domingo, 30 de junho de 2019

Escolha o leitor: uma droga de semana ou uma semana de drogas

Uma semana como sói natural nestes tempos singulares. Diplomacia –  ou o que isso representa para o atual governo , judiciário, hidrofobia, drogas e quejandos outros. E –  tema obrigatório –  o que traz o Intercept.

No quesito droga cremos que o título deste dominical deixa ao leitor reconhecê-la sob a melhor configuração semântica. 

Aos fatos, como observados pela coluna.

Aplausos
Não se diga que o governo liderado pelo inquilino do Alvorada não encontra apoio internacional. Por defender pauta das mais retrógradas na ONU o Brasil foi aplaudido pela Arábia Saudita, Paquistão e Barhein, como veiculou Jamil Chade

Inclusive o autor da matéria ouviu de um diplomata que circulava nos corredores do G-20, em Osaka-Japão, uma afirmativa de um o governo de Duterte (Filipinas) tinha apoio brasileiro para uma resolução para que os massacres naquele país não sejam investigados.

Na outra ponta,  a agenda com o presidente da França, Macron, foi por ele (Macron, naturalmente) cancelada, em protesto às posições da ‘diplomacia’ brasileira em relação ao clima.

O inquilino do Alvorada se tornou um típico leproso vivendo no auge das Escrituras: ninguém o quer por perto. E quando aparece fogem dele como o Diabo da cruz.

Não se diga que tudo foi ruim: o excelentíssimo – que já andou exaltando exportação de abacate brasileiro para a Argentina – acaba de anunciar a força da terra brasilis naquilo que vê como grande fonte de divisas para o país: exportação de bijuterias de nióbio.

Chade se disse decepcionado. Não sabemos se a adjetivação corresponde à realidade.

Lado desconhecido
O apoio de alguns militares ao inquilino do Alvorada (leia-se, ao seu governo e ideias) exibe um lado que nunca imaginamos existir nas Forças Armadas: o idiota de farda.

Tudo acrescido do singular instinto de cão raivoso, como alguns fazem questão de exibir.

Avião
Helicóptero de Perrela, com 548 quilos de pasta de cocaína; avião da comitiva presidencial, com 37 quilos; 33 quilos em outro avião militar.

Famosa a expressão ‘avião’ para definir crianças e adolescentes que servem ao tráfico transportando papelotes.

Oportunidade de conferir quem são os verdadeiros traficantes. 

E de onde surgem e quais a garantias de cada um deles.

E lá se vão as galinhas dos ovos de ouro
Estatais de outros países apropriam-se, via privatizações, das riquezas minerais brasileiras. Não são os investimentos que aportam, mas as facilitações do governo para que se apropriem da riqueza que é do povo.

O detalhe é que cai por terra o discurso interno de que as estatais são inconvenientes. Naturalmente as nossas – para os entreguistas – porque as estatais chinesas, norueguesas, francesas, italianas, até mesmo colombianas estão nadando de braçada em substituição às nossas.

País dos sonhos
Melhor diríamos: Judiciário dos sonhos. Sonhos de efetivação de Justiça, não. Mas os sonhos da classe dominante. Aquela que tem o país a seu serviço.

Deu no 247: aquele senador do Distrito Federal condenado por crimes financeiros a quatro anos acaba de ter autorização judicial para passar férias em Aruba, no Caribe.

Lula não teve autorização nem para ir ao enterro do irmão.


STF I
Trilhamos pelo perigoso caminho de desconhecer que toda ação humana carece de estar respaldada na Moral. Ou seja, somente se perfaz válida se moralmente reconhecida, se por aquela justificada.

Diante das dúvidas que pairam sobre algumas excelências degustadoras de filé de lagosta e vinhos importados (à custa do povo) diante do escândalo comandado por juiz e procuradores para condenar Lula cremos que o dito acima tornou-se apenas figura de retórica.

STF II
Como previsto a covardia, o comprometimento com o golpe confirmado fica com o adiamento inconcebível em um Estado de Direito, quando feridas as disposições legais que asseguravam o direito do autor ao julgamento.


Réu idoso preso, julgamento já iniciado para apreciar o habeas corpus.

Ainda que saibamos, não custa perguntar: o que ganha o STF afirmando-se conivente?

STF III
Temos escrito em torno do comprometimento do STF com tudo que ora ocorre. Até porque nada mais profético que aquele “Com Supremo e tudo” de Sérgio Machado dialogando com Romero Jucá, tradução literal do que se trama nos bolsões da classe dominante para se apropriar do Estado e dele fazer sua propriedade: a lei é para todos – os outros – não para mim

Mas uma pergunta sempre nos fazemos: quem nomeou tais ministros?

Da atual composição apenas quatro – já foram três – não são indicação de governos petistas. E olhe que outras peças (singulares) não mais lá estão (também indicações petistas) como Ayres Brito, Joaquim Barbosa, Eros Grau, César Peluso.

De origem petista indicações várias para Superior Tribunal de Justiça e TST.

Lula já afirmou, diante da juíza Gabriela Hardt, que as indicações para o STF ocorriam por acordo com a classe política. 

Aí o busílis: regra antiga (que devia ser combatida) como a indicação para cargos vários (inclusive diretorias da Petrobras) para assegurar a ‘governabilidade’.

A manutenção de tais vícios gerou ‘mensalão’ (caixa 2 julgado como corrupção) e petrolão. 

Naturalmente porque o PT era a vidraça. Afinal, beira a insanidade imaginar que tudo começou em 2003.

domingo, 23 de junho de 2019

Ainda a "era da vergonha"



Na cronologia da história humana a periodização constitui singular capítulo a demonstrar os estágios de avanço na construção que deságua nesta contemporaneidade (Era Antiga, Era Moderna etc.). 

Alguns levaram milhares de anos, outros bem menos tempo. 

Mas, talvez, nenhuma tenha surgido tão rapidamente como a "era da vergonha", criação tupiniquim desenvolvida nesta terra brasilis em menos de uma semana. 

[...} "Com Supremo e tudo" I
Vivemos uma situação inusitada (em que pese nada mais que envolva STF e quejandos justificar tal adjetivação): possibilidade concreta de um julgamento agendado para o próximo dia 25 ser adiado ao sabor dos humores da nova presidente da Turma que julgará o habeas corpus impetrado para reconhecimento da nulidade processual por suspeição do juiz Sergio Moro.

Onde o inusitado? Todo o planeta reconhece a postura criminosa de Moro. Inclusive não poucos magistrados e procuradores brasileiros. Sem descurar de ministros. Os fatos são gritantes.

Temos dito, porque sabido e consabido, que nada teria acontecido caso o STF houvesse cumprido com seu dever de protetor da ordem jurídica.

Eis aí o busílis: no momento Moro está às traças no quesito credibilidade; caso o STF (Cármen Lúcia) adie a decisão promoverá o reconhecimento da responsabilidade de muitos de seus pares na patranha que levou Lula à condenação/prisão e à impossibilidade de candidatar-se à presidência.

Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.

[...} "Com Supremo e tudo" II
Afinal, em estágio de confirmação e ratificação o alinhamento do Poder Judiciário e Ministério Público (por convicção) e a classe dominante e sua representação (Congresso) com o golpe que no primeiro instante evitou Lula tornar-se ministro de Dilma, em seguida alimentou a deposição/impeachment da presidente e se consumou com a perseguição judicial ao ex-presidente como pessoa e como político.

A Procuradora-Geral da República Rachel Dodge já exibiu as unhas e dentes: opina contra a suspeição de Moro. Resta o STF confirmar. Ou tentar se redimir dentro de um quadro irremediável.

Afinal, todo o desenrolar desta ópera bufa ratifica, mais e mais, o grande acordo refletido no diálogo Sérgio Machado/Romero Jucá: “A solução é botar o Michel [...] Num grande acordo nacional, com Supremo e tudo”.

"Botar o Michel” significa ‘botar’ qualquer um, gato, rato, papagaio, periquito.

O atual inquilino do Alvorada foi apenas a solução extrema, quando não mais havia outra saída.

No fundo, uma catarse viva e permanente muito bem ilustrada por Jessé Souza em seus últimos escritos/revelações, do qual destacamos “A Elite do Atraso” e por Petra Costa, no documentário “Democracia em Vertigem” (Netflix).

Mais uma da série
O inquilino do Alvorada retirou de Ônix Lorenzoni (civil) a articulação política com o Congresso e a transferiu para o recém nomeado General Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo.

Simplesmente retirou do político de carreira o controle da articulação com os pares políticos e o entregou a um general.

Como não sabemos da experiência política de um general de caserna, a não ser sob o critério do mando e da ordem unida, muito certamente o inquilino pretende que, com um grito, o Congresso se submeta, sob o risco de baionetas embaladas convencerem os recalcitrantes.

Busca repetir o que já aconteceu com o STF: ameaça de general já funcionou. 

Contra Lula, naturalmente.

A preço de ocasião
O STF (leia-se ministro Edson Fachin) legitimou mais uma falcatrua: a venda da Transportadora Associada de Gas, subsidiária da Petrobras.

A coisa remete a um cheiro comum, como aquele negócio mal feito da indenização/aquisição da Light, pelo Governo Federal, nos anos 70 do século passado, por 390 milhões de dólares.

Para relembrar: a Light (canadense) tinha concessão governamental para fornecer energia por 100 anos e todo o material investido no período seria do próprio governo ao final do período, 1991.

Resultado: ainda que fosse receber ‘de graça’ os investimentos feitos pela Light o governo pagou, para antecipar a entrega, a bagatela acima referida. 

O negociador, eufórico, declarou a um amigo a inconfidência (entreouvida pelo Jornalista Sebastião Néry, que a publicou no Tribuna da Imprensa) que só ele receberia 39 milhões. Supimpa.

Dias atuais: nesta entrega na bacia das almas a Petrobras vende um gasoduto em valores de mercado por aquilo que ora transporta. 

Por mera coincidência, logo depois anuncia mega campo em Sergipe de petróleo e gás.

Ou seja: o valor transportado poderia ser bem maior do que aquele que justificou o atual preço.

Apoteose: caso a francesa adquirente resolva vender hoje a TAG, sem mesmo tomar posse do que comprou, ganharia bilhões de dólares.

Viva o Brasil!

E para não perder o mote: "Com Supremo e tudo".

Perfeito
Do muito pouco que assisti da midiática sessão da Comissão (o que se tornou comum, especialmente quando se pretende utilizar  no caso a própria mídia  da contextualização conveniente para atingir este ou aquele objetivo) não alcancei a expressão deste senador. 

Cansei em razão de dois instantes: um deles, a mediocridade intelectual de uma senadora do PSL, que se proclamou advogada, tentando explicar e defender o inexplicável e indefensável; outro, o de dois senadores petistas, que  mais uma vez (os petistas)  transformam em palanque uma oportunidade de deixar a singular nada 'triste figura' na rés do chão, bastando que perguntassem ao dito cujo se "verdade ou não" o que foi divulgado. 

Caso assim fizessem deixariam o "artista" na condição de: 1. ou confirmava; 2 ou negava. No primeiro caso, a confissão; no segundo, a prática de crime, a ser apurado, por mentir perante a comissão. 

Mas assim não agiram Suas Excelências. 

E mais uma vez  não conseguem fazer a leitura da realidade (de que são 'o Cão chupando manga')  e alimentam a mídia favorável a tudo que a aí está, aquela para quem tudo "é coisa do PT". 

A postura do senador capixaba foi perfeita. Lembramo-nos, respeitosamente, da então senadora Marina Silva, interrogando ACM no caso da violação do painel, quando se limitou apenas a perguntar  de forma arrasadora  dispensando o discurso. 

                  

domingo, 16 de junho de 2019

Nesta 'era da vergonha', um abraço de afogados nos lembra Drumond


Era da vergonha I
Até que efetivamente fique provado, em processo judicial onde a lisura, o respeito à lei e à Ética se façam imperativos, 

Lula já está totalmente absolvido pelos fatos, pela História, na mesma proporção em que, ETERNAMENTE, estão cobertos de vergonha e ignomínia, de desonra, Moro, Dallagnol, a Globo, os procuradores da Lava Jato e, por tabela, os desembargadores cretinos do TRF4 e os covardes ministros do STF, todos cúmplices do que se sabia, mas só agora veio à luz de maneira irrefutável – faça a Globo os esforços patéticos de retórica que quiser….”, observa Eduardo Ramos no GGN.

E acrescentamos: nestes tempos em que o desprezo pela seriedade e respeito se fizeram a tônica ficam desmoralizados alguns magistrados, desembargadores, ministros, procuradores que legam, como artífices mefistofélicos, para a história uma era nunca dantes imaginada: a era da vergonha.

E não há como alegar inocência ou boa-fé com tudo que aconteceu.

Era da vergonha II
No entanto, cabe registrar, o que de mais profundo há nos acontecimentos decorrentes da divulgação pelo Intercept das espúrias relações entre o então juiz Sérgio Moro e Procuradores da República não se limita aos atores principais. 

Mas àqueles, ora secundários, que são os verdadeiros responsáveis por tantos absurdos: do Procurador-Geral da República aos desembargadores do TRF-4, ministros do STF e do STJ por suas ações ou omissões em tudo que ocorre neste país, desde os instantes que antecederam ao impeachment até a intervenção no processo eleitoral. 

Sem afastar um tal de Conselho Nacional de Justiça e aquel'outro, Conselho Nacional do Ministério Público, responsáveis por arquivar pedidos de apuração dos fatos no imediato do acontecido.

No momento Moro e Dallagnol são o boneco de Judas no sábado de aleluia. Crucificá-los não basta.

Afinal, a era da vergonha não começa com eles. Tão somente sentiram-se suficientemente seguros e apoiados para fazê-lo. Seguraram o rojão e os superiores acenderam o pavio.

Era da vergonha III
No final, aquela que seria a ‘operação’ para livrar o país da corrupção torna-se, nada mais nada menos que uma bem urdida “conspiração” para frustrar uma eleição presidencial. 

Uma conspiração que se valeu de tudo que pudesse corresponder aos interesses – nada jurídicos – da camarilha encastelada no entorno de Curitiba correspondendo ao sonho da classe dominante predatória.

Nesta era da vergonha deixa um legado para estudiosos desta chaga chamada corrupção: qual delas a pior, a mais nefanda, roubar o erário ou roubar a consciência do povo; roubar o dinheiro ou roubar a fé nas instituições; exercitar o patrimonialismo ou destruir o império da lei.

Há quem entenda que não, mas para muitos a maior corrupção é a corrupção da lei.

E agora, José?
Desmoralização escancarada. Quem o defende – e defendendo a si, como a Globo e quejandos, em conluio, fazendo o jogo de Moro e Procuradores através dos vazamentos selecionados que lhes chegavam – tem os dias contados, até ser posto de castigo pela história, que não tardará e se encontra em disparada à luz do dia e não “de madrugada”, para lembrar Cervantes. O mestre espanhol alertava a insignificância do gesto dos que ‘saiam em louca disparada’ – “Para quê? Para nada!”.

O escândalo pegou a turma com os cueiros na mão. Ainda que internamente – nesta terra brasilis comandada por uma classe dominante predadora – esteja a imprensa que tudo isso representa, massageando o peito agonizante antes que aporte o balão de oxigênio, lá fora os grandes jornais e revistas (respeitados) botaram a boca (o Moro) no trombone.

Mas, dirá alguém mais inocente: por que tudo isso? 

Resposta elementar, caro Watson: uma cadeira no Supremo Tribunal Federal, onde se degusta filé de lagosta e vinho às custas do povo. Cadeira negociada, prometida e garantida pelo caminho da nomeação para ministro. Tudo mais certo que boca de bode, tanto que o pretendido abandonou a carreira que afagava seu ego e o fazia herói para os que desconheciam os subterrâneos e as entranhas de seu castelo.

Para nós, que sempre vimos o ‘salvador da pátria’ como objeto de estudo para a Psicanálise (aquele traje preto sempre nos deixou naquela de hummmm!), diante da fritura por que passa na mídia internacional, tudo aliado à declarações e pedidos de afastamento da função – resistindo brava e heroicamente – nos cheira a outra circunstância para análise: masoquismo. Há quem sinta prazer em ferir; outros, em se deixar ferir.

Mas, tudo Freud explica!

E agora, José, quem paga a conta?
“Sob o pretexto da luta contra a corrupção, trocaram o Direito pela política. Na espécie, ignoraram as lições mais elementares que qualquer aluno de graduação aprende em Introdução ao Direito [...] Atropelaram garantias, atropelaram a Constituição, atropelaram a lei.” (Lênio Streck)

Mas – imperativo reconhecer – a sanha persecutória não se limitou a encontrar culpados (alguns adredemente distinguidos), não só destruiu valores jurídicos, também o país. O povo paga uma conta que não fez.

A pergunta acima se impõe. Afinal, a conspiração não somente destruiu o Estado de Direito; também o Brasil.

No fundo, a mensagem importa mais que o mensageiro e no rescaldo do incêndio muito custará não só aos imediatamente atores principais (Moro e Dalagnol) mas, também, aos secundários: STF, STJ, TRF-4, Procuradoria-Geral da República, CNJ, CNMP e, principalmente, a imprensa que publica sem apurar.

Abraço de afogados
O apoio do inquilino do Alvorada ao premiado porque garantiu sua eleição tende a suicídio político para ambos. Não sabemos até onde e quando a imprensa amestrada conseguirá blindá-los.

Estão – um e outro – vivendo uma ‘realidade’ surreal: aquele não pode demitir este porque seria reconhecer sua culpa: e mais, que tal culpa o beneficiou; este, enquanto não pede para sair – o que seria, para ele, confissão – sangra a imagem do outro. E ambos sangrados pela verdade que os incomoda.

Para que o leitor possa mais argumentar: em meio à turbulência o inquilino do Alvorada disse que confiar 100% só nos pais. Leitura elementar: o outro não é pai dele, pelo que se sabe. Em que pese ter agido como verdadeiro pai, quando o presenteou com a morada do Alvorada.

Nessa relação – que cabe a Freud definir – não sabemos se o filho vai trair o pai ou se o pai vai ajudar o filho. No primeiro caso, o filho ajudaria o pai; no segundo, o filho volta a ajudar o pai e pede para sair. 

– Você primeiro – dirá um. 

– Você primeiro – dirá outro.

E tanto o tempo para decidir que ambos se afogarão. Um saindo; outro ficando.

Valois
Do facebook do juiz Luis Carlos Valois

“Não houve um julgamento, houve um acordo de condenação”.

Bob Fernandes, didático:

               

domingo, 9 de junho de 2019

Não leu Etienne La Boétie


Dia desses o país acordou sob notícias de um ‘pacto’ entre os Poderes da República. Certo que o chamado de pacto de logo foi desmentido pelo presidente da Câmara. Mas, o ridículo já ocorrera.

Em meio a tudo, uma singularidade chamou a atenção: o que ali fazia o presidente do STF Dias Tóffoli, tão à vontade que os dentes no quarador apenas confirmavam aquela alegria própria de pinto no lixo.

Montesquieu entrara em desespero. Suas cinzas acabam violadas e, mais, violentadas naquela distante nação soberana que se chamava Brasil e passa pelo estágio de ser apenas State Brazil.

Prenunciou o sempre lembrado, estudado e citado Montesquieu que três poderes deveriam substituir o princípio absolutista. Assim, um deles administraria, ou outro faria as leis (discutidas por representantes) e um terceiro avaliaria a validade das leis e das ações do administrador conforme o ideário de Justiça. Poderes autônomos e in(ter)dependentes, cada um no seu papel institucional, sem comunicação outra que não o bem servir à sociedade e dar-lhe tranquilidade e confiança.

Por tal raciocínio torna-se elementar compreender que é impossível uma pactuação entre eles (que deve existir tão somente em fazer cumprir a finalidade natural, de atender ao interesse comum). Pacto é acordo, é consonância, unidade de pensamento definido e muito apropriado ao universo privado. No campo político-institucional admite-se o pacto, mas quem pactua são as forças políticas.

Cabendo ao governo do instante aplicar as Políticas de Estado fixadas na Constituição Federal cabe ao STF, quando provocado, responder se está conforme ou não, decidindo por mantê-las ou não. Em outras palavras? Cabe ao STF não interferir no ‘como’ da execução das políticas públicas, mas decidir – quando provocado, repita-se – em torno da legalidade e adequação constitucional do que decidam legislativo e Executivo. Ultrapassar tais limites beira a usurpação. E, mais que isso, alimenta a fogueira da bandalheira institucional que ora construímos e que lhe cabia não afagos com o abano mas evitar que tal acontecesse.

Por tudo que sabemos o STF não é força política – ainda que sua retórica contemporânea neste Brasil não tenha sido outra coisa – razão por que não ser racionalmente compreensível que o presidente da Corte se faça presente em café da manhã na moradia do chefe do executivo, ao lado de presidentes da Câmara e do Senado, para discutir (com outros poderes) aquilo que chamam de pacto.

Quando ao café com o inquilino do/no Alvorada nada a comentar. Afinal o Presidente do STF faz parte da turma que come filé de lagosta e toma vinho às custas do povo. 

Poderia Sua Excelência, Dias Tóffoli, arranjar um tempo – pelo menos enquanto esvazia a lagosta e vinhos na sentina (obrigado Tormeza) – e dar uma lida em Discurso da Servidão Voluntária, de Etienne La Boétie. Talvez dali pudesse abstrair, como metáfora, o papel ridículo que assumiu de parceiro – e usuário da cozinha – do inquilino do Palácio da Alvorada.

Para Boètie, reconhecendo que todos os governos (inclusive a tirania) só podem governar durante muito tempo se encontrarem apoio da população e que somente esta os legitima: “[...]não há necessidade de lutar para superar este tirano único, pois ele é automaticamente derrotado se o país recusar o consentimento para sua própria escravização: não é necessário privá-lo de nada, mas simplesmente não lhe dar nada; não há necessidade de que o país faça um esforço para fazer tudo por si mesmo, desde que não faça nada contra si mesmo. São, portanto, os próprios habitantes que permitem, ou melhor, provocam sua própria sujeição, pois, deixando de se submeter, acabariam com sua servidão. Um povo se escraviza, corta sua própria garganta, quando, tendo uma escolha entre ser vassalos e ser homens livres, deserta suas liberdades e assume o jugo, dá seu próprio sofrimento, ou melhor, aparentemente o recebe.”
Jogos, farsas, espetáculos, gladiadores, animais estranhos, medalhas, imagens, e outros tais opiáceos, estes eram para os povos antigos a isca para a escravidão, o preço de sua liberdade, os instrumentos da tirania.”

Temos que, fosse hoje o expresso pelo francês, diria: não só lagostas e vinhos, também um café da manhã ao lado do tirano torna-se isca e moeda de troca para a respeitabilidade, o que o faz desaguar no lugar comum dos que, de uma forma ou de outra, põem o caráter no escaninho do escambo.

Afinal cremos que o ministro Tóffoli não descura do que pretendeu quando se propôs à indicação para ministro do STF. Afinal, há muito demonstra sua vocação para vassalo. E como não leu Boetie regala-se até com café matinal.

Houvesse lido – e capacidade tivesse para interpretar textos – teria percebido que a fórmula para negar a escravidão elaborada por Boétie nele encontrou leitura diversa, para não dizer o contrário.

Que então dizer de sua presença legitimando um 'pacto' que não existe?

domingo, 2 de junho de 2019

Entre o credo, o anticredo e o mingau de café


Anticredo
Há um credo nos que oram governam (ou pensam que) o país: são os ‘abençoados’ e ‘ungidos’ que Deus destinou a salvar a pátria amada dos incréus. 

O texto de Cerqueira Leite veiculado no Conversa Afiada bem demonstra quão incréus somos nós outros.

Credo  I
Ao tempo em que as cinzas de Charles-Louis de Secondat, barão de La Brède e de Montesquieu (1689-1755) são sacudidas no túmulo em que sepultado, na  L'eglise Saint-Sulpice, em Paris, pela tormenta que atinge os pilares e fundamentos do seu clássico (O Espírito das Leis) nesta terra brasilis eis que o presidente deste STF humilhado passa a concordar com a humilhação e aplaude e se curva a quem o humilha.

Não se trata apenas de deslealdade para com o cargo e o compromisso ao qual jurou (defender a Constituição) mas de imoralidade, de indecência.

O absurdo institucional pode ser bem ilustrado a partir da observação de Eugênio Aragão:

O atual governo é chefiado por um cidadão que ganhou as eleições presidenciais na base da mentira, da agressão e da recusa de debater. Seus correligionários promoveram, ao longo de sua campanha, ataques virulentos ao Tribunal Superior Eleitoral, sua presidente e seus ministros. Colocaram sob suspeita a imparcialidade da Corte e sua capacidade de organizar um pleito sem fraudes. Depois, empossado Jair Bolsonaro, meteram-se – inclusive a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann – a pedir o fechamento do STF, a exigir o impedimento de seu presidente e, dentre outros, do ministro Gilmar Mendes. Acusaram-nos de corrupção, sem qualquer prova robusta e vilipendiaram a reputação do judiciário.”

Certamente “Esses tempos de pós-verdade são estranhos demais para alguém como eu, que tem orgulho de ter valores claros como a justiça, a lealdade, a decência e a fidelidade à Constituição e ao Estado Democrático de Direito que esta fundamenta.”


Credo II
E aqui ficamos – porque a utopia nunca morre – com o ‘credo’ do mesmo Eugênio Aragão:

Não há ‘papelão’ de magistrados que nos fará perder a fé nessa luta. E, como acreditamos no ser humano, acreditamos, também, que magistrados, que todos respeitamos e defendemos no seu papel constitucional, saberão pôr a mão na consciência e mudar de atitude. Para o bem do Brasil e de todas e todos nós!

Mingau de café
O governador da Bahia, Rui Costa, em entrevista concedida ao jornalista e escritor Fernando Morais, para o Nocaute (ou Conversa Afiada), relatando suas origens de menino pobre, lembrou do pirão de café como saída que a mãe encontrava para amainar a fome dos filhos: “[...] um alimento muito consumido por famílias pobres, que é basicamente misturar o café com farinha.”

A nós, pessoalmente, tocou-nos sobremodo a confissão. Afinal, também menino de família remediada, nos vimos em mais de uma oportunidade agraciado (ao lado das irmãs) por aquele manjar.

O nosso, no entanto, o era na forma de mingau, de tão ralo, para economizar a farinha de mandioca, também escassa em razão dos parcos e escassos recursos financeiros.

Hoje, na condição de professor universitário, sem qualquer reposição salarial há quatro anos e vendo o minguado vencimento raspado na beirada por aumento no desconto para a previdência estadual, estamos sem perceber remuneração dos meses de abril e maio em razão da greve deflagrada pela categoria para provocar conversa que nunca chega.

Não queremos entrar em detalhes outros, utilizados como argumento pelo governo estadual, tais como limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal etc. etc. Mesmo porque a pressão de delegados, escrivães, policiais em outro instante encontraram eco e mesmo o Tribunal de Contas já foi consultado e anuiu à pretensão do governo na oportunidade. 

Nem mesmo entraremos no lugar comum de que o governo poderia bem nos acalentar, com um argumento sensível: a redução dos gastos com publicidade de caráter propagandístico.

Mas, ao que parece, o PT no governo do estado começa a dar sinais de padecer de um dos males que acometeu o PT no governo federal: a ideia da eternidade do poder, imaginando-se reconhecido simplesmente pelo que faz materialmente. Pode estar abrindo caminho para um aventureiro que passe a dizer que “não concorda com nada do que aí está” e a eternidade dar com os burros n’água. Porque vingança de eleitor é guardada no freezer.

Deixando de lado este ponto crucial voltamos ao pirão, ou seja, ao mingau.

A coisa (suspensão de pagamento dos vencimentos condicionada ao retorno ao trabalho que nos faz lembrar de nada saudosa postura de ACM), levada ao divã, pelo andar da carruagem, nos remeteu a interpretar a postura do governador com os professores das universidades estaduais de certa forma sublimativa: Sua Excelência, que em tempos difíceis, se alimentou com pirão de café quer levar a categoria ao mingau de café, porque os recursos financeiros (ora suspensos) não dão para ‘farinha de caixão’ (como se dizia antigamente da farinha de qualidade inferior) que dizer para farinha de Buerarema de ‘seu’ Betinho, no Bairro de Fátima!
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Para não cansar o leitor deixamos para a PRÓXIMA SEMANA: 

O que tem a ver a pactuação do presidente do STF com Etienne La Boétie