domingo, 27 de agosto de 2023

Comunicado

 

Não sabemos se os tempos são outros ou se simplesmente os fatos interferem no tempo. Como vivemos os instantâneos, e a partir deles o fixado em nosso imaginário, tudo dá a entender que definem os tempos.

Mas, caso não existíssemos como produtores dos fatos os tempos deixariam de existir? Certamente não.

Todo o bolodório diz respeito a entendermos no curso da existência a gama de fatos que dão origem aos “comunicados” e à singularidade que envolve alguns deles.

Um vereador de Itororó nos idos em que a Câmara iniciava sua segunda legislatura (exatamente em 7 de abril de 1963) pediu a palavra para ‘comunicar que havia pedido a palavra para comunicar que não pediria a palavra nas sessões vindouras’.

Exatamente, caro e paciente leitor: pedir a palavra para comunicar que não a pediria futuramente. Supimpa!

Mas, sabemos, não são os comunicados em si destinados a tal desiderato. A não ser como exceção. Sua utilidade – desde que a comunicação se tornou necessária – se impôs desde os primórdios. Mesmo quando não havia imprensa. Fidípides, o famoso que levou a notícia da vitória dos gregos contra persas, em Maratona, na Primeira Guerra Médica (490 a.C.), efetivada ‘na perna’.

Com o advento da imprensa escrita – e posteriormente outras formas de comunicação – utilizada à mancheia, por todo e qualquer que dispusesse de recursos para viabilizar seu ‘comunicado’.

Alguns de singular importância (para demonstrar aos de hoje terríveis tempos de ontem), como o registrado no jornal A Razão, de Santo Amaro da Purificação, no século XIX, através do qual procurado um ‘preto fujão do engenho Muribeca, da nação Caçanje, de nome Gregório’, com recompensa de 50 mil reis, além da inusitada recomendação de que quem o achasse lhe “desse uma surra primeiro” antes de leva-lo à redação do jornal, que trazia no nome alusão ao  Iluminismo, ainda que vivendo em tempos medievos.

Não podemos negar a importância e a oportunidade de comunicados, cada um atendendo ao instante: o padre no púlpito, muitas vezes chamando os fiéis à obrigação para com o dízimo; o comércio, anunciando vantagens e oportunidades para os agraciados que o atendam; o poder público alertando em torno de riscos, pandemias, concursos e coisas tais; o circo, anunciando seu último espetáculo a preços módicos etc. etc.    

No entanto não imaginávamos encontrar nesta contemporaneidade um comunicado de jaez tão singular, como aquele emitido por um estabelecimento de ensino localizado na Zona Sul de São Paulo, o Colégio Santa Maria, no Jardim Marajoara, destinado aos pais de adolescentes entre 11 e 14 anos de uma 6ª Série, orientando para “não soltarem pum dentro de sala de aula” (jornal O Tempo).

E mais: “A instituição de ensino ressaltou que ‘esta única turma, e não todas, foi orientada sobre a importância de liberar os gases do ponto de vista da saúde”, mas sem descurar que “também é possível considerar a coletividade e a maneira mais adequada de agir nesta situação”.

Considerando a ‘preocupação’ demonstrada buscamos identificar a instituição, em razão da paciência exemplar diante daquilo que em outras (milhares delas) levaria ao disciplinamento com, pelo menos, suspensão da turma (já que identificada).

Encontramo-la. Então entendemos: afinal, neste 2023 a mensalidade por lá gira em R$ 5.431,00, o que nos remete a uma conclusão óbvia: melhor administrar o pum que perder quem o origina.

E aqui estamos, compreendendo que se os tempos são outros ou se os fatos interferem no tempo e vivendo-os no plano instantâneos cabe-nos, a partir deles, fixa-los em nosso imaginário, entendendo-os como definidores dos novos tempos.

Tanto que, para o restante do país sugerimos entrar em contato com a instituição para aprender como controlar pum em sala de aula; ou mesmo fazer turismo para conhecer tamanha realidade, naquela que, provavelmente, será a primeira escola conhecida em nível mundial a dar tratamento especial ao pum coletivo e a estabelecer preocupação científico-didático-pedagógica para seu controle.

Quem sabe, primeiro Nobel para o Brasil!

Ou, quando nada, ‘patriotas’ poderiam inscreve-lo para o próximo Ig Nobel.


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