sábado, 30 de março de 2013

Oportunidade

Para manter a tradição
Nos idos em que a comunidade mais se aproximava e mais se conhecia o ‘testamento de Judas” era elaborado a cada dia, ansiado pelas testemunhas que o ouviriam para conferir se fora justo e tudo traduzira.

Não faltava uma delicada troca de tapas, em fez de farpas, quando algum segredo – comumente de alcova – vinha à tona e o fato, já tornado público e notório, encontrava a escancarada assunção da autoria no dito cujo que não aceitava a “insinuação” ou “tomava as dores” do nominado.

Particularmente, as administrações e gestores tornaram-se o prato cheio no correr dos anos, destinatários de atenção especial. Olheiros e puxa-sacos do administrador de plantão contorciam-se na indignação de verem as chefias alvo do testamento. Comumente por serem eles a razão.

A tradição da Malhação do Judas, introduzida no Brasil por espanhóis e portugueses (não temos como afirmar que o “testamento” tenha a mesma origem, na dimensão adquirida no Brasil), encontra em Câmara Cascudo - nos vem à mente aleatoriamente - a conclusão de conter uma manifestação tradicional a inserir-se no contexto cultural sob um ritual de extrema significação e complexidade, onde presente a expressão do mal e a liberação do homem para fazer destinos.

Nele, assinala Cascudo, há de ser ressaltado o aspecto dionisíaco, a folia, a festa. Certamente aí a força do "testamento", ocupando o espaço antes limitado a lembrar a traição de Iscariotes relatada nos Evangelhos.

Mas, como o vinho na França, a “Queima de Judas” não mais repercute com a força de antanho no sábado de Aleluia. Não mais atrai multidões. Prende-se, onde e quando ocorre, no anedótico da oportunidade.

No entanto, torna-se imperativo, quando fatos há que reforçam a indignação e entalam a garganta do povo. O “testamento” é a válvula de escape, a resposta comum, unitária e indistinta.

Em Itabuna, ao que parece, não falta motivo para manter a tradição.


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