Valemo-nos
de “O jornalismo e as guerras”, de João Lírio, redator-chefe da Carta
Capital, que circulou em nosso e-mail, um texto preciso para instruir esta
postagem:
"Se
há uma verdade em um conflito, é esta: em algum momento, em alguma parte do
planeta, um jornalismo inspirado, um analista arguto ou um político
espirituoso vai repetir a frase “na guerra, a primeira vítima é a verdade”. É
tão líquido e certo quanto o apoio dos Estados Unidos a qualquer decisão de
Israel, justa ou injusta. Não se sabe quem é o autor da frase. Há quem atribua ao grego Ésquilo, pai da tragédia. Outros apontam o político inglês Philip Snowden, famoso no século XVIII, ou o seu compatriota Samuel Johnson, ensaísta prestigiado que viveu cerca de cem anos depois. Seja quem for, o dito remete a um certo romantismo, quando aparentemente havia o genuíno interesse de perseguir a verdade, essa utopia. No século XXI, quando uma guerra eclode, nem tempo há de matar a verdade. Ela é natimorta, enterrada em uma cova rasa, sem túmulo, epitáfio e flores. Há tempos, o poder entendeu: a propaganda é uma arma mais letal do que os mísseis. A batalha entre Israel e o Hamas não foge à regra. O oligopólio midiático faz parte da engrenagem da guerra, imbuído da missão de vencer o Mal, à custa de sua independência. Não é permitido duvidar, contextualizar, relembrar, como fez o açoitado António Guterres, secretário-geral da ONU, ao dizer que o ódio não nasceu do vácuo, mas de uma história de ao menos 56 anos de ocupação. Pensar de maneira autônoma tornou-se crime. É a prova de “apoio ao terrorismo” ou “perseguição aos judeus”. Uma heresia a ser punida com o ostracismo, o silêncio. O terror do Hamas só pode ser combatido, então, com um terror ainda maior de Israel. Existe um sistema de câmbio para medir quando o “legítimo direito de autodefesa” estará saciado? Quantas crianças palestinas precisam morrer para compensar a perda de um bebê israelense? A mesma lógica guia a “guerra urbana” no Brasil. A chacina no Guarujá, as operações policiais nos morros e favelas do Rio de Janeiro, a brutalidade na Bahia... Tudo vai além do olho por olho. Quantos civis, culpados ou inocentes, devem perder a vida para aplacar a morte de um policial? Quantas balas perdidas justificam o suposto combate ao crime?" |
Pouco a acrescentar. O jornalismo constrói seus fronts. As
guerras, os seus.
Qual deles o pior: a morte humana nos ‘campos de batalha’ ou
a da Verdade através do jornalismo que as alimenta?
O jornalismo escolhe seus culpados. Padroniza-os no
imaginário de quem os lê, ouve ou vê.
A ênfase oferecida o define: massacre ‘terrorista’ cabe ao Hamas; massacre a civis em hospitais, escolas, comboios de ambulâncias e campos de refugiados apenas não passam de ataques justificados contra terroristas.
Afinal, Josué à frente para conquistar Canaã. Para tanto:
"Vai, pois, agora e fere a Amaleque; e
destrói totalmente a tudo o que tiver, e não lhe perdoes; porém matarás desde o
homem até à mulher, desde os meninos até aos de peito, desde os bois até às
ovelhas, e desde os camelos até aos jumentos".
Nenhum comentário:
Postar um comentário