sexta-feira, 27 de março de 2015

Imprescindível discussão

Nas lições do magistrado
As relações do aparelho judiciário com a sociedade  sob a batuta de muitos de seus membros  tem levantado opiniões. Há demonstrações  entendem muitos  de que algo não está correto.

Razão por que todo o que trabalha com o universo do Direito deveria incorporar a visão do juiz Rubens Casara. 

Toca na ferida do ‘processo penal espetáculo’ – fenômeno que se agrava contemporaneamente – como uma nada velada forma de 'corrupção judicial'.

Ao afastar direitos e garantias fundamentais em nome do bom andamento do espetáculo, o Estado-juiz perde a superioridade ética que deveria distingui-lo do criminoso.”

E mais:

Não se pode combater ilegalidades recorrendo a ilegalidades ou relativizando o princípio da legalidade estrita; não se pode combater a corrupção a partir da corrupção do sistema de direitos e garantias fundamentais. Punir, ao menos na democracia, exige o respeito a limites éticos e jurídicos. No processo penal do espetáculo, não é assim. O espetáculo aposta na exceção: as formas processuais deixam de ser garantias dos indivíduos contra a opressão do Estado, uma vez que não devem existir limites à ação dos mocinhos contra os bandidos. Para punir os “bandidos” que violaram a lei, os “mocinhos” também violam a lei. Nesse quadro, delações premiadas, que, no fundo, não passam de acordos entre “mocinhos” e “bandidos”, violações da cadeia de custódia das provas e prisões desnecessárias – estas, por vezes, utilizadas para obter confissões ou outras declarações ao gosto do juiz ou do Ministério Público – tornam-se aceitáveis na lógica do espetáculo, sempre em nome da luta do bem contra o mal. Mas, não é só. Em nome do “desejo de audiência”, as consequências sociais e econômicas das decisões são desconsideradas. Para agradar à audiência, informações sigilosas vazam à imprensa, imagens são destruídas e fatos são distorcidos. Tragédias acabam transformadas em catástrofes. No processo penal do espetáculo, as consequências danosas à sociedade produzidas pelo processo, não raro, são piores do que as do fato reprovável que se quer punir.”

E resume

"A espetacularização sempre leva a injustiças, mesmo nas hipóteses em que crimes são cometidos e seus autores acabam condenados. É da natureza da espetacularização a deformação da realidade, a ampliação dos estereótipos, a desconsideração das formas jurídicas como obstáculos à opressão estatal, o desrespeito aos direitos e garantias fundamentais e a ausência de uma perspectiva crítica sobre os eventos submetidos a julgamento." 

Sobre como deveria funcionar a Justiça:

"O Judiciário brasileiro, e não só o Supremo Tribunal Federal, encontra-se em um momento no qual busca superar a desconfiança da população. No Estado Democrático de Direito, o Poder Judiciário assume um protagonismo inédito e, não raro, frustra as expectativas que o cercam. Nessa busca por legitimidade, em meio ao fenômeno da “judicialização da política”, por vezes, os juízes acabam por ceder àquilo que o jurista francês Antonie Garapon chamou de “tentação populista”, que, a grosso modo, significa julgar para agradar a “opinião pública”, o que guarda semelhança com o fenômeno da espetacularização do processo. Acontece que, muitas vezes, o que se entende por “opinião pública” não passa de interesses privados encampados pelos meios de comunicação de massa. Assim, melhorar o funcionamento do Supremo Tribunal Federal, bem como de todas as demais Agências Judiciais, passa necessariamente por não ceder à tentação populista, desvelar as práticas incompatíveis com a ideia de República e romper com a tradição autoritária que ainda hoje condiciona a atuação dos atores jurídicos. Para tanto é necessário investir na formação dos magistrados, na criação de uma cultura democrática e republicana. Isso só é possível através da educação. A curto prazo, deve-se apostar em medidas de contenção do poder. Assim, na contramão do que consta da chamada “PEC da Bengala”, seria saudável e republicano a fixação de um mandato para o exercício de funções jurisdicionais dos tribunais superiores. Isso não só oxigenaria os tribunais como afastaria os riscos inerentes à perpetuação do poder nas mãos de poucos."

A íntegra da entrevista/lição concedida pelo magistrado a Paulo Moreira Leite se encontra disponível no http://www.conversaafiada.com.br/brasil/2015/03/24/pml-e-o-julgamento-espetaculo-moro-e-o-diretor-e-jano-faz-midia/

Uma lição para ser levada às discussões acadêmicas. Tão omissas diante do debate existente.

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