domingo, 15 de maio de 2022

Tarefa ingrata

 

“É vital o historiador lutar contra a mentira. O historiador não pode inventar nada, e sim revelar o passado que controla o presente às ocultas”. Eric Hobsbawn (1917-2012).

Não precisamos viajar no tempo no viés do corte de Stanley Kubrick (1928-1999) em “2001: uma odisseia no espaço”. Projetemos nosso instante para daqui a um ou dois séculos. Brasil em particular.

Nas tabuinhas de argila chegaram os fatos registrados que traduzem a história dos Sumérios. Não dispomos de meios para afirmar em torno da ‘verdade’ das fontes que vicejaram no Crescente Fértil, mas muito do escrito tem sido confirmado através da Arqueologia. Mas, o que deles sabemos decorre do escrito há 5.000 anos.

Muito diferente daqueles idos, a história que será escrita em futuro não tão distante, pautada o será em estudos acadêmicos, cinema, áudio, vídeo e publicações veiculadas na imprensa contemporânea, materializada a partir do quanto efetivado nesta segunda década do século XXI.

Observando esse fato (o veiculado no presente) poderá o leitor dimensionar a ‘verdade’ levada à História.

Neste quesito o veiculado na imprensa, o que inclui tudo que dela tenha se originado  teremos no Brasil a “verdade” com muito pouco de Verdade. Como a “verdade” que se nos apresenta como história desta terra. A ‘verdade’ que esconde a Verdade. Porque nunca revela o passado que controlou o presente de antanho e o que vivemos. Isso porque muito (ou quase tudo) do veiculado corresponde a uma concentração textual que defende os interesses de uma diminuta parcela da sociedade, que disso se beneficia e para isso a remunera.

Por acaso há quem escreva a Verdade de que o povo deste país continua servido como prato de valia menor na bandeja que chega à mesa da classe dominante expressa em suas distintas castas?

Ao contrário, os crimes cometidos sob a chancela do teorismo econômico a serviço de alguns grupos (prevalente o financeiro) são elevados ao altar do mercado como dogma de fé sabujado pelos meios de comunicação, o povo como cordeiro permanentemente imolado, massificando no desgraçado e vilipendiado com tais políticas como se tudo fosse não só necessário, mas imperativo para que surjam ‘dias melhores’. Que o sacrifício permaneça porque a esperança está logo ali, no próximo programa econômico quando o último não deu certo, não correspondeu ao prometido.

Caro e paciente leitor, como traduzir o atual estágio econômico para este povo sofrido que disputa moedas aqui e ali para ir ao açougue comprar osso (em Itabuna) a 5,00 reais o quilo? Não mais a carne de pescoço, mas osso pura e simplesmente.

Caro e paciente leitor, como justificar que um país autossuficiente em petróleo, extraindo-o do fundo do mar com tecnologia desenvolvida por nós (Petrobras) a custos primários que variam entre 8 e 14 dólares fixe sua política de preços como se importado o fora do Oriente Médio sob preço cartelizado e vinculado aos interesses das petroleiras privadas? Como entender que a imprensa tudo justifique como natural quando a política de preços está sob controle do governo brasileiro, que se põe a serviço do acionista privado como se fora ele o investidor da tecnologia que desenvolvemos?

Caro e paciente leitor, como entender normal a entrega a preço de banana do patrimônio brasileiro, como a privatização da TAG S.A. (R$ 36 bi), construído ao custo do labor e suor do brasileiro comum e venha o governo que dele se desfez a alugar do comprador a utilização do que era seu passando a pagar anualmente 3 bilhões?

Eis a Verdade omitida. Um país aos frangalhos, com poderes se engalfinhando em defesa de si mesmos e muito pouco do que representam como instituições de Estado. Instituições que não se respeitam quando negam valia ao processo histórico-democrático.

Por presunção não temos como perceber razões de alegria, de esperança, de expectativa qualquer que seja quando o país é administrado não em favor de sua gente, de sua população, mas para servir aos que o exploram historicamente.

A fragilidade deste triste país é tal que não se vislumbra qualquer esperança de senti-lo como nação. País que mais e mais se amesquinha acreditando nas ‘verdades’ escritas, com seu povo aprendendo com a mentira diuturna.

E mais fraco se torna quando nem mesmo a decantada democracia que o norteia, mais e mais fragilizada, assiste o noticiário de cada dia insinuando a necessidade de reconhecimento de um poder moderador. Nos moldes daquele imposto pelo Pedro português ao Brasil, em 1824, através do qual ele mesmo, imperador, se tornava a última palavra. A mais pura expressão de absolutismo monárquico que a França lançara às calendas trinta e cinco anos antes.

Na ausência de uma linhagem real autêntica, não bastasse o ensaio de ‘nobres’ que sonham em sê-lo de plantão, eis que as forças armadas (através de parcela de seus arautos do caos) anunciadas como o legítimo poder moderador.

Para exercê-lo  à mingua de um reino ou império  até mesmo ditadura serve.

E tudo se apresenta sob o acovardado dos que registram o instante, omissos como o são diante do esgarçamento social e da desigualdade mais e mais aprofundada nestes últimos tempos...

Certamente será  com olhar que lhes chegue da atualidade  muito ingrata a tarefa dos historiadores de escreverem o país no futuro a partir do que dizem dele no presente!

Gostaríamos que a escrita de hoje, que registrará a história amanhã, fosse compreendida sob o viés da Verdade, porque quem a escreve está fazendo história.

Para tanto, nada mais compreender que é vital também o jornalismo lutar contra a mentira

 

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