terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

Véspera


Passados vinte dias do julgamento. Tempo para recobramo-nos da depressão causada pelo desencanto de viver no país que insiste em não ser nação, onde as instituições não o são em si, mas tão só – a cada dia que passa tudo se agrava – instrumento da oportunidade. Quando ‘esquecemos’ – pela conveniência casual – de centenas de anos de certas teorias, dentre elas, a da prova, só resta o suicídio – ao materialista convicto – ou rezar – ao espiritualista na dimensão fuerbachiana, que sublima em outro plano a incapacidade/impossibilidade de realização, quando representa Deus como um ser pessoal existindo fora da razão e de si.

Favas contadas. Antecipado, até, o resultado. Desde Noblat, em julho de 2017, que afirmava certeza de que o TRF-4 não só manteria a condenação como aumentaria a pena, até a TV Bandeirantes, ainda na manhã do julgamento, mal começara este (o relator nem mesmo iniciara a leitura de seu voto), afirmando: “Lula é condenado por unanimidade...”.

Morte anunciada, sabia-se, e agradecíamos a Gabriel Garcia Marquez haver escrito que tal ocorreria através de uma “crônica”. Afinal, em jogo a conformação de uma sociedade que imaginávamos superada. Aquela sob absoluto controle de uma classe dominante patrimonialista, que sempre teve o país – desde os idos de Colônia, não custa reconhecer – como feudo pessoal e fonte de recursos.

A isso, o surgimento de um líder popular, oriundo da base nordestina de miseráveis, que chegou ao Poder e de lá melhorou a vida de muitos iguais (para isso, reduzindo ambições daquela classe dominante) não atendia aos reclamos daquela gente, especialmente quando demonstrou que sua liderança – através do partido – ensaiava perpetuar-se.

A morte anunciada, no entanto, não reside neste texto ao antecipado resultado do julgamento. Mas ao próprio, por suas consequências.

Dispensemos aqui as considerações diante da realidade, que deixamos plenamente traduzida no registro de Vladimir Safatle em artigo na Folha: “Um país onde Lula é condenado e Temer é presidente e Aécio Neves senador é algo da ordem do escárnio”.

No âmbito processual a consolidada teoria da prova foi lançada às calendas e prevaleceu o “eu acho” judicante como axioma. Ao juiz cabe decidir por princípio e não política ou moralmente. Os fatos que instruem um processo precisam ser comprovados não só por si, mas em sua relação de causalidade entre o fato e a conduta. Para tanto hão de ser sopesados entre o que acusa e o que defende.

Ao julgador cabe contrpesar em torno a qualidade das provas e ‘não sua inexistência’. Em nenhum instante qualquer dos senhores desembargadores cuidou da avaliação da prova pelo juízo de origem (alheias à prova dos autos) e nem mesmo citaram uma vez que fosse um argumento da defesa. Preferiram, e neles se sustentaram, as delações. Ou seja, o bandido que delata é a prova por excelência. Lembremo-nos de Léo Pinheiro que nunca teve sua delação aceita até que nela incluiu o nome de Lula.

Não, caro leitor. Não é a corrupção o que está posto em julgamento. Caso o fosse não haveria necessidade de contorcionismos tipo ato de ofício indeterminado, corrupção complexa, não receber mas solicitar. Tudo envereda na grande fábula que se torna conto da carochinha.

Sim, morte anunciada, para a credibilidade do Judiciário Brasileiro. Melhor ilustrado por Aroeira. Porque véspera da Quarta-feira de Cinzas.



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