O construído
neste país desde 2013, para corresponder ao jogo de interesses externos
administrados internamente, capitaneado por órgãos da imprensa apoiando e
incentivando aberrações judiciárias, sinaliza singular implosão. Antes do tempo
(em que pese tanto) a caixa de pandora aberta começa a se voltar contra quem aqui
a abriu.
Mas, como sempre
posto no noticiário, os fatos não são aprofundados e tudo fica na superfície
manuseando este ou aquele ator que encarna a personagem e não a própria
personagem.
Fiquemos
apenas nas seguintes ilustrações, começando por Gilmar Mendes, do STF, aqui:
"Há
muito critico a manipulação da Justiça, por meio da mídia e de outras
instituições, para projetos pessoais de poder. A criação de heróis e de falsos
mitos desenvolveu um ambiente de messianismo e intolerância. Autoritarismo
judicial e político são ameaças irmãs à Constituição".
"O
combate à corrupção exige a ação de milhares de agentes públicos e o respeito à
lei e não a atuação isolada de uma pessoa. Aprendamos: não há solução
democrática fora da virtude política. Que a história recente nos reserve um
reencontro com o Estado de Direito".
Sua
Excelência ora posa de santo, esquecendo-se do demônio que muito contribuiu
para o caos em que estamos. Escreve como paladino em defesa de um Estado de
Direito, mas certamente não há de imaginar que tenhamos esquecido que Moro
vazou um grampo ilegal (dentre tantos) plantado no Palácio do Planalto para o
Jornal Nacional da Globo e o próprio ministro Gilmar Mendes naquele imediato (março
de 2016) interveio indevidamente e inviabilizou a posse de Lula na Casa Civil, suspendendo
sua nomeação e obstando a prática de um ato administrativo legítimo inerente à
Presidente da República (“virtude política”). (Detalhe: a petição deferida por
Gilmar foi subscrita por funcionária de seu Instituto, muito provável que redigida
por ele mesmo).
Surreal país em que um
ministro do STF que abusou de sua função em favorecimento político se diz
preocupado com o fato de que “A criação de
heróis e de falsos mitos desenvolveu um ambiente de messianismo e intolerância”
e que “Autoritarismo judicial e político são ameaças irmãs à Constituição",
quando é ele (ao lado de muitos de seus pares) quem deu legitimidade a ‘heróis’
e ‘mitos’ que materializam o ‘autoritarismo judicial e político’.
O Ministro
da Justiça(?) do inquilino do Alvorada deixa o cargo e delata o ‘benfeitor’.
Sendo verdade tudo o que até agora publicado Moro prevaricou (aqui). Justamente porque
não cumpriu com o dever funcional ao omitir-se diante dos fatos criminosos que
devia mandar apurar. Chafurdando em meio aos graves fatos que tinha conhecimento
e acobertava visando uma cadeira no STF, objeto da barganha celebrada entre um
e outro, cometeu ato improbo. Poderia alegar em sua defesa que não é
funcionário público no sentido estrito, mas não que não seja agente público por
delegação. Para ele basta aplicar o Código Penal:
Corrupção passiva – Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão
dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2
(dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou
promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou
o pratica infringindo dever funcional.
§ 2º - Se o funcionário
pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever
funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de
três meses a um ano, ou multa.
Prevaricação – Art. 319 -
Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo
contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento
pessoal:
Pena - detenção, de três meses a um ano,
e multa.
O
inquilino do Alvorada comete crimes de responsabilidade, de prevaricação, de
falsidade ideológica como se estivesse comendo um sanduiche em Davos e a
carreira familiar está vinculada ao avesso do que dizia defender. A obscura
caminhada vai ficando às claras e busca evitar que crimes cometidos, pelos seus
e à sua volta, sejam apurados.
A Globo que construiu
Moro como paradigma de combate à corrupção, beneficiada por ele com os
vazamentos privilegiados (ainda que criminosos) já encena a peça de 2022 com a
singular figura como ator principal. Para ela ninguém melhor do que um
presidente em quem possa confiar/mandar. Não mais aquela ‘esperança’ em quem ela
Platinada se utilizou (o inquilino) para afastar o inimigo/PT.
Em meio a
tudo uma coisa fica flagrante: tudo o que Moro atribui ao inquilino e constitui
crime também foi por ele acobertado, na esperança de uma vaga no STF. Ambos são
criminosos.
Mas onde há
demônio há santos. A Globo já escolheu um e outro.
A
santificação do ex-juiz começará de imediato. Como referência contra a
corrupção, o mote de campanha.
Ficamos a
indagar como será explicada a sua confissão de que pediu ao inquilino uma
pensão para a família para cobrir o prejuízo financeiro de abandonar a
magistratura tendo a obrigação de saber que tal pretensão não encontrava amparo
legal a não ser oriunda a pensão de um caixa 2 de campanha administrado a partir
das milícias que dominam Rio das Pedras e Muzema (aqui, sintetizado no GGN).
Enquanto a
mídia aprimora a confusão e vai construindo seus fakenews lança o ex-juiz
candidato, mas preparando o efetivo destinatário da missão redentora: o
governador João Dória, o tertius
perfeito, com seu ar de bom mocinho.
E a imprensa
em geral, em vez de discutir os fatos presentes em profundidade, à luz dos
remotos que precipitam o caos, acusa quem sempre defendeu e um de seus heróis
posa de santo quando também envolvido, o que deixa o país como cego em
tiroteio: não sabe para onde vai ou onde fica, tampouco quem é o mocinho ou o
bandido.
Em meio a
tudo tornaram este país – a considerar a postura de suas instituições (STF,
Poder Executivo, o Poder Legislativo, imprensa) – um acobertador de ilicitudes
quando estas beneficiam o sistema e correspondem ao jogo de interesses da
classe dominante.
Não bastassem
demônios e santos, ainda a pandemia por eles mal administrada.
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No dia 12
deste mês (“À espera”), quando os números sinalizavam 1.223 mortes para 22.169
casos confirmados, registrávamos a preocupação com a possibilidade de ao final
do mês superarmos os 60 mil casos e as 5 mil mortes.
Neste
domingo (quatorze dias depois e a quatro do final do mês) os últimos números
divulgados acusam 61.888 casos e 4.205 mortes.
E, em meio a mocinho que vira bandido e bandido que vira mocinho, vai se "deglamidiando" a turba de torcedores que se autodenominam patriotas. Ótimo texto, meu amigo.
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