domingo, 24 de novembro de 2019

Terra brasilis: a democracia em busca de definição


Política é para políticos
Nenhum exagero na afirmação. Assim como advocacia para advogados, medicina para médicos, engenharia para engenheiros etc. Simplesmente compreender que somente se torna possível o exercício de uma atividade sustentado no aprendizado e na prática. Tudo aliado a uma coisinha chamada vocação. Assim, a política cabe aos políticos.

Desta forma abordamos a tragédia por que vivemos em razão do irregular e incompetente exercício, se não inconveniente, da política pela magistratura e pela religião.

De imediato pela compreensão de que – ainda que não seja descartada a manifestação política de quem julgou ou de quem fale de um púlpito – não há como confundir a função institucional de uma com outra. São distintas na conformação do Estado moderno.

E não carece repetir Montesquieu para ver que a existência de três poderes independentes e harmônicos não pode ser confundida com a supremacia de uma deles sobre os outros ou qualquer dos outros. Tempos em que o Iluminismo entrava de sola contra a presença da representação divina entre os terráqueos se fazer tão presente e influente.

A Democracia e os políticos
Está fixado no imaginário: a Democracia como governo do povo, pelo povo e para o povo. Tudo nasce na Grécia de antanho, nos idos do séc. V a.C. – de Sólon a Péricles – quando levadas as decisões de interesse da polis à ágora (praça) para que nascesse da própria sociedade aquilo que a interessasse.

No século XVIII o Iluminismo aperfeiçoava concepções clássicas para uma sociedade que não se limitava tão somente a escassos milhares de habitantes e não mais se bastavam as cidades-estados e o Estado moderno surgia levando de roldão a monarquia absolutista.

Montesquieu defendeu a existência de Três Poderes para estruturar este Estado nascente, dois deles ‘representados’ – majoritária ou proporcionalmente – e um terceiro para manter o equilíbrio sob a égide da interpretação das leis.

Rousseau, em meio a isso, defendeu o que denominou de ‘representação comissariada’. Simplesmente uma forma de democracia direta que retomava as reuniões na ágora. Muito certamente Rousseau antevisou o modelo clássico da representação à sua contemporaneidade (monárquica), considerando-a uma fraude caso não pudesse ser confirmada pelo representado. Ou seja: não confio no representante que elegi até que possa confirmar o que ele decidiu porque pode ele agir diferentemente do que se ofertou em proposta a mim representado.  Não se pode abstrair outro entendimento para quem assim afirmou: “Os deputados do povo não são, pois, nem podem ser, seus representantes, são simplesmente seus comissários que não estão aptos a concluir definitivamente. Toda lei que o povo pessoalmente não ratificou é nula e não é uma lei.” (O Espírito das Leis).

Certo que o entendimento geral contrariaria Rousseau, entendendo que o sistema representativo se consolidaria progressivamente como modelo político. 

Sob tal vertente estudemos o Brasil.

Os políticos da Democracia contemporânea
A ideia originária, perpassada pela experiência representativa, desaguou nesta contemporaneidade utilizando-se da Democracia como o único instrumento possível de convivência harmônica de uma sociedade submetida ao controle de um Estado representativo.

O que pouco se observa – ou se nega explicar – é o fato de que tudo tem custos: o Estado tem custos em todas as esferas de poder, a sociedade tem interesses (concentrados ou diluídos, particulares ou gerais) e a Democracia não escapou de custar alguma coisa. Sob essa vertente, nesta sociedade capitalista, o dinheiro detendo o poder passou a controlar a Democracia.

Da Grécia a esta contemporaneidade a Democracia já pertenceu ao povo e o poder que inspira hoje está sob controle do dinheiro. Ou melhor, de quem o tenha. Não à toa aquele empresário jactando de haver elegido 16 governadores e duas centenas de deputados federais e duas dezenas de senadores.

E nem Montesquieu sobrevive. Afinal, aquele Poder imaginado por ele para assegurar o equilíbrio das instituições no sonhado Estado de Direito também sucumbe. Os escândalos que surgem não são mera coincidência; são resultado da convivência.

Inclusive político-partidária.

Conclusão
Tudo nos retalhos acima pode até alimentar escrito com ranço de artigo ou ensaio científico. Para isto apenas os fatos, naturalmente.

No fundo, temos a considerar que esta terra brasilis em  contemporaneidade da representação política é singular. Não só o dinheiro elege representantes. Outras vertentes de fazer dinheiro também.

Porque tudo o que aí está institucionalmente expresso em permanente disputa por dinheiro/poder exige urgentemente Midas em seus delírios de tudo ouro tornar.

E para coroar vem aí uma nova agremiação partidária, a mais perfeita expressão do que ora somos. Ou melhor, do que muitos desejam: o aprofundamento das desigualdades e da exclusão. Para tanto, na primeira oportunidade, não duvide: vote no três oitão.

Não à toa – queremos crer – em meio a tanta confusão nesta terra brasilis a democracia busca definição. Quem sabe – como essência dogmática – a de um regime que não tenha povo. Ou que o tenha tão somente para sustentar os que a controlam.

Inclusive milícias, o novo formato de democracia à brasileira. Tudo muito próximo: da arrecadação à proteção. 

E naturalmente, a eleição.

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