Hora de ver
Perder uma partida de futebol não é nenhum Armajedon. Para civilizados.
Nesta terra de São Saruê, no entanto, a coisa beira o irracional. Diríamos
melhor, observando os que estão no divã: a sublimação contida no ‘torcer’ escancara a
dependência por que vivemos em grau de avanço civilizatório.
O resultado Brasil fora da final da Copa (só a ‘final’ lhe serve) constrange
o apaixonado. Mas não o mais observador. Afinal, perder a seleção para a
Bélgica é fato mais importante que a nação perder a soberania, o petróleo e a
Petrobras, a Eletrobras, a Embraer, o emprego, os direitos sociais, a renda
etc.?
Mais provável que a seleção na Copa represente o que de mais perfeito ocorre no
Brasil deste instante: o sonho desfeito.
Da mesma forma que milhões sonharam com um país melhor vivido em pouco
mais de uma década, mais respeitado e ouvido no concerto das nações, que tinha
por meta extinguir – ou reduzir ao limite tolerável estatisticamente – a miséria,
a fome, a doença etc. etc. viu tudo ir por água abaixo sob o cutelo de armações
montadas para destruir o sonho. Da mesma forma e maneira que o brasileiro torcedor
sonhava como uma vitória final.
Tudo virou pesadelo. Com uma diferença: no futebol a oportunidade se
renova em quatro anos; quanto ao país – caso mudem o ninho dirigente em nível
de projeto – felizes seremos se em quatro décadas.
Nossa expectativa reside, neste imediato, em conferir se a derrota de
uma seleção nacional de futebol (perdemos para a Rússia na Liga das Nações no
Voleibol no dia seguinte ao 2x1 por 3x0) levará o povo a perceber que está sendo
ludibriado, que as riquezas pátrias estão sendo entregues, que o gás de cozinha
e a gasolina continuam subindo, que os banqueiros ganham cada vez mais dinheiro
retirando-o de nossos minguados (cada vez mais) bolsos, que a gente que vestia
amarelo pedindo o impeachment é a mesma que está nas arquibancadas da Rússia.
E nem falemos no campo político-judicial, porque os mesmos que ganham
nas costas do futebol (enaltecidos pela Globo e quejandos) hoje impedem um
candidato do povo de ser votado.
Em muito do que vemos – na metáfora em que pomos uma coisa e outra – o campo
de futebol se assemelha ao campo jurídico/político. Por lá deixaram de marcar pênaltes
a nosso favor (e até mesmo desmarcaram um assinalado), desrespeitando as regras
– dirão os desconsolados com a seleção.
Mas, no campo político também as regras
deveriam ser respeitadas. No entanto, contra elas, uniram-se políticos, judiciário
(estes no instante em que passaram a formar um time devidamente organizado para
destruir o jogo), a ponto deste time judicial assumir o comando não para aplicar
a lei e fazer justiça mas para escolher quem pode ou não disputar uma eleição,
a ponto de prender um deles, ainda que não haja provas de prática criminosa
além daquelas supostamente tidas como possíveis de haver ocorrido sob o crivo do "eu acho" e – o pior –
se nega a apreciar seus recursos.
Haveria, pelo que aparenta, um certo medo do time da toga de levar um
cartão vermelho elegendo o jogador expulso?
É bem possível... bem possível!
Hora de entender
A
derrota da equipe brasileira para a Bélgica deveria, em vez de entristecer,
levar ao lugar comum de que no futebol (como em qualquer outro esporte de
competição) vence quem jogou melhor. Seja-o por haver cometido menos erros ou
mesmo porque teve mais sorte.
A Bélgica nunca foi um país de expressão maior na
Europa. Sofreu sempre com as guerras, pagando com danos econômicos e humanos dentro
de sua própria casa. Ainda assim seu povo a reconstruiu tantas vezes quanto
preciso e, o mais importante, conquistou um padrão de vida decente onde –
diferentemente daqui – educação e distribuição de renda são a tônica. Por lá o PIB não ultrapassa o vigésimo sexto em nível mundial, enquanto o nosso ainda está no nono (e já fomos sétimo).
O
noticiário esportivo não cuida dessas ilações. Caso contrário faria observar ao
torcedor que o abismo social por nós vivido há décadas e aprofundado nestes dois últimos
anos não está vinculado ao tamanho da economia do Brasil e sim à doentia
postura de uma gente governante (aplaudida por alguns jogadores, jornalistas, comentaristas,
empresários, políticos etc) que tende a eternizar as diferenças avassaladoras
entre pobres e ricos.
Sob
esse aspecto, no instante em que a realidade social do país ensaiou parecer com
a de nosso adversário (lembra o leitor do país imaginário Belíndia, que por aqui inventaram para
justificar a distante diferença na distribuição de renda entre a Bélgica e a
Índia), aqueles juízes ocuparam o gramado para lançar às calendas as conquistas
sociais e a Constituição e relançaram como ‘salvação’ o precipício que separa o
time de toga da maioria do povo.
Daí
porque, tenha a certeza o caro leitor, que aquilo que Darcy Ribeiro denominou
de “civilização brasileira” já chegou na Rússia derrotada pela Copa Indecorosa
promovida pelo golpe de 2016.
Por
lá desembarcamos carregando a desmoralização de dirigentes, a roubalheira
impune, o desemprego, trabalho assemelhado à escravidão para muitos, a violência
policial, a fome que volta a nos acometer, a transferência e desnacionalização
das riquezas pátrias, um programa concebido criminosamente para destruir os
sistemas públicos, que vão da educação à previdência, passando pela saúde e a pesquisa.
O Congo
Belga foi possessão belga na África, onde atrocidades praticadas enriqueceram
aquele país, devolvendo miséria, atrocidades e desumanidade.
Pelo andar
da carruagem o jogo perdido em campo pela Seleção de Futebol será vencido pelo plantão governamental,
substituindo-nos por aquele Congo de nefanda lembrança.
E não
custa antever: não haverá surpresa quando um tsunami destruir os Palácios (de Governos
ou de Tribunais), ora unidos para expurgar a população nativa de alcançar uma
vida decente, honesta e produtiva.
É como a Bélgica nos faz ver com o seu futebol vitorioso.
Vexames como legado
Nada boa a imagem do Brasil deixada por uma parcela de nativos fazendo
turismo na Rússia da Copa do Mundo.
Grosseria, ausência de educação e falta de respeito aos princípios que
norteiam a convivência entre povos civilizados.
Perdemos a Copa, mas superamos em constrangimento
A seleção de Danusa
As arquibancadas exibidas pela televisão, em jogos da seleção
brasileira, mostravam uma contradição: em campo, alguns negros; nas
arquibancadas, nenhum!
Lembrando comentário de Danusa Leão na rede no período Lula: tornou-se
chato ir a Nova York. Chega lá e encontra o síndico do condomínio.
A Copa solucionou a la Danusa. E, mais ainda: na cor da pele.
O maior vexame
Este não sairá na mídia além de vírgulas em noticiários: o Governo
Brasileiro foi condenado pelo Conselho Interamericano de Direitos Humanos da OEA por
não apurar os fatos que levaram Vladimir Herzog à morte nos porões da repressão
durante a ditadura.
Reconhecendo – pela primeira vez – um crime da ditadura como um ato contra
a humanidade (o que faz do crime imprescritível) a OEA condena o Brasil.
No entanto, mais recai a condenação sobre quem legitimou a barbárie: o
STF.
Trata-se daquele ‘suicídio’ de Vladimir Herzog nos porões da Operação
Bandeirantes/DOI-CODI paulista.
No caso Herzog o STF pisara na bola. Como voltou a fazê-lo nas decisões
que legitimaram o impeachment sem crime.
Mas como desgraça pouca é virtude para parte dessa gente aí estão
muitos membros em campanha descaradamente aberta – para o bom entendedor – para
evitar candidatura de Lula.
No passado o STF andou legitimando ditaduras. Hoje, pretende exercê-la
em plenitude. Um país dirigido por Suas Excelências, em nível de cúpula e com
os magistrados que o aplaude servindo de inspetores de quarteirão.
Não esqueçamos de que – como toda regra – há exceções.
Que o digam os fatos rocambolescos em Curitiba em desrespeito a uma determinação judicial. Que serão analisados pela ONU.
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