Do menor para entender o maior. Imaginemos o dono da padaria ou do açougue do bairro, instalado a gerações, de um instante para outro acossado por interesses de fornecedores monopolistas que exigem dele a aquisição da farinha ou do boi por eles fornecidos. Recusa sob argumento de que é o proprietário e sempre escolheu onde comprar conforme sua conveniência. Então se vê ameaçado de que não o fazendo sofrerá graves consequências.
A
natureza dos argumentos de quem ameaça, detendo alguma forma de poder, estão
sob o paradigma da fábula ‘O lobo e o cordeiro’ partilhando a água do rio
(interesses). Assim o vemos, em qualquer dimensão.
Certamente dirá a sensatez que isso
fere direitos individuais, coletivos, a liberdade de escolha, a livre
iniciativa etc. etc. E mais dirá: que qualquer coisa que interfira de forma
violenta contra o padeiro ou açougueiro é crime.
Na seara internacional as coisas não
diferem do refletido acima. No entanto, por trás de tudo, sob o prisma da
hegemonia (a supremacia e o controle de um sobre o outro sob a égide cultural
ou bélica) e da geopolítica (os espaços sobre os quais ‘meu’ poder deve ser
exercido através de práticas muitas vezes intervencionistas), os interesses
monopolistas agem de igual forma, exercitando mesmo a guerra para assegurar o
objetivo.
Caro leitor, este escriba de província
não pretende convencer quem quer que seja em torno do que aprecia como melhor.
Mas não custa observar os dois lados que se fazem sempre presentes em questões
como o atual momento na Ucrânia.
Não custa lembrar que por lá fizeram
recentemente uma ‘revolução’ (2014). Não só promovendo a ruptura da ordem
interna, o Ocidente não respeitou o princípio da autodeterminação dos povos e
escancaradamente apoiou os mascarados que derrubaram o governo mais afinado com
a vizinha Rússia e voltados para a desestabilizar a região.
Não custa lembrar o que representa a
área ora sob conflito: Kiev, capital da Ucrânia já foi capital do império
russo, o que demonstra a relação histórica e cultural entre eles.
A Rússia tolerou, cumpriu acordos
celebrados na ocasião. Apenas, como já ocorrera ao tempo da queda do muro,
condicionou os acordos e a manutenção da paz à não instalação de bases da OTAN
no entorno de suas fronteiras. Inclusive aceitou a ‘revolução’ ucraniana e
assinou os Tratados de Minsk, onde reitera as mesmas condições.
De lá para cá — caso tenha paciência o leitor — verifique quantas base da OTAN foram
implantadas no entorno do Leste russo.
O que está por trás de todo sonho de
qualquer império é a ocupação do próximo (cultural e geograficamente). Portugal
e Espanha, Inglaterra, Holanda, Alemanha, França, Estados Unidos ou Rússia,
qualquer deles, cada um a seu tempo.
Não descurar de que, no caso concreto
quem está atravessando o oceano para ameaçar outro povo são os Estados Unidos
utilizando-se dos parceiros europeus como cavalos de batalha.
O detalhe reside apenas num fato que
os falcões estadunidenses pensaram que não aconteceria: a reação russa. Isto
porque nada está acontecendo sem aviso.
Não nos esqueçamos — quando falam de motivos — que os motivos são sempre os deles (dos que detêm o controle da informação). As ‘armas químicas’ do Iraque — alardeadas em rede internacional por Colin Powell — justificaram a invasão do Iraque. Nunca foram encontradas. Bombardearam Belgrado recentemente para garantir adesão a OTAN. Tudo sem autorização do Conselho de Segurança da ONU. Mas ...
Nada se faz sem que haja vantagem
material. A guerra é um instrumento exercido por quem detém o poder de promovê-la
e os meios de efetivá-la. Por trás das guerras imperiais, em todos os tempos
(Babilônia, Macedônia, Pérsia, Grécia, Roma etc. etc.), o butim esteve
assegurado para cobrir as ‘despesas’, materializado no saque das riquezas e na
escravidão para as populações locais.
O interesse do Ocidente — mais que o interesse em dominar o
complexo agroindustrial e mineral ucraniano, já em poder dos ‘revolucionários’ — é aprofundar o entorno de ameaças a
Rússia, incluindo o controle estratégico sobre as vias de suprimento e
comercialização de produtos exportados pela Rússia.
Em defesa de suas ambições o Ocidente,
capitaneado pelos Estados Unidos, pretende sufocar — mais imediatamente — a Rússia e, num segundo instante, dispor
de meios para cercar a China (hoje aliada dos russos), a segunda maior economia
do planeta e também detentora de insumos estratégicos para as indústrias
eletroeletrônicas e aeroespaciais mundo a fora.
Guerra ou paz pouco importa. O poder
das nações é aético. Só o interesse prevalece. As vítimas humanas são apenas
estatísticas a serem esquecidas. Nesta contemporaneidade os Estados Unidos se acostumaram
a destruir gerações, levando-as à guerra. Nunca foram santos, quando muito do
“pau ôco” como diz o sertanejo.
Razão infinita ao que é atribuído a
Erich Hartmann: “A guerra é um lugar onde jovens que não se conhecem e não se
odeiam se matam, por decisão de velhos que se conhecem, se odeiam mas não se
matam”. Desde Esparta!
Minha vó Tormeza certamente chamaria
de ‘espingarda de Satanás’ o que os poderosos fazem deles.
Como se não bastasse, os Estados Unidos
de Biden acabam de transformar os ucranianos em espingardas de Satanás.
Este escriba apenas paga para ver se
sanções econômicas contra a Rússia a farão tornar-se a Cuba (a partir dos anos
60) ou a Venezuela (de hoje).
O jogo é sujo. De nossa parte apenas
não queremos concordar com ele, qualquer que tenha a iniciativa.
E, como o demonstra a história não tão
recente do comportamento intervencionista dos Estados Unidos, tenhamos a
certeza de que não são os ‘lindos olhos’ ucranianos o motivo de tamanho
interesse pela liberdade e democracia de seu povo.
Para essa gente é como se o mundo fosse
a padaria ou açougue da esquina para a máfia, o comando vermelho ou a milícia
de plantão.
Quanto aos desdobramentos é o que
veremos amanhã, neste espaço, em “Às baratas, tudo!”
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