domingo, 8 de maio de 2022

Síndrome de elefantes em busca do horizonte

 

Trazemos ao terreiro da pessoalidade tanto do que por aí há de gente, de sonhos, de pesadelos. Quando visitamos contemporâneos na idade percebemos que, de certa forma, há em nós uma unidade de conclusões em torno da vida, de vocação a destinos muitos não ansiados e impostos como missão definitiva e inexorável.

Estivemos com um destes anjos lançados à Terra, também escritor, caráter singular. Acolheu-nos com carinho e gentileza como se diante de membro da realeza britânica. E nos disse que partia para Minas, passar uns tempos. – "Minas não há mais", caríssimo  já o dizia Carlos Drummond de Andrade. Mas, pelo menos  para ele, confessou  longe estaria durante o tempo em que lá permanecer daquilo que o leva a fugar desta Bahia de todos nós.

Tergiversamos em torno de muita coisa, como aproveitando o tempo que nos restava ali ou  a bem da verdade  o que efetivamente nos reste, enquanto permitido. 

Deixei-o tardezinha, com saudade de um papo de corpo presente enquanto pelas Gerais estiver, até porque não desenvolvemos virtudes como a telepatia ou a telecinesia para levar o prosear sob a égide da cevada ou do malte.

Chegando em casa folheei alguns textos de variadas obras suas buscando razões para deixar o centro de sua razão de escrever. Nada que nos convencesse, tanto o orgulho e a vaidade registrada.

Olhando em volta deixamos de lado as nuvens e pisando no chão rochoso da existência sentimos um vazio tipo não-sei-de-quê a nos chamar com um psiu quase inaudível. Atendemos ao chamado, fundamos cabeça no travesseiro e lançamos os pensares rumo ao horizonte. Em algum lugar-nenhum nos foi mostrado um cemitério de elefantes. Contestamos o exibido, afirmando tratar-se de mito africano, nada mais. Por lá dizem que os elefantes quando pressentem o fim da existência se deslocam para se finarem solitários, como a não pretender dar trabalho a quem quer que seja, como costumamos cobrando ladainhas e quejandos naturais à espécie, como sói ocorrer com a humana.

Sim, bem poderia ser isso! O dileto amigo muito provável que estivesse vivendo um instante de elefante em fim de vida. Mas, muito diversamente, não a buscar um cemitério alheio para nele lhe lançarem o corpo inerte, mas  invertendo a mítica  para escapar de um cemitério mais aprisionador que aquele aonde alguns palmos de fundura, largura e altura acolhe em definitivo o que aqui fomos, precedido do direito de substituir o registro de nascimento pelo de óbito.

Sim, afinal nós, sapien sapiens, certamente aprendemos com o que vemos e ouvimos, dispondo da capacidade de refletir em torno e de reformular conceitos e fundamentos. Talvez, sem o perceber que versamos, concluímos por ensaiar o mito dos elefantes não ao perceber a morte, mas a ausência de sentido para continuar existindo naquele lugar do qual nunca imaginamos um dia deixar, o que durante anos anteriores buscaríamos para viver últimos dias, como afirmávamos em rodas e tertúlias, um tanto casimirianos sem Abreu, mas muito de retomar folguedos e piculas da infância.

Natural, assim, que de visibilizarmos as evidencias de um conjunto de sinais passíveis de despertar insegurança e incerteza em relação ao imediato escapar nos soa como melhor saída.

Mas algo está a nos espantar. Muito certamente a certeza de que não nos falta só quem nos compreenda ou nos interprete, mas o horizonte.

Tanto que, quando vivenciando esta síndrome de elefantes em busca do horizonte corremos para Minas, ainda que a dos versos de Drummond.


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