domingo, 28 de junho de 2020

A boiada de interesses precisa de um boi de piranha

Aquele que se faz cavalgadura por convicção não falta quem sinta a hora apropriada para defenestrá-la do plantão. E as ruas enchem-se de esperança. Uma reedição de manifestações como ‘Diretas Já’ embala ‘sonhos de uma noite de verão’ tupiniquim. Basta o povo nas ruas e tudo estará resolvido. Assim, levemo-lo às praças e as portas se abrirão para a retomada do crescimento com distribuição de renda, redução das desigualdades, justiça social e respeito internacional.

Na esteira de esperanças que afloram em mentes tantas há quem afague a ideia de que o inquilino está prestes a sair. Basta o povo exigir.

Tudo belo, mas não vemos este sonho amparado na plenitude da discussão em torno do dia seguinte a partir do porquê acontecido.

Levantamos senões à tais especulações, porque vemos esperança vã em quem não percebe que a luz que o guiou ao Alvorada ainda não está satisfeita em suas ambições. Porque não vemos ‘como’ acontecer se os motivos que levaram a tudo que passamos ainda são ‘motivos’. Isto afirmamos porque a obra – iniciada em 2016 – não está concluída. Caso contrário será imaginar que todo o elaborado seria desprezado pacificamente e deixado de lado a sua plena realização depois de ‘tanto trabalho’.

Naturalmente, para corresponder aos interesses em jogo, a melhor solução ‘moral’ passaria por afastar o inquilino e elevar o vice Mourão ao estrelato. Afinal – nos quesitos elaborados por quem banca o jogo de interesses – lê na mesma cartilha: aquela referida no texto de domingo passado neste blog – a partir da obra de Manoel Domingos Neto comentada no GGN – qual seja integrar a parcela de militares que se subjugam a uma nação diversa sob o manto da defesa de qualquer coisa que àquela não seja conveniente.

Para os beneficiados – destituídos de qualquer resquício moral, a não o ser o que para eles o é, lucro acima de tudo, não importando o que seja feito para que tal se consume, tampouco o meio de que se valha – cada tropeço do inquilino e cada vexame, nada dizem se continua a efetivar o projeto gestado lá fora com apoio de parte da classe dominante local que explora aqui para gastar lá. Neste trilhar o que nele assusta é a possibilidade concreta de sua megalomaníaca vocação ao absolutismo monárquico levar à interrupção do butim.

Escrevemos o que ora escrevemos para estender além destas linhas a certeza de que muito do que há de esperança panfletada, anunciada, protestada não será consumada no atual estágio caso não se aplaine ou se ajuste àqueles interesses. Começando por um pacto que os mantenha, nos moldes da ‘transição democrática’ conhecida onde o mínimo alcançado resultou em anistia para crimes contra a humanidade.

Tanto isso se confunde com a verdade que a única coisa impossível de acontecer para essa gente é o retorno do PT ao governo aplicando políticas em benefício da sociedade.

Por fim – para coroar o projeto em andamento – uma anistia nas apurações legitimada pelo STF, que se resolve com a protelação de decisões e, em casos de ordem penal, aguardar a prescrição.

Mas, caro leitor, acabamos de registrar: STF. Aí – para nós – o principal nó górdio a ser desatado. Desate que passa por conformar sua composição aqueles interesses. E nesse viés o inquilino tem papel crucial que é indicar membros. Como o PT indicou e o fez em prejuízo próprio e do país  tanto que parcela de suas indicações o escorraçou do poder – o que vem por aí para integrar a Casa consistirá no aperfeiçoamento de interpretações que favoreçam aqueles interesses em todas as searas (privadas, administrativas e políticas).

Sustentamos nossa descrença, alicerçada na profunda desconfiança em relação às instituições desta terra brasilis, a partir do que lemos em textos oriundos de visão progressista. Um deles escancara o que há dias vem sendo sinalizado: uma trégua entre o inquilino e o STF. No contraponto, a grande imprensa (a serviço daqueles interesses) sinaliza a profecia imediata: teria o inquilino sido enquadrado pela prisão de Queiroz e outros, pelo STF. Nem falemos da postura altamente ‘conciliadora’ do Congresso se aproveitamos as declarações do Presidente da Câmara.

O pitbull ficou desdentado, porque enquanto dentes teve rosnou ameaçadoramente. E um de seus alvos favoritos justamente o STF. Que – muito brevemente – para o bem de todos os interesses e felicidade geral dos mesmos – terá a composição dos sonhos. Assim, dentes os tenha, mas não os exiba.

Caso alguém imagine alguma reação, esqueça. Editorial de O Globo – tradicional representante de interesses estranhos aos do país retrata – à perfeição – a realidade: "A prisão de Queiroz pode ter ajudado Bolsonaro a entender que prejudica a si mesmo tentar governar como se tivesse um impossível poder absoluto”.

Ou seja, o recado claro: o inquilino precisa se limitar/compreender que dele nada mais esperam que “tentar governar” dentro do sistema que lá o colocou e que disso não passa a sua ‘honrosa’ missão.

Eis a chave do nó górdio indesatável: o problema não é o inquilino e seu desastroso governo para o país, mas pôr em risco que tal não ocorra.

No mais nos resta, escriba de província que caiu na besteira de aprender a ler e interpretar – para não morrermos calado – vivenciar indignação suficiente a permanecer expressando a profunda tristeza que nos acomete diante da destruição do Brasil, fato que avança nos bastidores aceleradamente enquanto o inquilino do Alvorada vai ocupando sua função de boi de piranha para que a boiada dos ‘interesses’ seja salva.

Há quem enxergue diversamente. O tempo dirá quem tem razão.


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