domingo, 27 de dezembro de 2020

De desumanidades, Natal e Aquários

 Contadas apenas as mortes anotadas, as que atendem às estatísticas. Onde o homem/ser apenas dado expresso em unidade aritmética. 

O Covid-19 já nos levou quase duas centenas de milhares, oficialmente; extraoficialmente superando pelo menos 230 mil.

Mas, como cerca de oito milhões foram por ele alcançados e ‘apenas’ duas míseras centenas de milhares (os registrados)  e mais três dezenas  foram a óbito as ‘estatísticas’ soam promissores.

Uma festa tantos curados!

Não, caro e paciente leitor. No plano de desumanidades há quem a tudo comemore. A autoestima não pode sucumbir à realidade  alardeiam!

Em meio a tudo, o Natal. Particularmente não gostamos do que é feito em nome dele. Ou, simplesmente como professado por este mundo consumista.

O Natal que nos comove está nas lapinhas de Vó Tormeza, de minha mãe Adelaide e de minha irmã Eva Lima, do Comendador João Alves de Oliveira e de Francisquinha de Roque Borges (em Itororó), ou aquelas todas nos rincões deste Nordeste sofrido expressando a esperança muda de dias melhores e de mais compreensão, lembrança do Menino que nasce para renovar os homens desde mundo. Há dois mil anos sem ser escutado.

Dizemos o que dele sentimos em crônica publicada em livro pela Editora Via Litterarum e disponibilizada na rede (GGN).

Lá registramos: 

"Afinal, quando despenca a distribuição da riqueza, quando o desemprego se aprofunda, a senilidade do Papai Noel se acentua e torna-o mais seletivo, conduzindo o trenó somente para endereços de quem disponha de castelos com reluzentes luminárias que lhe sirvam de farol em noite de tempestade". 

Também não esqueçamos da matança atribuída à determinação de Herodes. 

E não custa nos inspirarmos em Marcos (10, 14-15): “Deixai vir a mim as criancinhas. O que fizerdes a qualquer delas é a mim que o fareis!” 

Outros tempos, outros Natais, outros Herodes. E a matança continua. Uma matança cotidiana em espaços que o Natal não alcança.

E nesta última postagem de 2020 fazemos acrescer ao final o que os versos permitiram expressar do grosso sentimento.

De alvissareiro a chegada da Era de Aquários. Não custa rever Hair, de Milos Forman. Pelo menos pelo tema de abertura. A conjunção não de “Júpiter com Marte”, mas esta que se escancara para o planeta: Júpiter e Saturno. 


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Periferia

 

O corpo padece e não mais sente

Atingido pelo disparo, nada raro, inerte

 

Inertes todos à volta

indiferentes

 Outra vida, apenas!

 

Uma lágrima escorre face abaixo

lágrima de morto

           

Na calçada a criança chora

não entende

mas padece

e sente

 

Outra lágrima lhe escorre

também negra

 

 

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Século XXI

 

No presépio de então

a infância tenra

o armava como tradição

Avenidas e ruas de papelão

da fonte correndo água

lantejoulas cintilando

no céu de seda em amplidão

A manjedoura refletia

da penúria exibida

o sorriso da Redenção

Os magos reis

caminhando

 um pouco a cada dia

Tudo no mais ali

completava

a devoção

 

Não mais a lapinha de antão

nada da tenra infância

e da devota tradição

 

Na manjedoura não há penúria

tão só exibição em fúria

de hodierna ostentação




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