domingo, 2 de maio de 2021

Quando acontece não custa reler

Estamos vivendo tamanho desencontro no plano da solidariedade humana, cada vez mais afastados da discussão civilizada, da salutar troca de ideias e raciocínios que não duvidamos de mais nada neste país. 

Lamentável que tenhamos desenvolvido (não que o devêssemos) uma cultura não do ódio a determinado fato, mas do odiar como meta humana. Dizer que tal conduta é incompatível com o mais remoto conceito de civilização de logo levará a que sejamos julgado/tachado de comunista, petralha e adjetivos que engordam o vocabulário desta parcela de ‘modernidade de pensamento’.

A especulação financeira — prática híbrida de capitalismo, nada gera ou distribui da riqueza produzida socialmente, incompatível com o mais elementar conceito do liberalismo clássico, que a tornava meio de acumulação pelo reinvestimento na produção — tornou-se em sua versão neoliberal ampliada na vertente da ‘gloriosa’ globalização, na bíblia dos idiot  savant que integram parte da contemporânea intelectualidade, que vê em tal aberração a alavanca propulsora do que denomina de desenvolvimento. Coisa assim do tipo  crítica pessoal  daquele que se diz cristão e busca no Deuteronômio e no Talião a vocação e a expressão de sua fé no Amor.

Assim anda nossa gente em sua augusta atualidade: não faça ao outro o que gostaria que não lhe fosse feito, mas pratique o olho por olho dente por dente. Não compreenda, não seja semelhante a Cristo mensageiro do Amor como redenção do homem; apunhale o próprio filho, porque o ‘deus’ que você acredita é aquele que pode sustar a adaga como o fez com Abrão, antes de torná-lo Abraão.

E dessa forma aplaude o Estado que mata o semelhante. Afinal, a morte é a festa, que já conta com mais de 400 mil participantes. Dos mais de 500 mil antes do final de junho. 

Temos exercitado a leitura deste universo tupiniquim, desde que o compreendemos como instrumento de exploração tal que o faz pátria da desigualdade social elevada ao cubo. Aprendemos que as razões históricas que assim o tornam até o momento não foram enfrentadas. E mesmo quando o é não foi compreendida pelos próprios beneficiados.

As raízes de tal mazela se encontram fincadas na condução do processo, em razão de uma classe dirigente que, de uma forma ou de outra — com raríssimas exceções — se apega ao patrimonialismo e ao compadrio como política pública e faz do Estado seu instrumento de atuação, diferindo, tão somente, em relação aos destinatários, conforme a ideologia que a norteie.

Desta forma permanecemos no embate histórico de uns lutarem para reduzir a desigualdade e outros para que se amplie. A vitória dos últimos tem sido mais permanente. Assim, afastada a conformação de uma unidade nacional beneficiada pelas riquezas imensuráveis presentes no território pátrio, cada dia mais distante da base da pirâmide social (mais e mais achatada) e mais concentrada naquele punhado de insignificância aritmética.

Sob essa vertente, a atuação político-eleitoral — como instrumento de ocupação do poder estatal — não alcançou em nível de resultados o mínimo que se possa esperar para uma terra que ultrapassa cinco séculos de existência.

Construímos no curso de dois séculos de independência política a dependência subserviente. E quando anunciamos posições contrárias a ela não o fazemos sob a égide da compreensão do por que ocorre.

Abaixo alguns trechos de dezenas dos que escrevemos neste espaço abordando o fato acima posto em relação à discussão da atualidade: 

A esquerda — tomando-se o PT como referência — enquanto no poder não interpretou os fatos à luz da experiência histórica. Não leu os almanaques e alfarrábios da política e do poder no curso da história, pelo menos da recente.

Não dimensionou a geopolítica como instrumento de hegemonia.

Não leu a cartilha estadunidense, em que pese alertado por entrevista de Moniz Bandeira, em 2013 (queremos crer que não tenha lido, para não ficarmos com a ideia de que foi burra) quando afirmou que os Estados Unidos não tolerariam o protagonismo do Brasil.

Não viu a ‘primavera árabe-tupiniquim’ batendo às portas em 2013 sob o álibi das tarifas em São Paulo; tampouco dimensionou que a diplomata estadunidense presente quando derrubaram Lugo no Paraguai se mudara de mala e cuia para Brasília (lá e cá o mesmo método, congresso-judiciário).

Sempre afirmamos que o jogo é bruto.

A desgraça se voltando para o Brasil começou com a descoberta e prospecção do pré-sal. Estados Unidos (CIA e Departamento de Estado) abertamente espionando. O esquema Petrobras foi todo manipulado a partir dos Estados Unidos em conluio com a república de Curitiba. Pepe Escobar, Assange divulgaram os fatos.

...

Por enxergar detalhes tais — como já escrevemos recentemente — só acreditamos na candidatura de Lula se houver por parte dele garantia para o mercado/classe dominante (que se apropriou do país recentemente) de que não haverá ‘quebra de contrato’. Ou seja, o que fizeram/compraram/espoliaram/queimaram será respeitado.

Caso contrário é ficar com as euforias e fazer de conta que não se vê o caminhar da juristocracia e dos que ora dela se beneficiam.  

(in Euforias a reboque).

“Ainda que seja ele o único capaz (como o fez quando governou) de perder os dedos para não perder os anéis. Os milagrosos anéis das políticas de governo petistas voltadas para os menos favorecidos.

Se o sistema o permitir, recomporá a credibilidade e o respeito do país.

Até outro golpe.”

                                                                       (in Lula, a bola da vez...). 

“[...] sua presença à frente do governo atende aos interesses mais comezinhos, tanto da classe dominante local como de além mar.

Também levantado indignação crítica à forma como a denominada oposição ao inquilino se porta, já que limitada ao ramerrão da denúncia midiática que em si mesma não alcança o real objetivo (justamente porque interpretada aos olhos e ouvidos do homem comum como apenas ‘coisa da oposição’, de quem perdeu o poder), sem meios e força para enfrentar ou competir com os discursos de ódio, com a mensagem evangélica. Ou seja, o discurso levado a termo pela oposição não conseguiu, em dois anos de descalabro, reduzir o BOM(!) e ÓTIMO(?) de avaliação do inquilino para menos de 30%. Simplesmente — por incrível que pareça — dispõe ele de 1/3 de apoio até agora imutável.

Salvo esparsas vozes sem a penetração necessária na base da sociedade a experiência recente deixa no ar que a oposição não aprendeu a lição de que não precisa agredir ou perseguir mas não pode confiar em projeto nacional amparado na burguesia. Sua postura nesse instante parece demonstrar apenas a realidade imediata: a retomada do poder.

Para tanto ataca o inquilino do Alvorada e esquece (e não o combate) a razão que a afastou do poder: o projeto neoliberal, com o qual de certa forma conviveu e tolerou. Parece não atentar que o que está em jogo permanece sendo uma luta de classes em torno da qual não se situou além do discurso.

(in Em meio à vitória avassaladora...)

Esta angústia que se nos acomete resulta de não vermos a saída necessária e imprescindível ao trágico que vivemos com um resultado eleitoral que sonhemos. Porque não bastará o discurso, a retomada do poder, o retorno às políticas de redução das desigualdades ora destruídas se tudo pode voltar a acontecer.

Sabemos — e parece que nos portamos indiferentes — diante de fatos comprovados – que:


o Departamento de Justiça (DoJ) norte-americano – órgão equivalente à Procuradoria-Geral da Justiça brasileira, com a diferença de que seu titular é ministro de Estado e, como tal, é demissível pelo presidente da República – recrutou e treinou a malta curitibana, ainda no início da segunda década deste século.


Em suma, a tarefa consistia em desencadear a 'perseguição constante e sistemática ao ‘rei’…', para usar as palavras de Karine Moreno-Taxman, a “especialista” da embaixada ianque, que inculcou aos seus aplicados alunos o método por eles executado estritamente, como se viu nos anos seguintes: adoção de task force; doutrina jurídica das “delações premiadas”; e 'compartilhamento informal' de informações com o DoJ, por fora dos canais oficiais.


E, o principal: criação do clima de ódio ao alvo da perseguição, mediante intenso uso dos meios de comunicação de massa, de modo a articular na chamada opinião pública, a demanda por sua condenação. A propósito, sempre é bom recordar o motivo do especial empenho dos agentes do Império nesta empreitada – a diplomacia “ativa e altiva” dos governos petistas, inclusive a atuação das empresas brasileiras no mercado internacional de infra-estrutura, exercendo forte concorrência às congêneres ianques.”

                                                       (Carlos Frederico Guazzelli, in Sul21)

Precisamos reler os fatos. Mensagem de Pepe Escobar (na TV247) reitera — com todas as letras — o que temos dito. E não vemos discutidos, tampouco enfrentados publicamente.

Não por falta de aviso.


Um comentário:

  1. Uma correta e minuciosa análise da sittuação atual do País!! Seria interessante fazê-la chegar às autoridades responsáveis pelo desenvolvimento do mesmo e pelo bem estar de seu povo !!!

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