domingo, 4 de outubro de 2020

Em meio a jabuticabas, faz de conta, zangas e euforias

Roto fala de esfarrapado na casa do faz de conta que defende a Constituição. O que parece mensagem cifrada fica cristalina quando no centro dela colocamos Supremo Tribunal Federal. 

É que, caro leitor, o recém empossado presidente daquela Casa revelou contrariedade em relação ao colega Gilmar Mendes por andar/continuar fazendo das suas. Sentiu-se incomodado o ilustrado Luiz Fux porque Mendes exercitou seu lado político (mais uma vez) e influenciou na indicação do desembargador Kássio Nunes Marques para substituir Celso de Mello, conseguindo afastar um “terrivelmente evangélico” por enquanto.

A ar(rru)mação foi construída por nada mais nada menos Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Deixando de fora o Fux — coitadinho! Talvez estivesse pensando em ver indicada a filha — prevaleceram, ao que demonstram os resultadaos, a intervenção do mercado e dos militares. Não pode ser descartada a articulação política — como sói ocorrer nas indicações — onde a ala centrada em torno do inquilino planta uma semente para agradar a muitos.

Diga-se, de passagem, que Mendes não está só na pretensão: também o centrão, a gloriosa classe advocatícia (o indicado é advogado que ocupa o TRF-1 por eleição pelo denominado Quinto Constitucional, ou seja, cargo em tribunal intermediário ou superior ocupado por advogado eleito em lista tríplice levada ao Presidente ou Governador conforme o caso), a turma contrária à postura da Lava Jato em sua versão de violação de direitos constitucionais etc. e, naturalmente o próprio inquilino, que soube muito bem aproveitar a oportunidade para fazer sua média.

O Fux sobrou; roto falando de esfarrapado. Com o passado não recomendado a leituras — o escândalo de reconhecer a Telesena como título de capitalização, enquanto ministro do STJ, que deu origem a uma representação junto ao STF (leia uma das notícias, através do GGN) — imaginava-se todo poderoso e, certamente, almejava ser o bajulado e incensado interlocutor, conselheiro e definidor da indicação.

O inquilino do Alvorada, para não perder oportunidade, criou nova jabuticaba e, antes que a vaga fosse aberta no STF indicou a “indicação” de Mendes.

Certo que o inquilino do Alvorada não bate prego em sabão e vai garantindo trânsito mais satisfatório junto ao Judiciário. E — correspondendo ao seu papel de pau mandado do mercado – acaba de conseguir, entre proezas futuras, a liberação pelo glorioso e patriótico Judiciário do direito de torrar as refinarias da Petrobras sem autorização do Congresso.

A esquerda em sede do PT gargareja como macaca de auditório em razão da decisão da juíza Hardt inocentando Lula das acusações de recebimento de propina em forma de palestras e determinou a liberação dos depósitos e investimentos do ex-presidente.

Em outras palavras: a Justiça confessa que errou. E em razão dessa confissão a euforia. Ainda que os males maiores não tenham se desfeito com a confissão, qual sejam: o lawfare para atingir objetivos indecorosos e — o mais grave — os danos irrecuperáveis causados ao país em decorrência do golpe promovido para afastar Lula da disputa.

Mas, ainda assim, esgoela-se onde o povo não escuta, com matéria da Veja (“Após cinco anos, Justiça reconhece legalidade de palestras de Lula”). Para Gleise Hoffmann “a justiça tarda mas não falha”.

A mesma justiça (com letra minúscula, revisor!) que não julga a suspeição de Moro, que libera venda de refinarias da Petrobras sem anuência do Congresso, que libera o Conama de Salles para perpetrar a dizimação de manguezais e restingas e mesmo declara — como o fez um destes TRTs da vida — que chamar um negro de "macaco" é injúria LEVE (247), como já fizera instância que afastou o crime de racismo daquela juíza que quantificou a pena de um acusado em “razão de sua raça” (negro).

A leitura da História continua por ser feita.

Essa turma nunca aprende. Nem com os fatos recentes. Mesmo tendo José Dirceu para ler e refletir.

 

[...]

“Se você olhar a História do Brasil, vai verificar que de tempo em tempo — conforme o nível de organização, politização e, principalmente, ocupação de espaços institucionais, no sentido eleitoral, de governo e parlamentar, como também de auto-organização das classes populares — sempre há uma interrupção do processo. Foi assim em 1964 e se repetiu em 2016. Em outros momentos houve tentativa de golpe, como em 1955, tentativa de impedir a posse de Juscelino. Em 1945, Getúlio foi deposto por um golpe da cúpula das Forças Armadas, elegeu Dutra, voltou nos braços do povo e foi ‘suicidado’ em 54’.

[...]

Ganhar quatro eleições em um país como o Brasil não é para amador. Nossa debilidade talvez tenha sido não ter o nível de organização e mobilização para se contrapor ao tipo de golpe que tem sido dado agora em vários países, que é a mobilização de classes médias, às vezes de classes populares, muito apoio da mídia, a partir de razões muitas delas reais, muita intervenção externa e uso do Parlamento e do Judiciário. Foi o caso de Honduras, Paraguai e depois Brasil. O golpe foi a saída que tiveram para abortar a volta do Lula em 2018, que seria natural.

[...]

Se nós não elevarmos o nível de organização e de consciência política em geral, vai ser muito difícil enfrentar nos próximos anos a direita, que já mostrou como age”.    

(Entrevista ao Brasil de Fato, em maio de 2018)

Cremos, salvo melhor juízo, que os conteúdos fáticos acima expostos — e suas implicações — não devem se satisfazer com remendos e migalhas enaltecidas com expressões de caráter moral-religioso tipo “a justiça tarda, mas não falha”.

Sob pena de ser apenas uma euforia em meio a zangas e jabuticabas nesta terra brasilis que se torna a terra do faz de conta...: que se faz justiça, que se administra, que se faz política para o futuro e suas gerações.

Porque de "consciência política" estamos a cada dia mais distantes.


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