junto. Pessimamente
educados por seus pais que não lhes puxaram as orelhas, vocês são uns
monstrengos incapazes de qualquer compaixão. A única forma de solidariedade que
conhecem é a de uma horda de malfeitores entre si, um encobrindo um ao outro,
condescendentes com os ilícitos que cada um pratica em suas maquinações que
ousam chamar de “causa”. Matilhas de hienas também conhecem a solidariedade no
reparto da carniça, mas, como vocês, não têm empatia.
[...] Digo isso com o asco que sinto
de vocês hoje. Sinto-me mal. Tenho vontade de vomitar. Ao ler as mensagens
trocadas entre si em momentos dramáticos da vida pessoal do Ex-Presidente Lula,
tenho a prova do que sempre suspeitei: de que tem um quê de psicopatas nessa
turma de jovens procuradores, uma deformação de caráter decorrente, talvez, do
inebriamento pelo sucesso. Quando passaram no concurso, acharam que levaram o
bilhete da sorte, que lhes garantia poder, prestígio e dinheiro, sem qualquer
contrapartida em responsabilidade.
[...] Despeço-me aqui com uma dor pungente no
coração. Sangro na alma sempre que constato a monstruosidade em que se
transformou o Ministério Público Federal. E vocês são a toxina que acometeu o
órgão. São tudo que não queríamos ser quando lutamos, na Constituinte, pelo
fortalecimento institucional. Esse desvio de vocês é nosso fracasso. Temos que
dormir com isso.”
Mesquinhez
Não se bastavam os "reis de Curitiba" em violar procedimentos e ferir de morte direitos constitucionalmente assegurados aos que padeciam sob "Inquisição". Também tripudiavam sobre a dor alheia, como o fizeram com singular sarcasmo em relação a Lula. Os mortos de Lula (a mulher Marisa, o irmão Vavá e o neto Artur) foram motivo de chacota e zombaria.
Particularmente, não vemos somente a crueldade, o desapego aos mais comezinhos princípios de civilidade, o repulsivo e repugnante em debochar da morte. O fato lhes assegura espaço nas masmorras da desumanidade e da falta de consciência do que seja civilização. Afinal, nem bárbaros o são quando o escárnio os norteia
Mas - para nós de significação - que sejam aplaudidos por uma parcela desta pobre e lamentável sociedade para a qual presos tem de apanhar e bandido bom é bandido morto.
Fica-nos, no entanto, a lembrança de um fato oriundo da mesma Lava Jato, envolvendo Lula, intimado para audiência quando ainda nem passados oito dias do falecimento de Mariza Letícia. Registramos nosso enxergar em crônica (O Poder e a Mesquinhez), que integra nosso Portal da Piedade (Via Litterarum/2018), da qual extraímos a conclusão que bem se aplica aos fatos denunciados:
"[...] Entre o poder do delegado provinciano e o de um juiz que tem lado tudo fica explicado. Deitados sob a mesma frondosa árvore da mesquinhez humana debocham do semelhante. Esquecidos – se em algum tempo o tiveram – dos sentimentos que marcam o homem como expressão da Humanidade.
E nada mais triste que ser mesquinho exercitando o poder."
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