domingo, 6 de agosto de 2023

Secessão e xenofobia

 

A desigualdade planetária mais se acentua nesta terra brasilis. E não a tenhamos como fato recente. O que mais agrava o fenômeno reside no surgimento de parcela da sociedade que detém decisão política para reduzi-la e se volte para propor o seu agravamento

No plano da divisão social – inquestionavelmente fundada na disputa entre os que detêm o controle dos meios de produção e os que deles carecem – as desigualdades mais se acentuam a partir da ausência de consciência em torno de valores universais, dentre eles a igualdade.

O desenvolvimento demográfico se pautou – desde que o homem descobriu os meios de fixar-se – a partir do processo de acumulação do excedente da riqueza produzida em razão da superação do nomadismo. Naturalmente, a possibilidade de tornar-se detentor de reconhecimento e poder por mais dispor que outros alimenta o primitivo estágio de segregação social.

Daí apenas um instante para concentrar mais e mais espaços que assegurassem a ampliação dos domínios que, obviamente, não tinha como atender a todos; e uns – maioria – passaram a sobreviver servindo aos que ocuparam e detinham os primitivos meios de produção: agricultura, criação de pequenos animais etc.

Ou seja, neste contexto a igualdade cobrava a distribuição da riqueza produzida, mais próxima de evitar a exploração de uma classe social sobre a outra. O que não foi percebido ou tentado.

De um instante para outro tudo desaguou na necessidade de um instrumento (alheio) de controle, estabelecendo regras de convívio e proteção ao produzido. Natural que este avanço não ficou submetido à igualdade (afastadas algumas experiências como a ágora na Atenas antiga, ainda assim afastando dela a participação dos escravos).

Surge então a figura de uma unidade política – constituída no Estado moderno – que evoluiu historicamente para conformar o processo de controle do Estado através de instituições centralizadas definidas para fins específicos: administrar, legislar e dirimir conflitos.

Como visto, a desigualdade encontra raízes na primitiva Civilização e mais ou menos acentuada conforme a conformação e a gestão do Estado.

Pari passu algumas experiências sociais – para enfrentar os limites de que dispunha – desenvolveram a proteção aos seus como meio de defesa de sua produção, de sua gente, fechando-se para estranhos. Como apêndice às desigualdades em tal estágio, o que se denomina de xenofobia (do grego xenos + phóbos), medo ao estrangeiro, uma das características da antiga Esparta.

A defesa de interesses nacionais (interna e externamente) desenvolveu um processo de invasão e conquista (para o primeiro caso) e separação de porção da unidade política organizada (segundo caso).

Não tenhamos dúvida diante da experiência pátria, como levado à abertura do presente texto: a desigualdade planetária mais se acentua nesta terra brasilis. Tal é gritante, avilta a consciência humanística e lança à interrogação a razão por que de tal ocorrer.

Nossa história o diz, desde sua origem: terra destinada à conquista e à exploração. Naturalmente por uma classe dominante que se instalou para tal desiderato.

E na esteira do processo um sistema xenofóbico inverso: o temor e ódio do estrangeiro ao nativo.

No entanto, ainda que de forma capenga, caminhávamos para superar tal estigma e desconhecíamos quem a defendesse abertamente. Até porque vedado em sede constitucional.

A uma por pretender reduzir as desigualdades de todas as formas como “objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil” (CF, art. 3º); a dois, porque a República constitui a “união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal” (CF, art. 1º).

Diante de avanços tais presumíamos a plena superação de pretensões pautadas em secessão e xenofobia, imaginando como lançadas às calendas experiências pretéritas aqui levadas a termo.

Enganamo-nos redondamente, caro e paciente leitor. E para traduzir em nível nacional o “pense num absurdo como precedente” de Otávio Mangabeira eis que alguém, do alto do Palácio da Liberdade (que ironia!), proclama aos quatro ventos a união em torno da divisão do Estado Nacional em dois: o deles (adredemente escolhido e delimitado) e o do resto!


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