domingo, 24 de julho de 2022

Bahia de quereres tantos, de lugares vários, de surpresas relicário

 

Vários são os cantos da Bahia, muito mais de recantos. Porque em cada um deles há um querer que o molda, uma tradição que o torna inigualável, um cantinho de seu de cada um. A energia que emerge da Bahia dizem ser sem igual. Alimento e néctar. Poesia e sons guardam relíquias ancestrais de povos vários, aqui concentrados pelas circunstâncias.

A Bahia de mistérios, dos gemidos dos afrodescendentes sob a chicote nas senzalas e pelourinhos, transformada em singularidades que elevam a superstição à píncaros comparáveis somente aos de suas origens ancestrais, sacra em tudo.

O sincretismo religioso sábia solução de ver manter reconhecidas as tradições dos desvalidos  tornou-se fonte de convivências espirituais diversas e conflitantes amalgamando-as no instante invocado.

Por meio de tudo desenvolveram-se quereres tantos guardados em relicário único.

E a Bahia se fez de festa. Tudo motiva sua gente a festejar. Na esteira, às festas religiosas aliaram-se às saudações pirotécnicas, dos antigos rojões de vara aos contemporâneos pistolões. Quanto mais o pipocar e mais tempo levar o queimar mais grandeza traduz o festejar e o poder de quem o promove ou do respeito ao destinado: santo ou político.

Sim, caro e paciente leitor: a classe política descobriu nos fogos a forma de expressão própria. Não se faz comício, carreata, passeata sem foguetório.

Desta forma  quem à distância esteja do frege  presume o que está a ocorrer pela quantidade e o tempo do pipocar.

Sob esse quesito todos se tornam iguais perante a queima do foguetório, escondidos sob a nuvem de fumaça que se forma: o poder aquisitivo pode confundir quem escute o alvoroço como se pequeno ou grande o ‘benfeitor’.

Um outro fator sustenta a classe política em disputa, programado a impressionar: a quantidade de gente, de cavalos ou carros nas programações para impressionar. Gente é povo, eleitorado fiel; cavalos traduz a categoria do eleitorado campesino e veículo a de abastados, em princípio, porque  de uns tempos para cá  não falta quem consiga um veículo a motor qualquer para garantir uns litros de combustível e livrar o bolso da despesa. O resto, nesta gente, é economizar de verdade, alguns desviando para casa na primeira esquina.

Assim, uma singular festa  resposta que se presume dada a este ou aquele candidato  é medida pelo que arrebanhe de seguidores em caminhadas.

Há alguns meses, antes das caminhadas, candidaturas se diziam definidas em resultados; a pouco mais de três meses para o primeiro turno as caminhadas vão pintando o quadro que se aproxima da verdade.

Caso tomemos por referência as caminhadas ultimamente realizadas por dois principais candidatos ao governo da Bahia em rincões vários as coisas começam a desagradar vencedores e animar perdedores.

Para completar, em Itabuna, a morte de Fernando Gomes  uma de suas maiores lideranças políticas no curso da história, no particular dos últimos cinquenta anos  deixa um pouco ao léu um deles na pretensão de arrebanhar seus herdeiros.

E, caso sejam as caminhadas uma forma de premonição, um tradicional herdeiro de feudo político pode estar perdendo os 'quereres tantos' de antanho, em lugares vários deste relicário de surpresas em que se tornou a Bahia há 16 anos.

Sinal de que um outro modelo destronou a tradicional forma que tanto dominou em lugares vários no passado, libertando-a dos gemidos e do chicote nas senzalas e pelourinhos eleitorais que vão desaparecendo na penumbra dos novos tempos que se implantam.

Onde caminhadas passam a destronar foguetes e rojões.


domingo, 17 de julho de 2022

Os sinais

 

Não são bons os sinais. Nenhum que mereça registro para a história. A violência propagandeada  se avança porque revela e expande o retido do primitivo do homem  preocupa porque encontrou vazão com a fissura na represa da razão que a continha.

Este primitivo, latente  guardado no mais profundo da psique  acomodado no degrau mais primitivo de evolução do cérebro (que salvou no hipocampo registros para a defesa da sobrevivência quando em fase pretérita), liberado pelas laterais daquele guardião (hipotálamo) refletido na impetuosidade e descontrole emocionais  e que fora superado no curso do processo civilizatório nos últimos dez milênios através do conhecimento aprimorado, discutido, dialetizado, aplicado ao cotidiano  reencontra o traçado para retorno às trevas.

Estamos há pouco mais de mês de um trágico registro histórico. Naqueles 23 e 24 de agosto de 1572 a intolerância e os interesses envolvendo o poder desencadearam uma matança de huguenotes (protestantes) sob a égide do catolicismo monárquico francês, disparado a partir da invasão da residência e assassinato do almirante Gaspard II de Coligny, líder huguenote, por um fanático chamado Maurevert.

Entre 5.000 a 30.000, os que sucumbiram à selvageria. A desculpa imediata dos agressores: evitavam um golpe de estado. Ou seja, a manutenção e controle do poder temporal sob o crivo do pensamento religioso católico que se disse ameaçado pelo calvinismo francês.

450 anos são passados. No presente não nos incomoda o número de sacrificados, mas a possibilidade.

Não são bons os sinais. Os tempos são outros, as forças  também de outra natureza – chegam ao poder e dele não pretendem se afastar. Nem mesmo admitem uma derrota pelos mesmos meios que as elegeram.

Não são os huguenotes as vítimas no presente. Parte dos que os seriam, hoje algozes, pregam o nada de amor cristão e mais o ódio contra o que tanto clamou Cristo. Clamam dos púlpitos contra as instituições; rezam abençoando armas; e mais: o ódio enaltecido por meio de ações cantadas em muitos púlpitos não somente busca assegurar a permanência de estruturas de poder, mas a manutenção de espaços em que a cornucópia oficial destina recursos aos privilegiados que “ouram” juntos.

Os sinais não são bons. Nada salutares.

Os efeitos do malefício propagandeado há poucos anos  antes localizado  está alcançando os redutos os mais distantes e distintos: do Rio Grande do Sul à Amazônia, do Paraná ao Nordeste. Há sempre um cantinho onde brota como não quer nada, de onde jorra sangue aos borbotões. Um 1572 pátrio, este o sonho.

E aqui, bem perto de nós, passamos a vivenciar o que imaginávamos distante, conversa de noticiário sensacionalista.

Ali, em Itapetinga.

“Itapetinga  Terra Firme, Gado Forte”. Desde os primeiros instantes da então famosa e referencial Exposição Agro-Pecuária e Industrial de Itapetinga, nos anos 50 do século passado (que se tornou nacional poucas décadas depois), a legenda ocupou as mentes e traduzia sinal do progresso por que passava sob o comando de administrações exemplares, que cuidaram sempre de colocar os interesses do município acima dos individuais.

A pecuária itapetinguense, ainda que abalada pelo processo de industrialização, mantém Itapetinga no panteão de municípios referenciais no país. Perdeu espaço nos gráficos de Economia, mas não o respeito originário.

Mas, eis que o instante por que passamos faz lançar Itapetinga no noticiário nacional. Não pela grandeza e grandiosidade de sua pecuária, mas pela estupidez humana. Simbólica e metaforicamente perfeita para os atuais tempos: um vídeo registra um guarda municipal, usando farda, com arma em punho, que ameaça e espanca um estudante, sentado em um banco sem esboçar qualquer reação. Insatisfeito em não encontrar o álibi que provoca para coroamento de sua vocação agressora  assessorada pelo filho, que lhe segue o exemplo de espancar  ainda bate mais vezes na vítima indefesa.

Há 450 anos a intolerância campeava leve e solta. Revelada por D. W. Griffth no filme ‘Intolerance’ (1915), também denunciando o que acontecia em seu país. Hoje está se tornando lugar comum; avançando, no entanto, como asteroide em rota de colisão com o bom senso que deveria nortear as autoridades, que em vez de combatê-la a exaltam e a propagam como salvação da pátria.

Não, os sinais não são bons.

E pior ficam, porque estamos nos acostumando com tudo a ocorrer, como se barbárie fosse expressão de Civilização. E já não bastam a histórica intolerância de classe, que impõe o aprofundamento da desigualdade como política de Estado, e a manutenção dos históricos ‘criminosos’ de sempre  negros, indígenas, miseráveis outros sem-terra, sem teto e sem comida e quem os defenda  a serem erradicados como erva daninha, como os huguenotes do século XVI, na que será nossa Noite de São Bartolomeu.

Caminhamos para assistir não uma matança para ‘evitar um golpe’, mas para consumá-lo em favor dos que “ouram” em nome de uma divindade que não pode ser chamada de Deus.

Não, os sinais não são nada bons!


domingo, 10 de julho de 2022

Não um morto qualquer!

 

Eis que já não basta a Suas Excelências parlamentares a função de parlamentar: também querem diplomaciar, serem embaixadores no exterior sem deixar o mandato. Sim, caríssimo leitor, este o singular detalhe: sem perda do mandato. É a ‘PEC dos embaixadores’ que o presidente do Senado pretende aprovar a toque de caixa.

Eis que o Ministro da Defesa em reunião ministerial (muito mais eleitoral) reflete o que o preocupa: as urnas eletrônicas (Globo). Ou seja, sua preocupação não é a defesa das fronteiras ou da soberania nacional, evitar a invasão de terras indígenas ou a exploração garimpeira ilegal e o contrabando de minérios na Amazônia, ou mesmo de atos terroristas em diferentes pontos do país, mas do cargo.

Eis que “militares dizem não abrir mão de três pontos para distensionar ambiente até as eleições” (DCM).

Eis que lançam uma bomba caseira (mais uma; a outra, em Minas Gerais, através de drone) durante o evento em que Lula participava no Rio de Janeiro. O problema não é a bomba em si, mas o cristalino de constituir um ato de terrorismo.

Do púlpito de uma igreja católica em Laranjal-SP: “O maior ladrão que o mundo já viu...”  proclama o padre, referindo-se ao ex-presidente Lula.

Família de Dom Cláudio Hummes teria demonstrado constrangimento com presença de Lula e Alckmin no velório (Revistaoeste). Ainda que não haja informações de que os políticos fizeram discurso de campanha no evento.

Eis o caminhar deste país, em ano crucial como um eleitoral. Ano que substitui debates de ideias e quem deles foge ‘argumenta’ com provocações e agressões a quem pense diversamente.

Tudo como antes no quartel de Abrantes tomando-se cada caso isoladamente:

Suas Excelências sempre insatisfeitas com a boquinha. Insaciáveis.

O atual Ministro da Defesa, ah!... Deixaríamos pra lá se não estivesse embutido na ‘preocupação’ uma intervenção voltada para impedir as eleições ou intervir no resultado. Não fora isso, como entender as esdrúxulas exigências de que seja feita uma ‘totalização paralela’ por TREs ao mesmo tempo que a do TSE (reedição do escândalo Proconsult nas eleições do Rio de Janeiro para garfar Brizola), realização de auditoria por empresa indicada pelo governo e o suprassumo levantado pelo inquilino do Alvorada: um computador das Forças Armadas conectado ao sistema oficial (do TSE) para apurar por conta própria.

Bomba lembra o projeto do Brigadeiro João Paulo Burnier de explodir o gasômetro do Rio de Janeiro, em 1968, para jogar a culpa nos comunistas; ou aquele outro, de explodir a adutora do Guandu,  programado pelo atual inquilino do Alvorada, em 1986, que o levou à reforma/aposentadoria aos 33 anos de idade para não ser condenado e preso por terrorismo.

Conclusão deste escriba de província sobre a ameaça velada de parcela de chefes das Forças Armadas de impor três pontos para distencionar (não intervir através de um golpe): ponto 1: Lula não vencer; ponto 2: Lula não vencer; ponto 3: Lula não vencer. Ou prometer que se vencedor renuncia em favor do atual inquilino. Rsrsrsrsrsrsrs...

Padre no púlpito e reação da família do Cláudio Hummes: natural. Afinal, parcela considerável da Igreja Católica no Brasil  e de ‘católicos’ que a servem  como já ocorreu na Espanha etc. não vê os “pequeninos” de que fala Jesus Cristo e muito dessa gente não suporta o Papa Francisco. Aliás, parcela da Igreja Católica no Brasil atualmente disputa com os evangélicos e o pentecostalismo mercantil quem ainda dispõe de ‘lascas’ da cruz de Cristo para comerciar!

Avalie, caro e paciente leitor, se o padre anda fazendo política no púlpito imagine no confessionário!

Por outro lado  ainda que respeitemos o gosto político-partidário dos familiares  não sabemos se a família de Dom Cláudio Hummes lembra de sua relação com os trabalhadores desde os idos de 1975, quando tomou posse como bispo diocesano de Santo André (no fervilhante ABCD paulista) e que acompanhou o movimento sindical que se organizava contra a ditadura militar, se tornou amigo de Lula e se aproximou da Teologia da Libertação; que foi um feroz crítico dos abusos do capitalismo e da globalização; que foi um influenciador decisivo na eleição de Jorge Mario Bergoglio Papa Francisco  a quem saudou com um “Não esqueça dos pobres”.

Lamentavelmente, vendo seus familiares se retirando do velório do pranteado com a chegada de Lula e de Alckmin (dentre outros) não sabemos se a deselegância o foi por Lula ou por Alckmin (da Opus Dei) ou por ambos. Tampouco se imaginaram que ali se fizesse política eleitoral em simples ato de respeito aos mortos. E eis que ali não estava um morto qualquer.

Os gestos e atos vislumbrados ampliam a certeza de que não vivemos um estágio civilizatório digno do nome. Pulsões da brutalidade reprimida, do descaso para com o semelhante, da ambição e do poder pelo poder, da manipulação de valores morais a serviço da imoralidade, do alheamento à realidade nos tornam uma sociedade de seres abjetos e infames.

E neste atual quadro eleitoral, reflexo da bizarrice que nos acometeu, tudo aflora e vai assumindo patamares nunca antes imaginados. Onde tudo será possível acontecer, porque não falta quem pense que pode mudar o mundo para torna-lo à sua forma de pensar. Que o que tem na cabeça pode lançar através de drone ou de bomba caseira como expressão de sua intelectualidade que tem a barbárie como objetivo a alcançar para sentir-se em casa.

Eis que fraternidade se torna palavrão e o espírito da cordialidade sucumbe ao da intolerância. Nem mesmo comemorar um aniversário em sua própria casa sob símbolos do que acredita. A estupidez ocupa os espaços. Uma gente incapaz de ouvir a Ode à Alegria, de aceitar que o homem idealista sonha com a igualdade e paz como apoteose da existência.

No geral e no bem fundo do fundo há um sonho velado desta gente neste quadro eleitoral: um outro morto. Não um morto qualquer!


domingo, 3 de julho de 2022

Calamidade e estado de emergência eleitoral

 

O Globo destaca um fato singular: praticamente o dobro de brasileiros se diz de direita (30% a 16%). Num país em que cerca de 70 milhões vivem em estágio entre não ter o que comer e não saber quando comer, encontrar 30% da população que se diz afinada com políticas concentradoras de renda (causa da miséria e da desigualdade) não deixa de beirar o surrealismo. Isso se pautássemos a compreensão por fatores atrelados à lógica.

Mas, por trás de tudo, a capacidade de convencimento dos meios de que dispõe a classe dominante leva a tais conclusões.

Coisa assim, tipo o indivíduo sem-teto pedindo esmola em frente a um ‘terreno de engorda’ (especulação imobiliária) e se dizendo defensor da propriedade. E outros tantos entendendo que a riqueza de poucos é desígnio de Deus e a miséria de milhões, falta de Fé.

Na esteira das coisas, outras acontecem neste Brasil do inquilino do Alvorada: pela primeira vez a calamidade de sua política econômica cobra por ser reconhecida como situação de emergência.

Na verdade, emergência eleitoral.

A situação da reeleição do inquilino do Alvorada por meios democráticos é ‘vela no caixão’ não somente diante das intenções de voto levantadas nas pesquisas, mas diante da rejeição decorrente das calamidades praticadas, segundo o DataFolha (em Mateus Leitão): “Bolsonaro é mais rejeitado por desempregados (66% nunca votariam nele), pretos (63%), nordestinos (62%), estudantes (62%), mulheres (61%), católicos (61%), jovens (60%) e os mais pobres (60%)”. Na média, “55% dos brasileiros disseram que não votam no atual mandatário de forma alguma nas eleições de outubro”.

Tal circunstância se materializa em dados de pesquisa (Carta Capital) que afirma não conseguir vencer qualquer dos candidatos no segundo turno.

Ou seja, para quem está no fundo do poço qualquer ponta de corda é guindaste.

Para tanto organize-se a quadrilha (ops!, a base no Congresso, inclusive porque não faltará eleito pela esquerda que ‘entenda’ o instante) e promova-se uma escancarada fraude eleitoral; em meados de julho será possível a redução do preço dos combustíveis (à custa de receitas estaduais) sem reduzir o lucro dos acionistas da Petrobras, amplie-se os valores do Vale Gás e do Bolsa Família travestido em Cartão Brasil e distribua-se o Vale Caminhoneiro. Mas atenção! – até dezembro de 2022. De janeiro em diante volta tudo ao que fizemos.

O que nos causa espécie no arrazoado presente não é 30% da população dizer-se “de direita”, porque sabemos o que ouve e o muito pouco que lê.

Nem mesmo o governo que pretende tornar-se permanente dizendo-se necessitado e alardeando crescimento econômico promissor.

Tampouco a fraude anunciada com data antecipada para terminar.

Mas a quase indiferença com que o tema é tratado pelos formadores de opinião diante da imoralidade contida em pedido de emergência para justificar uma fraude flagrantemente anunciada para fins eminentemente eleitoreiros. O destaque dado às “bondades” dão-lhe um caráter de perenidade quando não ultrapassarão quatro ou cinco meses.

Neste escancarado cenário de fraude para manter a tragédia implantada a partir de 2016 30% da população a defende porque se considera de direita e outra parcela será ‘convencida’ da bondade e da preocupação do governante com os desamparados de sempre, ora lembrados pelo messias. 

Com apoio da leniente grande imprensa lançando ao largo a verdade. Mais uma vez!