domingo, 4 de abril de 2021

Mais um para o realismo brasileiro “Por quem os sinos dobrarão”

 

Poderíamos finalizar o presente dominical com um “quem foi Naninha”, não fora minimizar o que vemos como apropriação de princípios que fizeram respeitada uma instituição por quem a nega.

Muito ouvimos em tempos idos, de aprendizado das coisas deste mundo, que somente havia quatro perfeições em organização e hierarquia: a militar, o partido comunista, a maçonaria e a igreja católica.

No particular da Maçonaria sempre ouvimos dizer que esteve presente, de forma decisiva, nos grandes momentos do país, influenciando com seus ensinamentos a conformação do Brasil independente, da República e por aí vai. De que nenhum ato de mudança institucional ocorrera sem que discutida entre as colunas dos templos onde presente a organização dos pedreiros livres.

E assim se manteve em nosso imaginário, porque os outros  de certa forma  claudicaram em algum instante.

Quando sonhava idealisticamente com a carreira militar (sonho de infância) nos vimos atropelado pelo golpe de 1964; na esteira do lamentável momento histórico o Partido Comunista se dividia, a Igreja Católica se preparava para abandonar uma sequência de lições que a fizeram migrar dos altares para rezar o Evangelho com o povo e em meio ao povo (Rerum Novarum, Quadragesimo Anno, Mater et Magister, Pacem in Terris), e já na década seguinte retornava às antigas práticas.

Restava a Maçonaria se nos apresentando, com seus ‘famosos’ segredos, como a mãe do pensamento filosófico que deveria nortear os homens como o fizera na Revolução Francesa.


De lá para cá, transcorrido pouco mais de 50 anos das observações que orientavam a puberdade nos debruçamos com uma manchete circulando na rede: Entidade da maçonaria convoca atos pró-golpe e pede ‘apoio incondicional’ a Bolsonaro”

O último refúgio da adolescência foi ao chão. Não porque maçons sejam unidade de prática do que prega a filosofia que defendem. Mas porque quem teria motivado uma revolução Francesa caberia defender tudo que negue absolutismo em sua pior manifestação: ditadura.

Não sabemos se essa tal Associação Nacional Maçônica do Brasil (Anmb) representa realmente o pensamento maçon pátrio. Se não representa e não houver contraponto ficará como verdade para o leigo a absurda manifestação.

Tímpanos e neurônios incomodam-se: aqueles que aprendemos a ver como paladinos da fraternidade, da liberdade e da igualdade estariam a defender a negação de todo o defendido.

Nenhum momento mais infeliz e inconveniente para tal proclamação. Afinal, não nos tornamos paradigma de grandeza humana, mas em mesquinhez. Naquele dia de convocação (30 de março) 3.780 sucumbiram sob a foice do Covd-19 e passamos a vencer a corrida para saber quem mata mais; no restante do mundo, em outros dez países (França, Espanha, Alemanha etc., onde  EUA, liderando com 563 óbitos), a soma de todos  eles não nos alcançava: 3.662.

Isto o que nos deixa pasmo: quem defende fraternidade, liberdade e igualdade desejando que tudo permaneça.

Na nota divulgada a entidade “vem externar apoio incondicional às Forças Armadas, na pessoa de seu comandante-geral”, nada mais nada menos que o inquilino do Alvorada, que foi reformado/aposentado aos 33 anos de idade por prática de ato terrorista contra o Estado e a Democracia, quando ameaçou explodir a adutora do Guandu no Rio de Janeiro, em 1986. Para quem defende e aprecia a coisa, esta coluna entende o “apoio incondicional”, até porque sendo o inquilino um vocacionado ao terrorismo no imediato do golpe dentro do golpe, em 1968, Burnier programou explodir o gasômetro do Rio, lançar a culpa sobre os comunistas e sequestrar políticos e clérigos e matá-los, fato que não se consumou graças à reação e à postura de Sérgio Macaco.

Tudo a ver. Quando dizemos que o inquilino não se fez sozinho fatos como o presente o confirmam. Comemorar o 31 de março, que originou tamanhos absurdos, é comemorar a tortura nos porões, o assassinato de adversários. O próprio General Geisel, em seu livro de memórias, afirma ser o inquilino um ‘mau militar’. Assim não pensam os que subscrevem a convocação.

Joaquim Nabuco afirmou em seu tempo que o grande problema não dizia respeito à extinção da escravatura no Brasil mas a extinção de sua obra na formação da sociedade brasileira.

Registrado no prefácio de O Abolicionismo  dos idos do abril de 1863   a necessidade de “arrependimento dos descendentes de senhores” de escravos como elemento de humanização da sociedade brasileira em formação, que vivia, para Nabuco, um país “ultrajado e humilhado”.

O pífio das manifestações, caso as tomemos em decorrência da convocação maçônica (?!!!) não afasta a surpresa. Os que a subscrevem em pensamento ainda não se arrependeram dos males causados ao país. Escondem na covardia o pensamento escravocrata e suas consequências no curso da história pátria, justamente no biombo que a tudo isso nega. Em meio a uma pandemia que ceifa milhares diariamente a defesa em nome da Maçonaria de um golpe militar que torturou e matou nos porões e fora deles nos remete a parodiar Hemingway: Por quem os sinos dobrarão.

Certamente este romance tupiniquim não continuará escrito tão somente pelos mortos; também pelos coveiros mortos-vivos que maculam a filosofia das instituições que os abriga, subscrevendo em seu nome o inominável.


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