domingo, 8 de julho de 2018

Vexames em dois toques e seus legados


Hora de ver
Perder uma partida de futebol não é nenhum Armajedon. Para civilizados. Nesta terra de São Saruê, no entanto, a coisa beira o irracional. Diríamos melhor, observando os que estão no divã: a sublimação contida no ‘torcer’ escancara a dependência por que vivemos em grau de avanço civilizatório.

O resultado Brasil fora da final da Copa (só a ‘final’ lhe serve) constrange o apaixonado. Mas não o mais observador. Afinal, perder a seleção para a Bélgica é fato mais importante que a nação perder a soberania, o petróleo e a Petrobras, a Eletrobras, a Embraer, o emprego, os direitos sociais, a renda etc.?

Mais provável que a seleção na Copa represente o que de mais perfeito ocorre no Brasil deste instante: o sonho desfeito.

Da mesma forma que milhões sonharam com um país melhor vivido em pouco mais de uma década, mais respeitado e ouvido no concerto das nações, que tinha por meta extinguir – ou reduzir ao limite tolerável estatisticamente – a miséria, a fome, a doença etc. etc. viu tudo ir por água abaixo sob o cutelo de armações montadas para destruir o sonho. Da mesma forma e maneira que o brasileiro torcedor sonhava como uma vitória final.

Tudo virou pesadelo. Com uma diferença: no futebol a oportunidade se renova em quatro anos; quanto ao país – caso mudem o ninho dirigente em nível de projeto – felizes seremos se em quatro décadas.

Nossa expectativa reside, neste imediato, em conferir se a derrota de uma seleção nacional de futebol (perdemos para a Rússia na Liga das Nações no Voleibol no dia seguinte ao 2x1 por 3x0) levará o povo a perceber que está sendo ludibriado, que as riquezas pátrias estão sendo entregues, que o gás de cozinha e a gasolina continuam subindo, que os banqueiros ganham cada vez mais dinheiro retirando-o de nossos minguados (cada vez mais) bolsos, que a gente que vestia amarelo pedindo o impeachment é a mesma que está nas arquibancadas da Rússia.

E nem falemos no campo político-judicial, porque os mesmos que ganham nas costas do futebol (enaltecidos pela Globo e quejandos) hoje impedem um candidato do povo de ser votado.

Em muito do que vemos – na metáfora em que pomos uma coisa e outra – o campo de futebol se assemelha ao campo jurídico/político. Por lá deixaram de marcar pênaltes a nosso favor (e até mesmo desmarcaram um assinalado), desrespeitando as regras – dirão os desconsolados com a seleção. 

Mas, no campo político também as regras deveriam ser respeitadas. No entanto, contra elas, uniram-se políticos, judiciário (estes no instante em que passaram a formar um time devidamente organizado para destruir o jogo), a ponto deste time judicial assumir o comando não para aplicar a lei e fazer justiça mas para escolher quem pode ou não disputar uma eleição, a ponto de prender um deles, ainda que não haja provas de prática criminosa além daquelas supostamente tidas como possíveis de haver ocorrido sob o crivo do "eu acho" e – o pior – se nega a apreciar seus recursos.

Haveria, pelo que aparenta, um certo medo do time da toga de levar um cartão vermelho elegendo o jogador expulso?

É bem possível... bem possível!

Hora de entender
A derrota da equipe brasileira para a Bélgica deveria, em vez de entristecer, levar ao lugar comum de que no futebol (como em qualquer outro esporte de competição) vence quem jogou melhor. Seja-o por haver cometido menos erros ou mesmo porque teve mais sorte. 

A Bélgica nunca foi um país de expressão maior na Europa. Sofreu sempre com as guerras, pagando com danos econômicos e humanos dentro de sua própria casa. Ainda assim seu povo a reconstruiu tantas vezes quanto preciso e, o mais importante, conquistou um padrão de vida decente onde – diferentemente daqui – educação e distribuição de renda são a tônica. Por lá o PIB não ultrapassa o vigésimo sexto em nível mundial, enquanto o nosso ainda está no nono (e já fomos sétimo).

O noticiário esportivo não cuida dessas ilações. Caso contrário faria observar ao torcedor que o abismo social por nós vivido há décadas e aprofundado nestes dois últimos anos não está vinculado ao tamanho da economia do Brasil e sim à doentia postura de uma gente governante (aplaudida por alguns jogadores, jornalistas, comentaristas, empresários, políticos etc) que tende a eternizar as diferenças avassaladoras entre pobres e ricos. 

Sob esse aspecto, no instante em que a realidade social do país ensaiou parecer com a de nosso adversário (lembra o leitor do país imaginário Belíndia, que por aqui inventaram para justificar a distante diferença na distribuição de renda entre a Bélgica e a Índia), aqueles juízes ocuparam o gramado para lançar às calendas as conquistas sociais e a Constituição e relançaram como ‘salvação’ o precipício que separa o time de toga da maioria do povo.

Daí porque, tenha a certeza o caro leitor, que aquilo que Darcy Ribeiro denominou de “civilização brasileira” já chegou na Rússia derrotada pela Copa Indecorosa promovida pelo golpe de 2016.

Por lá desembarcamos carregando a desmoralização de dirigentes, a roubalheira impune, o desemprego, trabalho assemelhado à escravidão para muitos, a violência policial, a fome que volta a nos acometer, a transferência e desnacionalização das riquezas pátrias, um programa concebido criminosamente para destruir os sistemas públicos, que vão da educação à previdência, passando pela saúde e a pesquisa.

O Congo Belga foi possessão belga na África, onde atrocidades praticadas enriqueceram aquele país, devolvendo miséria, atrocidades e desumanidade.

Pelo andar da carruagem o jogo perdido em campo pela Seleção de Futebol será vencido pelo plantão governamental, substituindo-nos por aquele Congo de nefanda lembrança.

E não custa antever: não haverá surpresa quando um tsunami destruir os Palácios (de Governos ou de Tribunais), ora unidos para expurgar a população nativa de alcançar uma vida decente, honesta e produtiva. 

É como a Bélgica nos faz ver com o seu futebol vitorioso.

Vexames como legado
Nada boa a imagem do Brasil deixada por uma parcela de nativos fazendo turismo na Rússia da Copa do Mundo.

Grosseria, ausência de educação e falta de respeito aos princípios que norteiam a convivência entre povos civilizados.

Perdemos a Copa, mas superamos em constrangimento

A seleção de Danusa
As arquibancadas exibidas pela televisão, em jogos da seleção brasileira, mostravam uma contradição: em campo, alguns negros; nas arquibancadas, nenhum!

Lembrando comentário de Danusa Leão na rede no período Lula: tornou-se chato ir a Nova York. Chega lá e encontra o síndico do condomínio.

A Copa solucionou a la Danusa. E, mais ainda: na cor da pele.

O maior vexame
Este não sairá na mídia além de vírgulas em noticiários: o Governo Brasileiro foi condenado pelo Conselho Interamericano de Direitos Humanos da OEA por não apurar os fatos que levaram Vladimir Herzog à morte nos porões da repressão durante a ditadura.

Reconhecendo  pela primeira vez – um crime da ditadura como um ato contra a humanidade (o que faz do crime imprescritível) a OEA condena o Brasil.

No entanto, mais recai a condenação sobre quem legitimou a barbárie: o STF.

Trata-se daquele ‘suicídio’ de Vladimir Herzog nos porões da Operação Bandeirantes/DOI-CODI paulista.

No caso Herzog o STF pisara na bola. Como voltou a fazê-lo nas decisões que legitimaram o impeachment sem crime.

Mas como desgraça pouca é virtude para parte dessa gente aí estão muitos membros em campanha descaradamente aberta – para o bom entendedor – para evitar candidatura de Lula.

No passado o STF andou legitimando ditaduras. Hoje, pretende exercê-la em plenitude. Um país dirigido por Suas Excelências, em nível de cúpula e com os magistrados que o aplaude servindo de inspetores de quarteirão.

Não esqueçamos de que – como toda regra – há exceções.

Que o digam os fatos rocambolescos em Curitiba em desrespeito a uma determinação judicial. Que serão analisados pela ONU.

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