domingo, 20 de março de 2022

Há quem não esqueça e o que não pode ser esquecido

 

Uma realidade dura, muito mais do que aparenta. Uma realidade imperceptível, elevada no dia a dia como pilar do edifício social contemporâneo. Repetição do ocorrido, ocorrendo e por ocorrer massificado como se nada houvesse ou nada representasse, muito menos significado algum.

É que neste país de São Saruê estamos nos acostumando ao absurdo como coisa banal, comum e o mais preocupante  necessária. O anormal tornado banal.

Em meio às turbulências com o tanto convivido tudo se torna(u) normal: gasolina acelerando o passo para 10,00 reais, tomate, cebola, carne, tempero verde, botijão, leite, verduras e legumes, óleo de soja etc. etc. Tudo nas alturas por nós nunca imaginadas.

E as vítimas não têm a quem apelar. E nem apoio da imprensa encontram. Afinal, esta  a imprensa  faz parte do torreão que defende o sistema. Como a ela chegar o apelo dramático e desesperado dos descalços e descamisados?

A clássica acomodação da classe dominante do país aos interesses individuais  através dos quais exercita centenário patrimonialismo  nos deixa pasmo quando aqueles que dizem representar a base antagônica da sociedade se arrumam político-eleitoralmente para assegurar cargos e vantagens outras sem qualquer discussão de convergência em torno das necessárias políticas públicas imprescindíveis como objeto de discussão.

E eis que diante de nós um ano temerário, no qual percebemos nuances sombrias para as instituições ditas republicanas. Os vícios seculares em busca de perpetuação mais acentuados. Algumas certezas eleitorais  ainda que mais próximas de anseios populares  não estão definidas, justamente porque carecem de pleno funcionamento das instituições.

Para que o perceba o caro leitor por quão tenebroso inverno podemos passar, e quão caudaloso o rio que precisamos atravessar a nado (porque até mesmo o bote furado corre risco de não ser alcançado) afastemo-nos do Brasil verde-e-amarelo pátria de todos pintado em cores de arco-íris.

O jornal O Estado de São Paulo denunciou a existência de um gabinete paralelo no Ministério da Educação controlando em torno de 40 bilhões do Orçamento Federal e destinando às arrumações coordenadas por lideranças evangélico-pentecostais com acesso ao gabinete presidencial.

Sabido e consabido o montante de militares cumulando remuneração e cargos no Governo Federal.

Parcela da classe dominante, de significativa participação no PIB nacional  alheia em si aos interesses comuns, preocupada apenas com o “meu pirão”  tudo fará para manter as conquistas obtidas nos últimos anos e vê-las ampliadas.

Em meio a isso a maior das crises mundiais no plano do reconhecimento das forças institucionais despenca para o encontro de soluções paralelas.

Soa o desfalecimento das regras, dos limites, do respeito aos mais comezinhos princípios que asseguram todo o ordenamento internacional.  

Assim, o não alcançado dentro da normalidade institucional (respeitos à autodeterminação, convivência pacífica entre povos, à democracia e ao Estado de Direito) passa a sê-lo por meios abjetos (golpes e intervenções em seu formato contemporâneo) que chega no presente instante ao absurdo de sanções à iniciativa privada como forma de atingir estados nacionais.

E nos imaginamos partícipes de um concerto em que de nenhum instrumento dispomos.

No particular desta terra brasilis não será demais duvidar dos instrumentos que  em princípio  garantiriam o funcionamento das instituições.

Podemos confiar nas forças armadas? Podemos confiar no Supremo Tribunal Federal (STF) e seus quejandos subordinados, onde deve ser destacado o TSE? Estamos imunes a um golpe que instaure um “Estado Novo”? De que meios dispomos para enfrentar uma rebelião contrária ao resultado das urnas caso venha a se confirmar uma derrota eleitoral dos ora encastelados no poder? Confiar na comunidade internacional que hoje quebra o ritmo e a harmonia do respeito aos direitos de indivíduos e estados nacionais?

O jogo é bruto, tenhamos consciência disso.

E as ponderações e desconfianças deste escriba de província (não de agora) acomodam-se aos lances da partida de ‘xadrez’ da qual tomamos emprestado do tabuleiro de Luis Nassif:

 

Esse é o drama nacional: um país cujas principais instituições não consolidaram princípios democráticos. E, por trás de tudo, as ondas que vêm dos centros políticos internacionais, de que todo arbítrio será tolerado, e nenhuma negociação será aceita”.

Parece-nos  que Deus se apiede de nós!  perceber no inquilino do Alvorada, destemperado em tantos outros instantes menos desagradáveis, muita tranquilidade em relação ao futuro. Cremos que pautado está no exemplo de Trump diante do infortúnio eleitoral e percebe que hoje dispõe internamente de muito mais apoio do que possa imaginar a vã filosofia para golpear as instituições. Não fora um filho seu que ameaçou fechar o STF com um cabo e um jipe? Quantos cabos e jipes hoje? Ou alguém imagina que o ‘pirão gostoso’ que hoje muitos comem não alimenta sonhos dantescos contra a fome de liberdade?

O clima de ódio e desapreço a tudo se faz presente e mais se aprofunda neste país de ‘triste figura’, sem Quixote. Tudo está minado. Até o futebol, que não tem mais torcida, mas agressores com espaço na mídia sem que nada lhes aconteça.

E que moral, perante o lugar comum pátrio, tem o STF ou TSE, por exemplo, se tudo que aí está encontrou o apoio e a legitimidade por eles assegurados? Para quem apelar se as augustas figuras forem defenestradas e substituídas por escolhas “terrivelmente” favoráveis. 

Impossível? Não caro leitor; temos exemplos à sobeja. Basta não esquecer.

No cenário internacional uma torcida resolveu ‘não esquecer’ e denunciou esquecimentos que afetaram o mundo e andam esquecidos por conveniência e conivência. (Perdoe-nos, o leitor, a repetição vocabular)

Sim, há quem não esqueça em meio ao que de muito não pode ser esquecido.

Alhures e aqui.



Nenhum comentário:

Postar um comentário