De uma coisa
não podemos deixar de reconhecer no atual governo: muito breve – pelo andar da
carruagem – o Brasil será o epicentro do Covid-19 no planeta, já tendo
alcançado o segundo lugar em número de infectados e mortes. E uma outra
vitória: os militares da reserva apresentam-se para a sociedade como voz das
Forças Armadas; não sabemos se quem efetivamente detém a voz de comando para atirar o fará.
Mas,
caríssimo e paciente leitor, a tempestade que assola o país não é a pandemia
(que passará) mas a classe dominante de um país moribundo, que ri de tragédias,
ela que é a própria tragédia.
Aproveitar o
instante em que a pandemia se acentua para aprofundar o butim é a tônica de seu
pensamento. Está dito na fala de auspiciosos de seus representantes na reunião
ministerial.
Sim, uma
reunião ministerial que veio a público.
De nossa
parte, não vemos nada além do que já
sabíamos se buscamos culpar o inquilino do Alvorada. Anotaram de sua boca 35
palavrões expressados (transitando entre amenidades como “porra” e “caralho”)
onde se pensava estivesse sendo cumprido o rito natural a uma reunião de
governo, que deve obedecer ao ‘solene’ e à ‘liturgia’ como elementos a
legitimá-la.
Mas, que
escândalo há se ali está traduzida a mais perfeita manifestação de uma classe
dominante ora tão bem representada, como nunca o fora? Para que mulher no
ministério, idosos etc. se o boquirroto se acercou deles porque sabia-os ‘confrades’?
Não caro
leitor, não há do que nos escandalizarmos. Afinal, no dia a dia a delicada e cívica
postura do chefe da nação se expressa com xingamentos e gestos chulos como ‘dar
banana’.
Temos, sim,
e não podemos deixar de reconhecer, tão somente – na pessoa do inquilino do
Alvorada – a exteriorização de um câncer que permeia a conformação da sociedade
brasileira em delírio de poder. Um câncer que corrói o país desde sua origem.
Nada a
reclamar. Apenas confirmar que o inquilino do Alvorada se fez cercar de iguais.
Não fora isso, indaguemos: qual de seus ministros pediu exoneração diante do
quadro dantesco moralmente, que fere os bons costumes e as instituições?
Não,
estão acostumados. E gostam. A isso se apegam e ao mito aplaudem. São iguais,
todos. Como iguais são todos que o colocaram lá.
Caso alguém
duvide, quem imagina que os que hoje o criticam ficarão contra ele se surgir
uma possibilidade eleitoral de forças progressistas/nacionalistas vencerem as eleições? Estarão com ele, sim. Porque a classe dominante que retomou
a galeota não se preocupa com o povo, apenas consigo mesmo.
E nosso
conhecido STF está aí, acovardado, seguindo ritos (que atropelou em passado
recente), malhando lâmina d’água, com decisões inócuas quando cabe enfrentar o
inquilino do Alvorada. Já parte para o singular formato decisório cuja
conclusão podemos denominar como inovadora natureza recomendativa, não mais constitutiva, declarativa etc.
Pelo andar
da carruagem tudo será imensa pizza. Aí estão para assá-la os de sempre nesta
contemporaneidade: o próprio STF, a PGR, Congresso. Em fogo aquecido pelos
interesses da mídia com a lenha destes tempos: direitos. Servida com pão
amassado na padaria do capital especulativo, a que todos defendem dentro de seus
respectivos limites e compromissos.
E, sucumbindo,
a denominada esquerda entra no jogo por um caminho que entende único (talvez
até o seja para o instante e limites de sua atuação): o “fora”. E o
pingue-pongue se instala: contra ou a favor. Para uns e outros o jogo eleitoral
como única saída. Não se vislumbra o projeto, até porque o “fora” não o é em
si. E como projeto não convence. Pode alimentar conquistas, mas não convence.
E cá nos
vemos diante de absurdos como o defendido pelo inquilino do Alvorada em plena
reunião ministerial, como a de que o “povo armado” é solução.
Certamente tal
expressar soa como um ângelos aos ouvidos dessa gente. Afinal, caminha-se para
a construção não de um estado policial, mas de um estado miliciano porque estamos
no limiar de materialização de um imaginário ‘faroeste’.
Como nos
velhos faroestes os assaltos, que não mais o são a criadores de ovelhas ou
agricultores, a bancos. Mas ao Banco do Brasil, ao patrimônio, florestas e
riquezas pátrias, ao povo. Aproveite-se a cortina de fumaça da pandemia e
ataquemos – dizem-no sem pedir segredo.
Eis um
triste Brasil, o mesmo de Gregório,
ó quão
dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti...
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti...
A ti tricou-te a
máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
...
Tanto negócio e tanto negociante.
Que em tua larga barra tem entrado,
...
Tanto negócio e tanto negociante.
Certo que
não estamos no século XVII, mas lá vivendo em pleno séc. XXI.
Porque
os criticados por Gregório de Matos Guerra (1636-1696) “que em tua larga barra tem entrado” permanecem os mesmos, hoje como ontem.
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