Quando o tema se esgota em si mesmo, um rodapé pode definir tudo e ir um pouco além.
Adylson Machado
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Um dever como direito
Estivemos “fora do ar” no domingo passado, coincidente com a realização das eleições municipais. Texto adiantado, apenas por concluir, coisa que fazemos justamente no dia do “descanso”. Cremos que fomos vítima de uma síndrome bastante particular, a que nos remete a uma estesia que muitos chamariam de sem sentido e outros de loucura ou piração: votar.
O ato de votar nos deixa ansioso desde o raiar do dia. Não se trata de paranoia ou de medo de que nos seja reservada uma multa por causa da ausência, a nos vigiar da esquina de concursos e outros quejandos vinculados ao exercício da cidadania como dever e não como direito (como muitos gostariam que fosse).
Somos diferente no pensar em relação ao votar. Diferente de como o vê um parente próximo aqui em Itabuna que “descobriu” que mais gastaria com o transporte no ir e vir para o cumprimento do dever do que pagando a multa pelo descumprimento da obrigação e de logo reservou os 50 centavos do lucro para depositá-los na poupança.
Dia de votar é um dia especial, raro em seu espaço temporal de dois em dois anos. Talvez o trauma de haver ficado tantos anos sem votar para governador e presidente, o que somente nos ocorreu, pela primeira vez, aos 40 e 43 anos de vida, respectivamente.
Ficamos, assim, em êxtase em dia de eleição. Que anda menos agitado, depois que os senhores juízes eleitorais passaram a jogar duro com as manifestações de rua denominadas “boca de urna”, o que contribui justamente para aprimorar o sagrado direito da escolha livre. (E lá vamos nós viajando na utopia que nos alimenta porque muitos são dados a exercitar a “liberdade” de negociar o voto não por 50 centavos, mas reais ou um pouco mais, visto que não tem quem lhes falte atender ao reclamo de tal peculiaridade da “democracia” tupiniquim).
Dito isto, curvamo-nos em respeito ao leitor deste DE RODAPÉS E DE ACHADOS. Que nos desculpe e nos perdoe. Afinal, somos um mísero viciado em votar. Tanto que gostaríamos de mais uma oportunidade para exercer dito dever, como direito, para manter ou não nossos eleitos em seus mandatos caso não correspondessem a suas promessas de campanha.
Viva a eleição!
Eleições foram o tema da semana. E continuarão a sê-lo onde há segundo turno. Que leva “viciados” como nós a integrar uma torcida à distância em relação a Salvador e Vitória da Conquista, na Bahia; a São Paulo, Fortaleza, Manaus... Tanto que nos serão grato tema ainda por dias.
Acompanhando-as vamos percebendo que o criticado povo vai demonstrando uma sabedoria antes não imaginada, somente percebida por estudiosos quando observam os resultados eleitorais sob o prisma da estatística como contributivo para suas conclusões. Uma delas: não são os interesses de uma elite que se guarda por trás de biombos como grande imprensa ou os que sob ela sucumbem que dominam ou manipulam as mentes votantes, ainda que ocorram exceções.
Há algo mais presente em cada um eleitor: o que quer ou que entenda melhor para si, ainda que para muitos tal não esteja a traduzir a efetivada consciência. Consciência conceitual, diríamos, quando enveredam por discernir e explicar o que está no recôndito de cada cidadão, no mais profundo do subjetivismo.
Talvez por isso, e um pouco mais, vibramos orgulhoso com o existir de eleições. E gritamos como se fôssemos pregador em dia de festa de santo padroeiro para a nossa “santa” de cada dois anos: viva a eleição!
Festa encomendada
Ainda que não queiram muitos enxergar a realidade, a inoportunidade do julgamento do denominado mensalão petista (quando julgará o STF o do PSDB e o do DEM?) não poderia desaguar em outra coisa a não ser utilização político-partidária. Contra o PT, naturalmente?
A desfaçatez é tamanha que o mesmo Gurgel, acusador implacável na Ação penal 470, a ele se referiu como útil ao processo eleitoral em curso. Naturalmente, ainda que não o dissesse diretamente, contra o PT, possivelmente!
A oposição aplaudiu, palmas vibrantes ecoaram à fala do paladino e a democracia tucana fez a festa, liderada por José Serra em São Paulo.
Onde a desfaçatez
O ilustre Roberto Gurgel, que guarda em suas gavetas processos outros, inclusive um que envolve roubalheira grossa cometida por militar de alta patente em desvios de recursos de obras comandadas pelo Exército, para não falar da valiosa ajuda a Demóstenes Torres (e Carlinhos Cachoeira por caminhos demostianos), na iminência do voto de Joaquim Barbosa sobre o núcleo político (leia-se, José Dirceu preferencialmente) declarou, na quarta 3, quando indagado se a condenação dos políticos repercutiria nas eleições: “Não sei. Isso aí as urnas dirão se haverá alguma repercussão. A meu ver, era bom que houvesse.”
A turma do gargarejo vibrou! E não tarda preparar máscaras carnavalescas para o novo herói.
Cada eleição traz uma apelação
Em São Paulo o sequestro de Abílio Diniz “comandado por petistas”, em 1979, todos presos em flagrante vestindo as camisas do partido. Depois descobre-se que os ditos cujos eram chilenos e nada tinham a ver com o PT e que as camisas foram neles vestidas para as fotografias.
Aquele monte de dinheiro no Jornal Nacional, em 2006. Exposto a convite de um delegado tucano.
Agora Gurgel e seu “desejo”.
As linhas
No entanto, ainda que não se ponha Deus em meio às coisas dos homens, certo que, inspirado n’ Ele, o eleitor escreveu certo por linhas tortas e mostrou, com todas as letras, que a pantomima armada, onde os holofotes para o STF estão mais a pesar que os fundamentos jurídicos que deveriam nortear os julgamentos, não interessa ao povo como muitos senhores da casa-grande imaginavam.
O povo não deu a mínima.
Dos partidos políticos o quarto “P” – agora fazendo parte de queima de Judas, acrescido que foi àqueles famosos outros três – saiu-se melhor que a encomenda e cresceu em votos, prefeituras e vereadores.
Escrevemos na quarta 10, em http://adylsonmachado.blogspot.com (Rescaldo – Das eleições e do STF): “Profundamente emblemático, para alimento do raciocínio que encabeça estas considerações, a eleição de Osasco, em São Paulo. Por lá, João Paulo Cunha era o candidato petista, afastado do pleito em decorrência de sua condenação pelo STF. Venceu o PT, com o candidato que substituiu o deputado.
E no mesmo espaço concluíamos: “Ao que parece, como rescaldo da Ação Penal 470 no resultado das eleições, mais ficará no imaginário da população não o simbólico que representa o julgamento em curso no STF, mas a máscara e a capa do novo personagem carnavalesco, o ministro Joaquim Barbosa.”
Votação de fazer inveja
Poucos por aqui hão de se lembrar de uma professora que desancou, olhando nos olhos, os senhores deputados e autoridades do estado durante uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, discutindo a Educação. Sua intervenção fez sucesso no YouTube. (Acesse http:/www.youtube.com/watch?v=yFkt0OlceA).
Amanda Gurgel, professora de Português das redes municipal e estadual de educação, acaba de se tornar vereadora em Natal-RN, pelo PSTU. Com mais de 32.819 votos, 8,59% dos válidos, ajudou a eleger outros dois, um deles com apenas 717 votos.
Tem candidato a prefeito de Itabuna que gostaria de ter tido dita votação.
Ato falho
O articulista João Otávio, em seu artigo de final de semana (Eco das eleições) no Diário Bahia, nos brinda com duas pérolas: uma, de sua valiosa opinião; outra, de errônea revelação. Diz Dr. João Otávio:
“Nunca fui favorável à reeleição, e disse isso, algumas vezes, aqui mesmo, neste jornal; a nossa cultura, o jeito de ser do brasileiro, não casa bem com reeleição, seja para prefeito, para governador, para presidente da república. Mas, assim o quiseram os constituintes de 1998.”
Se não foi erro de revisão, ato falho para livrar o telhado do primeiro e escancarado comprador de voto parlamentar, em causa própria: Fernando Henrique Cardoso.
Caro Dr. João Otávio, o constituinte de 1988 aprovou mandato presidencial de cinco anos, SEM reeleição. O mandato foi reduzido para quatro, SEM reeleição, na revisão constitucional de 1993, quando Lula tinha amplas possibilidades de se eleger em 1994.
E gloriosamente comprada e paga (por Sérgio Motta, ministro e tesoureiro de FHC) para beneficiar quem estava no poder. Quem? Quem?
Convicção ou revisão
O novo articulista do Diário Bahia, o empresário Helenilson Chaves (com justo direito à chamada de capa), passa a nos brindar com texto semanal. É o que anuncia a edição última do jornal.
Está lá, na página 3, na coluna Opinião, sob o título “A Tinta”, discorrendo em torno de certa pesquisa sobre populações indígenas na região: “Aqui chegando, constataram que a depender da largura das listas pintadas no peito ou no rosto, podem ‘nascer’ de 15 a 20 índios”.
De imediato concordamos com a “constatação” trazida a lume pelo articulista. Nossa dúvida reside em dimensão mais purística. Como o espírito do texto nos remete a ver nas listas não uma “relação de nomes de pessoas ou coisas; relação, arrolamento”, mas “riscos” ou “traços” pintados “no peito ou no rosto”, certamente o revisão preferiu o paralelismo entre um e outro, admitido no Aurélio.
Para nós, e aqui também convocamos o ilustrado Ousarme Citoaian, além do próprio Helenilson Chaves, vemos lista onde deveria haver listras, mais afigurado à intenção textual.
Razão por que não sabemos se o texto sob comento é fruto da convicção e de um detalhe de revisão.
Para analisar I
Muitas derrotas atribuídas ao PT o são precipitadamente. Não podem sê-lo ao partido, mas a figuras que o lideram em alguns lugares. Para exemplificar, situando-nos na região: em Itabuna, ocorreu em decorrência de um PT personalizado em Geraldo Simões, que ocupou, como senhor feudal, a sigla como se fosse propriedade sob a égide do “abutendi” (abuso) romano. Tanto que alguns denominam o partido em terras grapiúnas, como nós, de PTdoG (PT de Geraldo Simões).
Em Itororó, Adroaldo Almeida não foi reeleito por causa da administração pura e simplesmente, mas por erros cometidos que fizeram a militância se dividir. Além de (muito cobrado por isso) aliar-se a adversários históricos em detrimento de aliados.
Pagou caro, individualmente. E, talvez, mais caro ainda, o município.
Para analisar II
Em nosso DE RODAPÉS E DE ACHADOS de 30 de outubro exercitamos especulações em sete rodapés, onde no último levantamos uma conclusão futuróloga de que não víamos “Geddel Vieira Lima com vocação para Dom Quixote” no que dizia respeito às eleições para a prefeitura de Salvador.
Por uma questão de espaço, especularemos na próxima oportunidade em torno do tema: os limites do quixotismo de Geddel.
Voltando aos rumos
O pós-eleitoral itabunense fez retornar aos trilhos as atividades clássicas de Ari Rodrigues e de Eva Lima, como agitadores e produtores culturais. Ari retomou a “Sopa Cultural” (não confundir com aquele “caldo” da FICC fiasco, regado a bebida e custeado pelo erário municipal fiquiano, que muito contribuiu para quebrar financeiramente a instituição) e Eva Lima à produção, com a Mostra Jorge Cine Amado, no Centro de Cultura Adonias Filho no próximo dia 17 às 8:00h (com o filme Capitães de Areia, de Cecília Amado) e 19:00h (com Jorjamado no cinema de Glauber Rocha e Jorge Amado, de João Moreira Sales), incluindo palestra com o jornalista e crítico Adalberto Meirelles, sobre a obra e o cinema amadiano.
Teatro infantil
A incansável Kétia Prado nos envia informação de que “O Miado do Leão” está em cartaz em Vitória da Conquista. No Camilo de Jesus Lima. Ou não, como diria Caetano.
Gal Costa
Com arranjo percussivo, onde mesmo a harmonia assim se expressa, “Adeus Maria Fulô”, de Sivuca e Humberto Teixeira, valoriza a interpretação.
Adylson Machado é escritor, professor e advogado, autor de "Amendoeiras de outono" e " O ABC do Cabôco", editados pela Via Litterarum
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