sábado, 22 de março de 2014

Consciente

Estupidez
Reproduzimos texto de Leonardo Boff, postado na Tribuna da Imprensa. Nele especificamente chamou-nos a atenção a referência a René Descartes, pai do método científico. 

Temos de nossa parte - em dimensão filosófica - levantado dúvidas sobre o método científico à luz das descobertas. Muito do que circula/existe se encontra submetido a uma compreensão que, em muitos casos, não suporta mais a si mesma.

A interpretação cartesiana trazida a lume por Leonardo Boff é tradução de uma consciente estupidez. De um método que já exige revisão e nova conceituação em muitos aspectos que dizem respeito diretamente à sobrevivência da Humanidade.

HUMANOS FORAM UM DOS ÚLTIMOS SERES A ENTRAREM NO TEATRO DA CRIAção



Leonardo Boff
A ética da sociedade dominante no mundo é utilitarista e antropocêntrica. Quer dizer: ilusoriamente, considera que os seres da natureza somente possuem razão de existir na medida em que servem ao ser humano e que este pode dispor deles a seu bel-prazer.
A tradição judaico-cristã reforçou essa ideia com o seu “subjugai a Terra e dominai sobre tudo o que vive e se move sobre ela”(Gn 1:28).
Mal sabemos que nós, humanos, fomos um dos últimos seres a entrarem no teatro da criação. Quando 99,98% de tudo já estava pronto, surgimos nós. O universo, a Terra e os ecossistemas não precisaram de nós para se organizar e ordenar sua majestática complexidade e beleza.
Cada ser possui valor intrínseco, independentemente do uso que fazemos dele. Tem algo a revelar que só ele o pode fazer, mesmo o menos adaptado, que em seguida, pela seleção natural, desaparecerá para sempre. Mas a nós cabe escutar e celebrar a mensagem que nos tem a revelar.
O mais grave, entretanto, é a ideia que toda a modernidade e grande parte da comunidade científica atual projeta do planeta Terra e da natureza. Estes são considerados simples “res extensa”, coisa que pode ser mensurada, manipulada. O método científico predominante mantém, em grande parte, essa lógica agressiva e perversa.
René Descartes, no seu “Discurso do Método”, diz algo de clamoroso reducionismo na compreensão: “não entendo por ‘natureza’ nenhuma deusa ou qualquer outro tipo de poder imaginário, antes me sirvo dessa palavra para significar a matéria”. Considera o planeta algo morto, sem propósito, como se o ser humano não fizesse parte dele.
O fato é que nós entramos no processo da evolução quando esta alcançou um patamar altíssimo de complexidade. Por nós, o universo chegou à consciência de si mesmo, e isso ocorreu numa minúscula parte do universo, que é a Terra. Por isso nós somos aquela porção da Terra que sente, ama, pensa, cuida e venera.
A nossa missão específica, nosso lugar no conjunto dos seres, é o de sermos aqueles que podem apreciar a grandeza do universo, escutar as mensagens que cada ser enuncia e celebrar a diversidade dos seres e da vida.
E pelo fato de sermos portadores de sensibilidade e de inteligência, temos uma missão ética: cuidar da criação e ser os guardiães dela para que continue com vitalidade e integridade e com condições de ainda evoluir.
Lamentavelmente, estamos cumprindo mal essa nossa missão, pois, no dizer do biólogo E. Wilson, “a humanidade é a primeira espécie da história da vida a se tornar uma força geofísica; o ser humano, esse ser bípede, tão cabeça de vento, já alterou a atmosfera e o clima do planeta, desviando-os em muito das normas usuais; já espalhou milhares de substâncias químicas tóxicas pelo mundo inteiro, e estamos perto de esgotar a água potável” (“A Criação – Como Salvar a Vida na Terra”, 2008).
Se não quisermos ser expulsos da Terra pela própria Terra, como os inimigos da vida, cumpre mudar nosso comportamento face à natureza, mas principalmente acolher a Terra como a ONU, em 2009, a aceitou, como mãe-Terra, e como tal cuidar dela e reconhecer e respeitar a história de cada ser vivo ou inerte.
Eles existiram antes de nós e por milhões e milhões de anos sem nós. Por essa razão, devem ser respeitados como o fazemos com as pessoas mais idosas, que tratamos com respeito e amor. Mais que nós, eles têm direito ao presente e ao futuro junto conosco.
Caso contrário, não há tecnologia nem promessas de progresso ilimitado que nos poderão salvar.
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Da redação do blog:
A insensatez - como expressão do reducionismo de que fala Boff - tem sido a tônica em nossa evolução contemporânea. Em todos os níveis. 

Em nosso Brasil, especialmente no universo político, vai adquirindo foros inimagináveis. Através dela são alimentadas, como uma Hidra de Lerna, as fontes que tornam o país a terra da desigualdade por excelência. 


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