domingo, 21 de abril de 2019

Feitiço contra o feiticeiro

"Com Supremo e tudo"
O caos em que nos tornamos nunca foi imaginado na dimensão em que está quando posto em andamento, no imediato da ação político-judiciária para afastar a presidente Dilma Rousseff. Imaginaram – “com Supremo e tudo” – que ‘expulsar’ o PT do comando do país e traçar sua inviabilização político-eleitoral para 2018 atenderia plenamente aos reclamos da classe dominante (de roldão a pequeno-burguesia encastelada na classe média) e lhes asseguraria o que entendiam negado pelos governos petistas e suas políticas públicas de redução das desigualdades.

Tudo tão simples assim.

E aqueles que encabeçaram o processo lá estavam, desde a reeleição de 2014 – dizendo defender a Democracia – proclamando a não-aceitação do resultado eleitoral e anunciando sua atuação político-congressual voltada para “sangrar”.

Em tudo o papel exponencial do STF. Tudo aconteceu “com Supremo e tudo” (expressão de famoso diálogo entre o então senador Romero Jucá e Sérgio Machado) e porque o quis o STF, que não perdeu a oportunidade e mesmo dela se aproveitou para garantir uns garangaus de aumento para a corporação judiciária.

Por desdobramento aí está o busílis da questão.

Para que tal acontecesse o STF feriu de morte os pilares que lhe cabiam defender como instituição: da formalidade à materialidade jurídicas. 

Formalmente aceitou (por omissão) que a discussão da constitucionalidade do procedimento de impeachment (destituído de causa) fosse adiante e delegou (em novas e reiteradas omissões e fugas) que tudo viesse a se consumar. Materialmente deixou de reconhecer o que a lei previa: inexistência de crime de responsabilidade.

Resultado: em meio ao caos que precisou instituir a partir de si mesmo (iniciando uma verdadeira implosão em relação a sua credibilidade e confiança, refletidos na segurança jurídica) abriu a Caixa de Pandora e tudo aconteceu.

Hoje, também vítima dos males por ele liberados, tenta 'soluções' nos limites individuais de seu ‘poder’ e passa a ser criticado pelos mesmos aos quais beneficiou. Justamente por cometer – por ação – o que lhe cabe defender (liberdade de expressão) – o que admitiu, por omissão.

Não entramos aqui na análise dos fundamentos críticos em relação ao STF por aquilo que estão seus membros a praticar. Mas, diante de tudo que aconteceu nesses dois anos de efeito secular, o que está em jogo não é apenas o posto em discussão mas o próprio Poder Judiciário balançando na corda bamba no picadeiro do circo que ajudou a armar.

Considerando que seja este o aspecto preponderante (e os fatos o demonstram) como Poder da República na berlinda a coisa é muito mais grave do que possa imaginar a vã filosofia.

E o é, tenham certeza. 

Porque poucos estão folheando o livro certo, nestes tempos bicudos em que o maniqueísmo é a tônica entre eu (o que penso e o que acho) e o outro (o que ele pensa e que sou contra), no instante em que o diálogo e a conversa perderam espaço na mesa e não mais se faz olhando nos olhos.

Enrascada
A credibilidade do STF mais despencará, sob o condão dos meios que o levaram à condição de paladino quando se omitia em apreciar o que poderia beneficiar Lula e o PT.

Escolhera esse caminho, porque suas excelências (em maioria) adoram estar na telinha, serem atores do Jornal Nacional e quejandos. E, também o demonstraram/confessaram, adoram uma pressão das ruas no formato veiculado ao contento da mídia.

O STF está sob fuzilaria. A ponto de haver quem deseje vê-lo substituído por um tribunal militar.

A enrascada em que se meteu o STF quando preferiu fazer política eleitoral em detrimento de defender a Constituição nos lembra uma lição de Tormeza: quem não sabe rezar xinga a Deus. 

Considerando que saibam rezar, passaram a precisar de exorcismos.

No mais, a considerar a pauta do STF sob ‘vigilância’, resta saber se suas excelências honrarão as calças. A generalidade de gênero aqui se impõe, porque tem muita mulher por aí com postura muito mais macha que a de alguns machos que por lá estão.

Hoje o STF é atacado pelas mesmas forças que o elogiavam quando a serviço delas. De certa forma, feitiço contra o feiticeiro.

Invisível x visível
Em jogo uma realidade que atormenta qualquer humanista/democrata: os tradicionais meios de controle da informação visíveis (aqueles aludidos como detentores da ‘mensagem’ por serem o meio, para não esquecer McLuhan, tipo rádio, televisão, jornais e revistas), perderam o controle para a internet/rede, invisível quando o quer e lhe é conveniente.

Dados
O governo alardeia como méritos de seus 100 dias a redução de homicídios no país.

Esqueceu de falar do aumento da mortalidade pelas polícias e militares fazendo a vez delas: de 4.222, em 2016, para 6.160, em 2018.

Tudo acrescido de um detalhe: o número de policiais assassinados foi reduzido no período analisado: de 453 para 307 no mesmo período.

Simbólico
Nobilíssima expressão da classe dominante brasileira, que vive no exterior com o dinheiro que ganha aqui, ocupou manchetes pela doação de 88 milhões de reais para recuperar Notre Dame.

Não enveredaremos por não haver lembrado a ilustre benemérita de haitianos e moçambicanos (apenas para ilustrar) e dos milhões de crianças morrendo de fome diariamente por faltar-lhes uns míseros dólares.

Registramos o fato por entendermos que fez melhor que simplesmente investir em Miami.

Como o faz a maioria dos endinheirados daqui.


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