Uma realidade dura, muito mais do que aparenta.
Uma realidade imperceptível, elevada no dia a dia como pilar do edifício social
contemporâneo. Repetição do ocorrido, ocorrendo e por ocorrer massificado como
se nada houvesse ou nada representasse, muito menos significado algum.
É que neste país de São Saruê estamos nos acostumando ao absurdo como coisa banal, comum e – o mais preocupante – necessária. O anormal tornado banal.
Em meio às turbulências com o tanto convivido tudo
se torna(u) normal: gasolina acelerando o passo para 10,00 reais, tomate,
cebola, carne, tempero verde, botijão, leite, verduras e legumes, óleo de soja
etc. etc. Tudo nas alturas por nós nunca imaginadas.
E as vítimas não têm a quem apelar. E nem apoio da imprensa encontram. Afinal, esta – a imprensa – faz parte do torreão que defende o sistema. Como a ela chegar o apelo dramático e desesperado dos descalços e descamisados?
A clássica acomodação da classe dominante do país aos interesses individuais – através dos quais exercita centenário patrimonialismo – nos deixa pasmo quando aqueles que dizem representar a base antagônica da sociedade se arrumam político-eleitoralmente para assegurar cargos e vantagens outras sem qualquer discussão de convergência em torno das necessárias políticas públicas imprescindíveis como objeto de discussão.
E eis que diante de nós um ano temerário, no qual percebemos nuances sombrias para as instituições ditas republicanas. Os vícios seculares em busca de perpetuação mais acentuados. Algumas certezas eleitorais – ainda que mais próximas de anseios populares – não estão definidas, justamente porque carecem de pleno funcionamento das instituições.
Para que o perceba o caro leitor por quão
tenebroso inverno podemos passar, e quão caudaloso o rio que precisamos atravessar
a nado (porque até mesmo o bote furado corre risco de não ser alcançado) afastemo-nos
do Brasil verde-e-amarelo pátria de todos pintado em cores de arco-íris.
O jornal O Estado de São Paulo denunciou a
existência de um gabinete paralelo no Ministério da Educação controlando em
torno de 40 bilhões do Orçamento Federal e destinando às arrumações coordenadas
por lideranças evangélico-pentecostais com acesso ao gabinete presidencial.
Sabido e consabido o montante de militares
cumulando remuneração e cargos no Governo Federal.
Parcela da classe dominante, de significativa participação no PIB nacional – alheia em si aos interesses comuns, preocupada apenas com o “meu pirão” – tudo fará para manter as conquistas obtidas nos últimos anos e vê-las ampliadas.
Em meio a isso a maior das crises mundiais no
plano do reconhecimento das forças institucionais despenca para o encontro de
soluções paralelas.
Soa o desfalecimento das regras, dos limites,
do respeito aos mais comezinhos princípios que asseguram todo o ordenamento
internacional.
Assim, o não alcançado dentro da normalidade
institucional (respeitos à autodeterminação, convivência pacífica entre povos, à
democracia e ao Estado de Direito) passa a sê-lo por meios abjetos (golpes e
intervenções em seu formato contemporâneo) que chega no presente instante ao
absurdo de sanções à iniciativa privada como forma de atingir estados
nacionais.
E nos imaginamos partícipes de um concerto em
que de nenhum instrumento dispomos.
No particular desta terra brasilis não será demais duvidar dos instrumentos que – em princípio – garantiriam o funcionamento das instituições.
Podemos confiar nas forças armadas? Podemos
confiar no Supremo Tribunal Federal (STF) e seus quejandos subordinados, onde
deve ser destacado o TSE? Estamos imunes a um golpe que instaure um “Estado
Novo”? De que meios dispomos para enfrentar uma rebelião contrária ao resultado
das urnas caso venha a se confirmar uma derrota eleitoral dos ora encastelados
no poder? Confiar na comunidade internacional que hoje quebra o ritmo e a
harmonia do respeito aos direitos de indivíduos e estados nacionais?
O jogo é bruto, tenhamos consciência disso.
E as ponderações e desconfianças deste escriba
de província (não de agora) acomodam-se aos lances da partida de ‘xadrez’ da
qual tomamos emprestado do tabuleiro de Luis Nassif:
“Esse é o
drama nacional: um país cujas principais instituições não consolidaram
princípios democráticos. E, por trás de tudo, as ondas que vêm dos centros
políticos internacionais, de que todo arbítrio será tolerado, e nenhuma
negociação será aceita”.
Parece-nos – que Deus se apiede de nós! – perceber no inquilino do Alvorada, destemperado em tantos outros instantes menos desagradáveis, muita tranquilidade em relação ao futuro. Cremos que pautado está no exemplo de Trump diante do infortúnio eleitoral e percebe que hoje dispõe internamente de muito mais apoio do que possa imaginar a vã filosofia para golpear as instituições. Não fora um filho seu que ameaçou fechar o STF com um cabo e um jipe? Quantos cabos e jipes hoje? Ou alguém imagina que o ‘pirão gostoso’ que hoje muitos comem não alimenta sonhos dantescos contra a fome de liberdade?
O clima de ódio e desapreço a tudo se faz presente
e mais se aprofunda neste país de ‘triste figura’, sem Quixote. Tudo está
minado. Até o futebol, que não tem mais torcida, mas agressores com espaço na
mídia sem que nada lhes aconteça.
E que moral, perante o lugar comum pátrio, tem o STF ou TSE, por exemplo, se tudo que aí está encontrou o apoio e a legitimidade por eles assegurados? Para quem apelar se as augustas figuras forem defenestradas e substituídas por escolhas “terrivelmente” favoráveis.
Impossível? Não caro
leitor; temos exemplos à sobeja. Basta não esquecer.
No cenário internacional uma torcida resolveu ‘não esquecer’ e denunciou
esquecimentos que afetaram o mundo e andam esquecidos por conveniência e
conivência. (Perdoe-nos, o leitor, a repetição vocabular)
Sim, há quem não esqueça em meio ao que de muito
não pode ser esquecido.
Alhures e aqui.
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